Você apoia justiceiros? Então quem defende bandido é você

Jovem testa tatuada
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O fenômeno social dos linchamentos, da justiça popular não é novidade no país. Estes fatos tem sido cada vez mais frequentes e têm tomam dimensões cada vez maiores, potencializados pelo alcance que as novas ferramentas comunicacionais proporcionam.

Os linchamentos já vitimaram muitos inocentes e mesmo com isso continuam sendo praticado e encorajado pelos partidários da justiça popular. Tal segmento acusa os que condenam a justiça popular de serem defensores de bandido, curiosamente o que ocorre é o contrário. Os apologistas da justiça popular reificam os criminosos a despeito das acusações imputadas aos partidários da justiça formal.

Antes de argumentar em torno do que é justiça popular ou justiça com as próprias mãos é preciso diferenciar legítima defesa de justiça com as prórias mãos, assim afastaremos os espantalhos. Legítima defesa segundo o Art. 25 nosso código penal. Desse modo,

Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

Portanto, não há legítima defesa quando um suspeito está rendido e não representa risco. Já justiça com as próprias mãos é quando o indivíduo se vale do seu conceito de justiça pra estabelecer um julgamento e pena conforme suas convicções individuais. Justiça é um conceito que não é da seara individual, este pertence a uma coletividade, resguardado o direito à defesa e contraditório. A justiça com as próprias mãos é considerada crime pelo código penal brasileiro no seu Art 345.

“Fazer justiça pelas próprias mãos, para satisfazer pretensão, embora legítima, salvo quando a lei o permite: Pena – detenção, de quinze dias a um mês, ou multa, além da pena correspondente à violência.”

Em suma, os justiceiros são pessoas que se valem de uma situação oportuna e que, legitimados socialmente pela sede de vingança, se valem de tal clamor para exercitar seu sadismo e cometer crimes, alguns dos quais em alguns casos ainda mais graves do que dizem coibir. Os apologistas da justiça popular, contraditoriamente, defendem que criminosos se valam de seu poder para supostamente coibir crimes. Portanto, os apologistas da justiça com as próprias mãos defendem criminosos, os justiceiros; ao contrário dos legalistas que defendem que cada um seja julgado e, caso condenado, cumpra com seus crimes na forma da Lei. Além disso, como se não bastasse defender bandido os apologistas também comentem crime,  Art. 287 do Código Penal :

Fazer, publicamente, apologia de fato criminoso ou de autor de crime: Pena – detenção, de três a seis meses, ou multa.

Para ilustrar bem essa situação citemos o caso de justiça com as próprias mãos cujo articulador foi um tatuador. Analisemos a seguinte ordem dos fatos:

1- Um adolescente com transtornos mentais invade a casa do vizinho.
2- Outras pessoas imaginam tratar-se de um assalto.
3- Um tatuador e um comparsa rende o suspeito e se vale de sua força pra tatuar no invasor “sou ladrão e vacilão”, filmam e fazem chacota do suspeito.
4- O garoto além de problemas mentais vai ter que carregar o estigma para o  resto da vida porque os justiceiros se valeram do clamor popular pra se colocarem acima da lei.
5- O suposto invasor está livre porque não conseguiram sequer provar o crime. O dono da bicicleta que seria roubada repudia a ação.
6- Os justiceiros são presos pela polícia e vão responder criminalmente pela ação. Frustraram um crime, praticando outro crime ainda mais grave, tortura – inafiançável e imprescritível pelo nosso código penal. Um participantes da ação que filmou o adolescente, Ronildo Moreira da Araújo, já havia sido condenado por roubo.

Neste episódio fica claro que a situação de instabilidade social parece legitimar atos de justiça popular. Em muitos casos os justiceiros se valem dessa legitimidade para cometer crimes sob pretexto de coibir outros crimes, contraditoriamente.  Nesse e em muitos casos os crimes cometidos pelos justiceiros são ainda piores. Além disso, tais justiceiros tem apoio popular de pessoas que dizem repudiar quem defende bandido, contraditoriamente, são eles os principais defensores dos muitos bandidosque se escondem sob alcunha de justiceiros.

Todos os suspeitos de serem bandidos merecem um julgamento na forma da Lei, tanto os que se intitulam justiceiro como os outros. Isso não é defender bandido, é defender justiça. Defender bandido  é defender quem quer fazer justiça com as próprias mãos.

Referências:

BRASIL. Código de processo penal (1941). Código de processo penal.

MARTINS, José de Souza. Linchamentos: a justiça popular no Brasil. São Paulo: Contexto, 2015

Roniel Sampaio Silva

Mestre em Educação e Graduado em Ciências Sociais. Professor do Programa do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Piauí – Campus Campo Maior. Dedica-se a pesquisas sobre condições de trabalho docente e desenvolve projetos relacionados ao desenvolvimento de tecnologias.

2 Comments

  1. Você usa como argumento a lei do estado, se estivesse na lei matar alguém que você deve matar alguém você o mataria?

    • Amigo, a noção de certo e errado, apesar de vim culturalmente, vai passar sempre pela dimensão particular. Devemos olhar sim para a lei com o senso crítico pois coisas devastadoras como o próprio nazismo foi legal.
      Como agir então, diante de um conjunto de normas que é aplicado, sem ser um gado manipulado?
      Senso crítico. A questão é que um senso crítico eficiente deve vim acompanhando de conhecimento. Então, quando olhamos para uma lei como essa que pune justiça com as próprias mãos, podemos entender e analisar que ela é necessária pois a história nos mostra que a política do olho por olho, dente por dente (lei de talião) já foi terrível um dia. Poderíamos pensar no que seria melhor para um bem estar social. Abraço

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