Concorrência é sempre bom? A reificação da concorrência

concorrência
Concorrência é algo sempre bom? Neste texto vamos refletir como ela pode ser utilizada de maneira destrutiva.

Por Roniel Sampaio Silva

Concorrência é a palavra da ordem do dia, ela tem sido relacionada constantemente com qualidade e muitas vezes tem sido utilizada para reificar algumas ações no campo macroeconômico.  Os intelectuais de livre mercado colocam a livre concorrência sem intermediação de um ente estatal como centro de uma sociedade mais justa e igualitária, será essa retificação de concorrência é algo necessariamente bom?

Em primeiro lugar, devemos analisar que em muitas circunstâncias boa parte das discussões na internet tem se polarizado entre concorrência e cooperação.  As correntes ligadas à ideologia do livre mercado colocam a concorrência como o única forma de equalização das relações sociais. Devemos ter cuidado com a reificação da concorrência. Há também outros processos sociais como a colaboração que ajudam a desenvolver o ser humano a partir das suas relações. Observando um fenômeno do cotidiano, vou problematizar essa retificação concorrência não necessariamente pode ser algo bom. No bairro que moro existem quatro empresas que fazem parte do sistema de transporte coletivo. Estas por suas vez “disputam” os passageiros. Ocorre que existem poucos diferenciais de concorrência. O preço máximo é tabelado pela Prefeitura, a qualidade dos ônibus é praticamente a mesma. O que faz com que o passageiro “escolha” uma empresa em detrimento da outra é o fato da empresa ter ônibus que atenda o passageiro no momento em que ele precisa, assim o este chegará mais cedo ao compromisso. Passageiro e empresas aparentemente tem interesses comuns. Todavia, os interesses são contraditórios uma vez que interesse das empresas é obter mais lucro e o do passageiro é chegar mais cedo ao seu compromisso e chegar com conforto.

espera no ponto de ônibusO que fazem então as empresas para concorrer? Devem pegar o maior número de passageiros que a outra. Alguns segundos de diferença em tais empresas pode ser decisivo no número de passageiros que cada ônibus vai angariar. Podemos especular então que as empresas vão aumentar a frequência de ônibus para pegar o maior número de passageiros possíveis? Isso é o ideal, mas não é o que de fato acontece. Uma maior frequência de ônibus circulando gera mais custos operacionais. O que acontece de fato é que as empresas acabam diminuindo a frota, aumentando o tamanho dos ônibus para aumentar o número de passageiro e diminuir custos operacionais. Assim, fazem com que os passageiros esperem mais tempo disputando entre si tão somente o “acúmulo” de passageiros nos pontos de ônibus. Neste sentido, como não há nenhuma regulamentação para essa situação por parte da prefeitura, esse tipo de concorrência cria uma situação desconfortável para o passageiro que passa a ser alvo de abuso empresas.   Quanto mais passageiros “acumulam” nos pontos de ônibus, mais rentável é para as empresas uma vez que muitas delas saem praticamente do mesmo terminal. Os passageiros por sua vez passam a ficar cada vez mais tempo nos pontos de ônibus uma vez que no terminal de partida a empresa só libera seu ônibus, mediante a liberação do ônibus da empresa concorrente e isso cria um acúmulo de passageiros os quais beneficia alternadamente as empresas e prejudicam cada vez mais os passageiros.  A liberdade de escolha do passageiro em muitos casos é ir a pé ou estar sujeito a este tipo de abuso.

A partir desse caso podemos concluir que apenas a concorrência desregulada ou uma concorrência regulada inadequadamente não é garantia de qualidade para o consumidor.  É necessário que os critérios de concorrência sejam definidos pela população e não pelas empresas e seus lobbys junto ao poder público. Como se diz no linguajar caboclo: “não deve deixar a raposa quem tomar conta do galinheiro”.

Roniel Sampaio Silva

Mestre em Educação e Graduado em Ciências Sociais. Professor do Programa do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Piauí – Campus Campo Maior. Dedica-se a pesquisas sobre condições de trabalho docente e desenvolve projetos relacionados ao desenvolvimento de tecnologias.

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