Historiador? Só com diploma – Resposta a Fernando Rodrigues

Me deparei com um texto de opinião do jornalista Fernando Rodrigues que é de chamar atenção. Não por sua qualidade, mas pela aparente incapacidade analítica do autor. O texto, cujo título é Historiador? Só com diploma”, tem duas dimensões: noticiar um projeto de lei aprovado no Senado e tecer uma crítica a esta aprovação.

A referida Lei trata-se da regulamentação da profissão do historiador. O jornalista em questão escreveu em tom de alarde: “a nova lei impedirá que pessoas sem diploma de história possam dar aulas dessa disciplina”. Num primeiro momento poderia pensar: é lamentável ver que indivíduos bem formados, como o jornalista, não tenham consciência da necessidade de preparo intelectual para a prática do ensino. Porém, continuando a leitura do texto as questões que envolvem a opinião do jornalista tornam-se mais claras. O senhor Rodrigues nos dá uma pista quando assim afirma: “Ignora que médicos, sociólogos, economistas, engenheiros, juristas, jornalistas ou cidadãos sem diploma possam acumular conhecimentos históricos sobre suas áreas de atuação. Terão todos de guardar para si o que aprenderem”. Sr. Rodrigues, o projeto de Lei de modo algum ignora a capacidade dos indivíduos aprenderem conteúdos históricos, na verdade, isso nem está em jogo. Igualmente o projeto de Lei não impede que o conhecedor de conteúdos históricos os transmita. O senhor está ignorando os demais espaços de troca e transmissão de conhecimento.

Há sim dois problemas na referida lei. Uma que o senhor parece não ter tido condições de perceber, certamente por não lhe interessar, e outra que afeta aos que não são formados em História, esta amplamente denunciada pelo senhor, talvez por tirar o “bico” de alguns de seus colegas jornalistas, não sei se é seu caso. “Bico”, por não terem como profissão principal. Também com o salário que tem os professores hoje, não é? (ops: esse sim seria um bom tema para seu próximo texto!? Fica a sugestão).

Senhor jornalista, o senhor repetiu uma frase (chiste, na sua opinião) de José Sarney, o qual teria dito: “Você quer me impedir de escrever sobre a história do Maranhão”. Onde na Lei está o impedimento de qualquer cidadão escrever seja o que for?

O senhor ignora que para dar aula de História não basta apenas saber História. É necessário ter habilidades/conhecimentos pedagógicos e didáticos.

O senhor realmente acredita que é benéfico para a educação que pessoas inabilitadas deem aula? Pessoas que têm o ensino como um “bico” extra-turno? Ser professor é muito mais que saber a história do Maranhão ou de qualquer outro lugar. É muito mais do que escrever um livro. É nessa direção que está o erro, ao meu ver, da Lei. Achar que bacharel e licenciado é a mesma coisa. Aquele dotado de conhecimento da História, treinado e habilitado a atuar como Historiador, como técnico, este como professor/educador. Nesse sentido os senadores caminharam para o mesmo erro de percepção que o senhor: achar que saber é sinônimo de habilidade pedagógica.

Caso tenha que republicar seu texto em outro espaço, tenho uma sugestão de título para iniciar sua reflexão: Acabaram os “bicos” na educação. “Professor” tem agora que ser professor!

Historiador? Só com diploma!

Por Cristiano Bodart Nota: esse texto foi encaminhado ao referido jornalista via e-mail

 

Cristiano Bodart

Doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP), professor do Centro de Educação e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal de Alagoas (Ufal). Pesquisador do tema "ensino de Sociologia". Autor de livros e artigos científicos.

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