Somos todos Macacos? Dois pontos de vista sobre o caso

Por Roniel Sampaio Silva
Atualizado 01/05No último jogo entre Barcelona e Villarreal o jogador brasileiro Daniel Alves foi provocado por um torcedor adversário que atirou uma banana em sua direção durante a partida. Essa prática é comum na Europa, no Brasil e em outros lugares e tem uma conotação racista, uma vez que cria o esteriótipo de que o negro é simbolicamente um macaco; atríbuindo uma metáfora racista e nefasta.

Inusitadamente e sagazmente o referido jogador comeu a banana de uma forma corriqueira para mostrar seu repúdio e desdém ao ato racista do torcedor. Fora de campo, o também jogador da seleção brasileira, Neymar JR, iniciou uma campanha em seu twitter com a hastag #SomosTodosMacacos. Na camapanha, ele aparece com seu filho comendo banana em alusão ao episódio Daniel Alves. A proposta teria sido planejada pela agência de publicidade Loducca.
Essa campanha se espalhou principalmente pelo Brasil. É possível fazer muitas leituras sobre ela. Vamos apresentar duas leituras totalmente antagônicas: Todavia, antes disso, é necessário consultar o dicionário para compreender os sentidos da palavra:

s.m. Gênero de mamíferos quadrúmanos, da tribo dos monos. (Os macacos formam a subordem dos símios. Vivem nos países quentes, onde se alimentam de frutas e de sementes. São geralmente animais inteligentes, sociáveis, muito ágeis. Os grandes macacos [chimpanzé, gorila, orangotango] são atualmente os animais mais próximos do homem.) / Fig. Aquele que parodia, imita as ações dos outros: é um verdadeiro macaco. // Macaco velho, sujeito astuto, ladino, finório. // Macaco velho não mete a mão em cumbuca, quem tem experiência e astúcia não cai em esparrela. // Mandar (alguém) pentear macaco, mandá-lo às favas. // Cada macaco no seu galho, cada um deve ficar na sua condição. / &151; Adj. Fino, sagaz, astucioso. / Feio, desproporcionado. (AURÉLIO, 2014)

 


1- A campanha #Somos TodosMacacos combate o preconceito
Analisando os vários significados apresentados pelo dicionário podemos ver que a maioria se refere à atributos negativos, embora haja elementos positivos. Os defensores da campanha tentam ver os aspectos mais positivos que estão relacionados ao nossa condição de primata, tentando fazer um nivelamento de sentido.
As celebridades em geral costumam ter um poder maior de criar virais, chavões e bordões. Suas ações, palavras e ideias costumam tomar dimensões maiores e a publicidade pode ser usada positivamente.
O Brasil recebeu a campanha e se colocou em defesa do jogador Daniel Alves, tomou as dores e passou a postar fotos iguais nas redes sociais: comendo banana e criticando o preconceito contra o brasileiro.
Nesse sentido, a propaganda pode ser vista como positiva na medida em que há em uma banalização do signo “banana”, criando um esvaziamento do sentido pejorativo tirando o foco da associação racista; tudo isso  no plano da desconstrução simbólica. Assim, todo mundo passa a ser macaco: brancos, pretos, brasileiros, europeus e africanos. Desse modo, a banana e o macaco passam a ser símbolos banalizados.
O processo de desconstrução ocorre do estranho para o familiar, do particular para o geral, no sentido do atributo macaco não ser apontado como algo estritamente relacionado ao negro.
Desta maneira, a imagem  associada a uma ideia pejorativa e que causa um desconforto subjetivo, o qual Roland Barthes¹ que chama de punctum, tornar-se-ia
studium que está relacionado à ordem natural ou cultural.
Outro ponto de vista, nós coloca todos na condição de macacos, por assim dizer como primatas, que biologicamente faz alusão à família dos primatas a qual somos incluídos.Sobre essa discussão recomendo ver o vídeo que trata o assunto de maneira séria:

Outro vídeo trata o assunto de maneira bem humorada, chama-se “Dancem macacos”  que mostra exatamente essa percepção traz uma crítica sagas da nossa negação da humanidade:

2- a campanha #SomosMacacos reafirma o racismo
Os que se posicionam contra a campanha também reconhecem a banana sendo utilizada como signo que faz apologia ao racismo e, geralmente, não condenam o ato de Daniel Alves, mas o desdobramento: a campanha #SomosTodosMacacos. Tal desdobramento reafirma  o esteriótipo negativo de macaco, que é tradicionalmente atribuído aos negros, pobres e habitantes das zonas tropicais. Tendo em vista a cor de pele, o alto consumo de banana, devido ao “preço de banana” do alimento, ou a abundância da fruta nos países tropicais. Será que a comoção dos brasileiros foi por conta do racismo ou da xenofobia? Tomaram as dores de Daniel Alves em favor dos negros ou em favor dos jogadores brasileiros que atuam
fora do país?
É mais possível que o caso Daniel Alves faça alusão mais ao darwinismo social e ao determinismo geográfico do que algo relacionado ao racismo por cor de pele. Tais pensamentos nada tem a ver com macaco no sentido biológico, mas no o sentido do senso comum por reduzir outros grupos culturais de maneira pejorativa, atribuindo um rótulo que no imaginário social está vinculado à características negativas.
Se os brasileiros aderiram com tanta facilidade a campanha, por que nossa sociedade ainda é tão racista? Por que a polícia mata mais negros que brancos? Por que os negros
têm as menores rendas e os menores acessos a bens e serviços? O negro nos altos escalões de poder é regra ou exceção? Não basta aderir as campanhas publicitárias estilo flashmob, é necessário transcender as hashtags: compreender a situação dos negros e pobres no Brasil e buscar soluções para que ela melhore. Como se não bastassem a banalização da coisa, é incrível como a indústria cultural consegue se apropriar da desgraça alheia para tirar proveito financeiro, seja visando a promoção pessoal ou visando lucro material direto. O preconceito que é pra ser discutido para encaminhamento das melhores soluções, acaba se banalizando no consumo.
Os discursos de redes sociais muitas vezes acabam vazios e superficiais, buscam um mundo de aparências e consumo em que mais vale combater o sintoma do que a doença. É mais importante parecer do que ser. No final das contas muita gente diz ‪#‎SomosTodosMacacos‬, mas nas práticas cotidianas diz ‪#‎CadaMacacoNoSeuGalho‬ ou ainda, #ChutaQueÉMacumba.A campanha #SomosTodosMacacos  reafirma o racismo porque cria um desencargo de consciência e combate o racismo apenas no plano linguístico, por isso teve tanta adesão da sociedade brasileira.

A Minha vontade é que essa mesma disposição seja usada para a valorização da cultura afro-brasileira e na luta para garantir melhores oportunidades, serviços e condições para as pessoas, independentemente de sua cor, e ajude a superar as conclusões de Florestan Fernandes², de que estamos longe de ser uma democracia racial.

1- BARTHES Roland, A Câmara Clara, Lisboa, Edições 70, 2005, 172 p
2- FERNANDES, Florestan. A integração do negro na sociedade de classes. São Paulo: Dominus-
USP, 1965.

Roniel Sampaio Silva

Mestre em Educação e Graduado em Ciências Sociais. Professor do Programa do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Piauí – Campus Campo Maior. Dedica-se a pesquisas sobre condições de trabalho docente e desenvolve projetos relacionados ao desenvolvimento de tecnologias.

7 Comments

  1. E uma pena ouvir do ser humano atos racistas .porque somos todos iguais aos olhos de Deus independente de cor ,raças,

  2. E uma pena o ser humano agir dessa forma reafirmar o racismo.fazendo gracinhas.sabendo que é crime.somos todos iguais independente de cor ,cultura,

  3. INACEITAVEL ESSA SITUACAO JA QUE FALAM QUE VIEMOS DO MACACO,NAO DEVERIA ACHAR QUE E PRECONCEITO ,MAS ISSO PROVA QUE O SER HUMANO NAO QUER SE COMPARAR A ESSE ANIMAL.DEVERIA TER LEIS MAIS SEVERA PARA PUNIR ESSES RACISTAS SEM NOCAO

  4. O racismo sempre será uma pauta importante e nunca poderá ser tratada como vitimismo. Quem sofre o racismo tem a pior experiência e não tem remédio que cure essa dor.

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