Quando amadores governam… Tragédia e amadorismo no Brasil*

Por Cristiano Bodart
Fico perplexo ao deparar com o amadorismo que abarrota a (de)gestão
pública. Seria o Brasil o país do amadorismo?
Li ontem, no portal G1, uma matéria jornalística que, mais uma vez, me
deixou perplexo. A matéria inicia-se da seguinte forma:

Após a tragédia que
matou mais de 230 pessoas em 
Santa Maria,
no Rio Grande do Sul, várias cidades do país estão intensificando a
fiscalização nas casas noturnas
”.

A redação da matéria é suficiente para identificarmos questões
absurdas, porém, normais e corriqueiras no “país do amadorismo”.
Nota-se que

após a
tragédia
” tem-se inicio uma preocupação com a fiscalização. Nesse sentido,
fiscalização deixou de ter seu sentido original de prevenção para passar a
atuar como juiz: ação punitiva. É como se nas cabecinhas dos nossos
(des)gestores estivesse tal pensamento: temos que punir os empresários culpados
de tragédias como essa. Tal pensamento sugere que tais empresários constroem
suas casas de show do dia para a noite e que importa, agora em funcionamento,
serem fiscalizadas. Aff, é de o queixo cair sobre o dedão do pé.

Outro ponto, ou melhor, aberração a ser destacada é que “várias cidades do país estão intensificando
a fiscalização nas casas noturnas”.
Tal afirmativa induz o leitor a
acreditar que trata-se de um número significante de cidades, o que não é
verdade. Nota-se ainda que o foco são apenas as casas noturnas, como se as
irregularidades fossem centradas apenas ali. Será que precisamos ter novas (que
parecem já serem velhas) tragédias para que outras áreas de perigo possam
receber fiscalização, ainda em suas construção? Seria necessário, no “país do
amadorismo”, ocorrer tragédias em escolas, templos religiosos, circos, parques,
rodoviárias, restaurantes, bancos, entre outros lugares de grande público para
que haja fiscalização nesses locais?
É de nos deixar perplexo com tanto amadorismo que abarrota a (de)gestão
pública (sem entrar aqui no mérito dos subornos tão comuns em casos de
fiscalização).
Dizem que o Brasil é o país do futuro. Há nisso um fundo de verdade: por
essas bandas precaução não existe, preferimos o futuro… primeiro tragédia
depois, só depois, fiscalização… o pior que o depois está ainda em um futuro
distante. Por ora algumas poucas cidades passaram fazer uma fiscalização
meia-boca. Por isso que ao invés de “país do futuro”, prefiro o adjetivo
“amador”.
* Esse texto não tem pretensões teóricas sociológicas. Trata-se apenas de uma reflexão/desabafo entorno do amadorismo impregnado na gestão pública.

Cristiano Bodart

Doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP), professor do Centro de Educação e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal de Alagoas (Ufal). Pesquisador do tema "ensino de Sociologia". Autor de livros e artigos científicos.

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