Personalidades

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Um cientista social é um intelectual? Para uma aproximação à essa resposta, torna-se necessário uma segunda indagação: o que é um intelectual? Tal questão não é mera retórica de autoajuda. Trata-se de uma reflexão – em sentido original.

A palavra “reflexo” tem origem no latim. Formado pela junção de “RE” e “FLEXUS”. Em latim, “RE” significa “outra vez, novamente”, enquanto que FLEXUS, “dobrado, fletido, retornado”. A palavra “reflexo” diz respeito ao:

  1. desvio da direção de um tipo de energia (luminosa, sonora, etc.), ou;
  2. ao processo mental em que voltamos nosso pensamento ao assunto, ou ainda;
  3. ao fenômeno de desvio da luz (razão) ao assunto que queremos esclarecer (trazer a luz), no caso aqui a postura de um cientista social diante do mundo.

Primeiramente é importante deixar claro que ser um cientista social não

equivale a ser um intelectual, como alguns pensam e se intitulam. Se partirmos da definição de Gramsci, veremos que o intelectual independe de sua formação acadêmica, antes estaria ligado ao lugar ocupado no mundo social. Ser intelectual está relacionado a uma ação social, à uma certa postura capaz de fazer a ligação entre a superestrutura e a infra-estrutura.

Gramsci em sua obra “Materialismo histórico a à filosofia de Benedetto Croce”, de 1981, aponta que qualquer indivíduo pode ser um intelectual/filósofo:

“É preciso destruir o julgamento de que a filosofia é algo sumamente difícil por ser a atividade intelectual própria de uma determinada categoria de cientistas especializados ou de filósofos profissionais e sistemáticos. É preciso, portanto, demonstrar que todos os homens são filóso“fos”, e definir os limites e as características desta “filosofia espontânea” própria de todos, isto é, a filosofia que nela está contida” (Gramsci, 1981: 15).

Porém, para Gramsci o intelectual estaria ligado a uma classe, responsável por criar e disseminar a ideologia desta. Tal intelectual seria o que ele denominou de “intelectual orgânico”. Nome que faz analogia a manutenção do sistema da sociedade orgânica, no sentido durkheimiano.

Por outro lado, Sartre aponta a existência do intelectual engajado. Para ele o “intelectual verdadeiro” seria o revolucionário, enquanto que os reacionários seriam “intelectuais falsos”. Bobbio tece, às definições de Sartre, uma crítica ligada ao conteúdo ideológico-partidário existente.

“Falsos são os que desempenham uma função que para Sartre é negativa, e é negativa unicamente porque não desempenham a função que segundo ele deveriam desempenhar. Assim, será o verdadeiro intelectual o revolucionário; falso o reacionário; verdadeiro será aquele que se engaja, falso, aquele que não se engaja e permanece fechado em sua torre de marfim.” (BOBBIO, 1997, p. 14)

Para Bobbio, o critério para definir o intelectual não é sua orientação ideológica, mas sua prática – seu engajamento. Mannheim, afirmava que a tarefa do intelectual é teórica e imediatamente política, pois cabia a ele elaborar síntese das ideologias existentes que dariam passagem a novas orientações políticas.

Foucault apontou, principalmente por meio de sua prática, que é necessário afastar-se do poderes constituídos para poder realizar a crítica. Sua ideia estaria centrada na busca de uma neutralidade intelectual, o que é bem contestável. De qualquer forma, o intelectual seria um indivíduo crítico, aquele que põe em crise as “verdades” estabelecidas.

Retomamos a questão inicial: um cientista social é um intelectual? A resposta vem à medida que pensarmos, qual a sua posição social no mundo?

Não queremos apresentar uma resposta, que certamente nem temos de forma acabada, mas apontar que ser intelectual nada tem haver com um diploma de cientista social ou coisa do gênero. A questão está no lugar que você se coloca no mundo.

 “E zombei de todo mestre
que não zombou de si mesmo.” (NIETZCHE, Gaia Ciência)

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O blog é uma das referências na temática de ensino de Sociologia, sendo acessado também por leitores de outras áreas. Há vários materiais didáticos disponíveis: textos, provas, dinâmicas, podcasts, vídeos, dicas de filme e muito mais.

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