O que leva alguns moradores a depositarem indevidamente o seu lixo em frente ou ao lado de suas casas?

Fonte: https://associacaocamposeliseos.com.br
Como explicar por que as pessoas acumulam lixos próximos as suas casas (em terrenos baldios) se isso não é racional e nem, algumas vezes, falta de consciência?
É muito comum perguntas do gênero “não entendo o que leva alguns moradores a depositarem o seu lixo em frente ou ao lado de suas casas…” Assim como afirmações do tipo “Cidade descuidada, morador ‘porco’”.
Convido-o a “brincar” com as teorias sociológicas para refletir (de forma inicial) essa questão.
As explicações para essa questão são bem variadas, mas estarei utilizando a Teoria das Janelas Quebradas para tentar apontar alguns indicativos explicativos, assim como apresentar, grosso modo, a referida teoria para aqueles que não a conhece.
Em 1982 foi publicado nos Estados Unidos da América (na revista The Atlantic Monthly) a Teoria Das Janelas Quebradas (Broken Windows Theory), a qual, embora sua superficialidade explicativa, me parece muito útil para entender o caso aqui levantado. Tal teoria busca mostrar a relação de causalidade que existe entre a desordem e a criminalidade, mas no nosso caso nos possibilita a pensar a relação entre a desordem e os entulhos de lixo.
Nessa teoria é dado um exemplo de um prédio. Para os formuladores dessa teoria, “caso se quebre uma janela de um prédio e imediatamente ela não seja consertada as pessoas que por ali passarem irão concluir que não existe autoridade responsável pela conservação da ordem naquela localidade. E logo todas as outras janelas serão quebradas. E em pouco tempo acontecerá a decadência da própria rua onde apenas as pessoas desocupadas ou aquelas com tendências para o crime irão se sentir bem naquele local, criando dessa forma um terreno propício para a criminalidade”.
No caso aqui levantado, o que pode levar as pessoas a acumularem o lixo nas ruas é a falta de seu recolhimento deste que, por sua vez, levam as pessoas a concluírem que não existe autoridade responsável pela proibição, criando uma sensação de falta de regras e logo todos jogam o lixo naquele local onde já há lixo acumulado. Nesse caso, apenas o primeiro (que deveria ser inicialmente coagido pelo órgão competente) sente algum tipo de constrangimento em jogar o lixo. Os demais agem, quase sempre, sem constrangimento, já que “as janelas estão quebradas”. O mesmo ocorre no metrô. Se o chão estiver cheio de lixo e o passageiro tiver em suas mãos um embrulho de bala (papel de bala), a possibilidade dele jogar no chão será muito maior do que se o metrô estivesse limpo.
Assim, “Cidade descuidada, morador “porco”, nessa ordem, parece ser a situação aqui colocada. Se a cidade fosse cuidada, as pessoas se sentiriam coagidas a jogar o lixo no lixo. Embora acredito que a “janela quebrada” não justifica tal ação, assim como a “educação moral” do indivíduo certamente não foi construída de forma adequada. As vezes não falta conscientização, falta “caráter”! Falta a construção de um habitus voltado ao respeito ao próximo.
(texto originalmente publicado no facebook como resposta a um debate envolvendo a questão aqui exposta)

Cristiano Bodart

Doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP), professor do Centro de Educação e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal de Alagoas (Ufal). Pesquisador do tema "ensino de Sociologia". Autor de livros e artigos científicos.

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