Resumo: BOM GOVERNO NOS TRÓPICOS: UMA VISÃO CRÍTICA

Por Cristiano Bodart
…………………………………………………………………………………..

Não posso deixar de indicar esse livro. Busco semanalmente ler um livro, mas nem sempre a escolha do livro é tal surpreendente como foi este. Na verdade não foi bem um escolha pessoal, o meu professor no curso de doutorado o indicou. E que indicação. Muito bom. Abaixo um pequeno resumo/comentário que sempre gosto de fazer de minhas leituras:
……………………………………………………………………………………….

Na obra “Bom Governo nos Trópicos”, Judith Tendler buscou apontar a existência de boas experiências de governos entre os países em desenvolvimento.

.

Para esta autora as explicações teóricas do mau desempenho dos governos de países em desenvolvimento, embora exatas em diversos aspectos, proporcionaram o surgimento de diversos equívocos, entre eles destacando-se: a generalização de que todos os governos são ruins e por tanto devem ser reformados; que deveria ser replicado as experiências bem sucedidas (experiências na Austrália, Nova Zelândia, Inglaterra, em menor grau, nos Estados Unidos) nesses países; a visão hegemônica de que os mecanismos de mercados são superiores para solucionar os problemas existentes nos países em desenvolvimento; estudos sobre as raízes do mau desempenho desses países contradizem ou ignoram o conjunto de evidências sobre as causas do melhor desempenho das grandes organizações dos países industrializados e; super-valorização da reforma do setor público a partir de uma fé excessiva nas ações do “usuário” ou “cliente” dos serviços públicos.

.

Tendler buscou estudar diversas experiências no Nordeste do Brasil, especificamente no governo do Ceará. O fator motivador desse estudo estava em responder a seguinte indagação: “Como pôde um governo estadual que fazia parte de uma região com uma história tão longa e estável de desempenho medíocre ‘subitamente’ se desempenhar tão bem?” (p.25). A autora buscou identificar quais elementos foram decisivos para que esse governo tornar-se um modelo para o restante do país.

.

Ao analisar o programa de saúde daquele governo – que teve início em 1987 como uma pequena parte de um programa emergencial de geração de emprego – identificou aspectos decisivos para o sucesso de tal programa. A descentralização, vivenciada na época no país, não significou menor ação do poder central no Ceará, pelo contrário, ele estava fazendo mais e fazendo algo bem diferente. O que o governo do Ceará fez foi “dividir o trabalho” com a esfera local. Cada uma das esferas passou a ter competências complementares. A fim de romper com o histórico clientelismo, o Estado ficou na responsabilidade de contratar os indivíduos do município onde seria implementado o programa. Ao poder local cabia a contratação apenas de alguns poucos chefes de enfermagem. A supervisão do bem desempenho do programa na esfera local ficou a cargo da população (especialmente os candidatos a agente de saúde não contratados – os rejeitados no processo de seleção viraram controladores), podendo esses realizar denuncias. Outra tática do governo foi desenvolver nos agentes de saúde o orgulho pela sua posição e de seu papel. Para aproximar o agente de saúde da população desconfiada dos “programas políticos” foram desenvolvidas pequenas ações curativas e de orientação preventiva (o que a autora chamou de “curativismo insinuante”).
.
O programa inicialmente foi implantado em poucos municípios (pois não eram obrigados a aderirem). O Estado, a fim de superar tal limitação, utilizou-se da propaganda. Por meio da mídia noticiava os bons resultados e os benefícios aos cidadãos, o que gerava uma pressão popular sobre os prefeitos que não havia aderido ao programa. Desta forma o programa se expandia a cada ano. Outro ponto importante estava na possibilidade dos prefeitos se utilizarem dos bons resultados para se promoverem.
.
A atitude dos agentes e dos “clientes” foi fundamental para o bom governo. A relação entre eles embasava-se na confiança. O agente não via o “cliente” apenas como alguém que ele precisava conscientizar, mas alguém de que ele queria e precisava do respeito, do reconhecimento e da confiança..“É esse tipo de relação de confiança mútua entre trabalhadores e seus clientes que está agora recebendo atenção nas recentes tentativas dos especialistas de explicar o sucesso de estados que se desenvolvem, de programas públicos e de grandes empresas privadas. Mas o pressuposto do interesse próprio, adotado pela corrente hegemônica da literatura sobre desenvolvimento, dificulta reconhecer essas relações quando surgem e tomá-las como ponto de partida quando se pensa sobre como melhorar o governo” (TENDLER, 1998, p.65).
.
.
Bibliografia
TENDLER, Judith. Bom governo nos Trópicos. Trad. de Maria Cristina Cupertino. Rio de Janeiro:Revan, Brasília, DF: ENAP, 1998.

Cristiano Bodart

Doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP), professor do Centro de Educação e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal de Alagoas (Ufal). Pesquisador do tema "ensino de Sociologia". Autor de livros e artigos científicos.

Deixe um comentário

Your email address will not be published.

Sair da versão mobile