Movimento operário e poder midiático

Por Vitor Hercules Almeida da Silva*

O trabalho aqui presente se propõe a tratar do movimento operário na primeira república, venho estender essa perspectiva e também dar foco no papel do jornalismo em meio ao movimento operário no Brasil como também analisar a anatomia de “fake news” como ferramenta de repressão, termo que foi popularizado na atualidade mas que foi usado como forma de controle e formação de opinião pública desde os tempos medievais.

Também traçando paralelos entre o movimento operário durante a primeira república e outros movimentos trabalhistas e revoluções populares e como existem padrões em comum, mesmo que em níveis diferentes, dado seus diferentes contextos. Além dessas perspectivas, busco neste trabalho pensar no interesse do Estado e da burguesia frente às reivindicações das classes trabalhadoras, e explorar também a repressão física durante movimentos trabalhistas como outra arma estatal.

O PAPEL DA MÍDIA

Por muito tempo desde o advento do jornalismo impresso e até os meios de notícia que precederam ele, a disseminação de notícias eram ferramentas políticas adotadas para formar opinião pública, criar uma visão da realidade que nem sempre condizia com os fatos, além de refletir interesses políticos da classe dominante.

Desde panfletos e canções de tavernas que buscavam tecer uma narrativa a fim de deslegitimar um governo nas épocas medievais até o controle e dominação do jornalismo moderno em épocas de censura e supressão pública, a disseminação de narrativas falsas que buscavam favorecer os interesses da classe dominante e distorcer a realidade aos olhos da população, com o intuito de enaltecer determinado regime, esconder realidades e silenciar vocês que buscavam mudança através da demonização pública das mesmas. A disseminação de notícias sempre foi usada como arma política para favorecer interesses claros.

Quando falamos de organizações operárias ao longo da história, essa ferramenta não estaria fora da formação de opinião pública. Criando narrativas que diminuíram o poder político desses movimentos de proletariado mas também deslegitimando suas reivindicações, já que iam contra a corrente da organização classista da sociedade. No Brasil não foi diferente, os meios de notícia entrelaçaram a luta por melhores condições de trabalho durante a primeira república com o fantasma da ameaça comunista, com o claro intuito de dissuadir a opinião pública acerca de suas reivindicações, pois não se alinhavam com o interesse do Estado. Então a criação de narrativa tal como a dicotomia entre “bom operário” e “mal operário”, além da falsa e sem fundamento associação desses movimentos com a “ameaça vermelha” já citada acima, também podemos ver como a mídia usava da disseminação dessas narrativas para enfraquecer as causas e organizações políticas dos trabalhadores, até mesmo a falsa fusão dos partidos anarquistas com o intuito de fomentar medo dentro da população e crianças fissuras dentro dos movimentos.

O jogo midiático e o jogo político sendo usados como ferramenta para configurar a opinião pública de acordo com a intenção e interesses da classe dominante de cada época existiu por um bom tempo e sombras disso ainda podem ser vistas em outras formas nos dias atuais. Se fundamentando em meias verdades ou completas mentiras para alimentar medo e revolta popular contra um movimento com demandas de mudanças legítimas, a fim de sufocar, desmantelar, silenciar e até mesmo aniquilar quaisquer ato e organização política que desafiava os interesses da estrutura de dominação imposta em determinado tempo-espaço histórico. Um teatro de sombras muito eficaz para ludibriar a população, demonizar mudanças e manter a dominação.

INTERESSES POLÍTICOS PARALELOS

Quando ficamos no interesse da classe dominante, nesse seguimento busco focar não só nas classes dominantes em vigência durante revoluções populares, como também em grupos com aspirações de ascensão que usam da força do proletariado para alcançar seus objetivos e na escalada na escada política com a falsa intenção de uma mudança factual, para tanto tentarei traçar comparativos entre os diferentes partidos e seus interesses durante o movimento operário durante a primeira república, com a ascensão e legitimação da dominação burguesa durante a revolução francesa.

Neste comparativo não busco me estender ou detalhar os específicos desses adventos históricos, mas sim levantar a problemática do uso da força do proletariado como escada política dentro de movimentos trabalhistas, ou que se vendem com a intenção de trazer mudanças significativas para estes grupos, levando em consideração as particularidades de cada sociedade e seu tempo-espaço histórico.

Quando pensamos em revolução francesa, pensamos nos benefícios e impactos positivos que ela trouxe para a sociedade, não só na França, como seu impacto na história mundial, os ideais de igualdade e liberdade, a busca por democracia e uma real alterações na dinâmica e no sistema político da época com a queda da monarquia absolutista. Entretanto um fato que se torna plano de fundo, esse é o interesse da burguesia de legitimar seu poder através da revolução, e instaurar sua dominação. Os impactos positivos devem ser levados em consideração, mas não devemos esquecer os interesses pessoais ali presentes.

A burguesia buscava legitimar seu poder político através da queda da monarquia e na instauração de uma democracia, sob o pretexto de liberdade e igualdade para todos. Porém, a força de número do proletariado foi usada como ferramenta para essa escalada política e depois largada de mão. Sim, argumentamos que houveram mudanças significativas no tecido social e no sistema político, mas as reivindicações do proletariado, após a burguesia ter alcançado sua legitimidade política foram reconhecidas de forma parcial, apesar do sangue dos mesmos terem manchado as ruas em busca de mudança e de direitos, que no fim foram jogados de lado ou reconhecidos de forma parcial.

O intuito do que argumento não é tirar o mérito das mudanças sistêmicas que houveram durante essa revolução, mas sim apontar um denominador comum dentro de revoluções populares, sendo esse o uso do proletariado para a luta sob pretextos de mudanças e melhorias com intenções de escalada escondidas por trás de ideologias e lemas cativantes. Além disso não pretendo dizer que são interesses equiparados aos presentes na primeira república. O ponto que busco trazer é o padrão de interesses políticos paralelos dentro de movimentos sociais, mesmo que em níveis extremamente diferentes. Focando apenas nos aspectos similares dentro de movimentos envolvendo a classe trabalhadora.

O que nos traz de volta ao tema do movimento operário durante a primeira república, onde pude encontrar uma similaridade de interesses partidários por trás da luta de um determinado grupo trabalhista, seja esse interesse do próprio Estado como também de partidos aliados ao movimento, onde diversos interesses estavam se misturando com as demandas desses operários, com suas próprias agendas políticas, onde a intenção de somar forças se entrelaçam com suas próprias intenções políticas.

O uso do paralelo feito acima busca apenas elaborar um padrão visto em diferentes contextos de organização do proletariado sendo usadas de forma direta ou indireta para catapultar determinados e múltiplos interesses partidários, que acabaram surgindo em meio ao movimento operário durante a primeira república, que adotaram essa luta mas também buscavam, em certo nível, se estabelecer politicamente.

Trago esse aspecto não com a intenção de desmerecer o valor que esses grupos tiveram durante o movimento operário, mas sim para destacar o padrão perceptível dentro de diversos movimentos trabalhistas, onde a força e organização política é usada como auxílio indispensável para a luta por direitos, mas que isso não isenta esses partidos com diferentes ideologias de ter seus interesses que vão além da demanda e mudança em pauta.

O aspecto político no movimento operário durante a primeira república não se compara em termos de interesses subjacentes presente em outras revoluções e movimentos políticos trabalhistas, mas uso como exemplo para traçar comparativos e similaridades presentes ao longo da história quando falamos de organizações políticas populares. Isso não desmerece também a contribuição desses partidos e organizações políticas que tiveram grande papel de organizar as vozes desses trabalhadores, mas sim ressaltar a presença de uma pluralidade de partidos e interesses políticos que nem sempre se alinhavam com as demandas em questão.

A REPRESSÃO ESTATAL EM MOVIMENTOS TRABALHISTAS

Para concluir as observações sobre os diversos movimentos trabalhistas e suas relações, trago talvez o de maior valor, que junto com a distorção de imagem por meio da mídia era utilizado como forma de repressão, junto a repressão policial por parte do Estado, que assim como disseminação de falsas narrativas, a repressão física era um artificio de silenciamento extremamente presente em qualquer revolta popular, porém foco no seu papel no movimento operário da primeira república, onde esse silenciamento físico teve grande papel no controle e supressão de vozes durante a luta por direitos.

Esse aspecto é visto ao longo da história de movimentos sociais, onde a força bruta junto a difamação e demonização são usadas como ferramentas de supressão. Durante a primeira república não foi diferente, muito mais que isso, foi um dos aspectos definidores deste acontecimento. Ao falar das fortes repressões policiais nas manifestações políticas dos operários, se defende que os comunistas, os religiosos, os anarquistas, etc, concordavam que a polícia, representante do Estado, era o que inviabilizava a luta pelos direitos.

Apesar de posteriormente utilizarem de táticas mais sutis, a repressão por parte do Estado continuava presente no silenciamento deste grupo. Vale a pena ressaltar que esse aspecto não era particular às reivindicações que ocorreram nessa época, o uso de repressão policial por parte do Estado esteve presente ao longo da história. Essa ferramenta de dominação não é particular, porém é necessário que se ressalte pois é um fator comum em lutas por direitos ao longo da história.

Em suma, a intenção deste trabalho era fazer o esforço de traçar fatores comum em lutas populares destoantes e como esses padrões e processos se repetem ao longo da história.

REFERÊNCIAS:

  • COSTA, Emília Viotti da. A nova face do movimento operário na primeira república. Revista Brasileira de História, São Paulo, v. 2, n. 4, p. 217-232, 1982.
  • BIGOTO, Benedito Marcos¹. A Participação da Burguesia Francesa nas Revoluções e Movimentos Sociais Contemporâneos. Revista Científica UNAR (ISSN 1982-4920), Araras (SP), v. 15, n. 2, p. 67-85, 2017.

*Graduando em Ciências Sociais pela UFRRJ. Participa de pesquisas na área de sociologia da cultura e relações de poder

Roniel Sampaio Silva

Mestre em Educação e Graduado em Ciências Sociais. Professor do Programa do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Piauí – Campus Campo Maior. Dedica-se a pesquisas sobre condições de trabalho docente e desenvolve projetos relacionados ao desenvolvimento de tecnologias.

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