Campo Social Bourdieu
Campo Social: Bourdieu contra o subjetivismo
Por Vinicius Siqueira de Lima*
Uma das maravilhas da sociologia é sua capacidade de explicar o mundo social (muitas vezes) sem a necessidade de considerar a vontade do indivíduo como impulso inicial para a ação humana. A vontade pode ser reduzida às condições exteriores ao indivíduo, ou seja, pode também ser analisada a partir de fatores causais, como qualquer ciência faz.
Os desígnios da vontade estão delimitados a partir da posição social que um indivíduo ocupa dentro do espaço social. Em Pierre Bourdieu, o espaço social é um espaço não físico em que posições distintas estão dispostas. As posições sociais de um mesmo espaço social estão sob um mesmo parâmetro de regras e se relacionam umas com as outras a partir dos diferentes capitais acumulados (como capital econômico, as riquezas; capital cultural, o acúmulo da cultura legítima; ou capital social, o pertencimento a um grupo social, uma família distinta). O espaço social, quando olhado dinamicamente, é um campo social em que os diferentes indivíduos (no caso, agentes sociais) disputam posições e almejam a legitimidade, a posição máxima no campo: querem ser dominantes. Ao mesmo tempo, os dominantes querem manter sua dominação.
Esta luta incessante determina não só a posição de cada agente, mas também suas possibilidades práticas de ação, já que um agente em posição menor nem mesmo tem as técnicas necessárias para ser como um agente em posição dominante (por exemplo, uma pessoa pobre, nascida e criada na periferia, dificilmente domina toda a etiqueta de um jantar de gala ou tem interesse em culinária gourmet francesa – estas, por sua vez, são duas marcas distintivas no campo cultural, são capital social e cultural, respectivamente).
É por isso que o campo social é um campo de forças. As relações mútuas entre os diversos agentes os colocam em situação de dependência, onde o lado que exerce mais força é o lado dominante.
É por isso que o campo social é um campo de forças. As relações mútuas entre os diversos agentes os colocam em situação de dependência, onde o lado que exerce mais força é o lado dominante.
Os diferentes agentes sociais estão delimitados não só externamente, mas também internamente. Habitus é o conceito de Bourdieu para romper com a dicotomia objetivo x subjetivo e explicar a adequação de cada agente no campo. Habitus são “esquemas geradores de
classificações e de práticas classificáveis que funcionam na prática sem chegar à representação explícita, e que são o produto da incorporação, sob a forma de disposições, duma posição diferencial no espaço social” [Bourdieu, Estruturas Sociais e Estruturas Mentais]
classificações e de práticas classificáveis que funcionam na prática sem chegar à representação explícita, e que são o produto da incorporação, sob a forma de disposições, duma posição diferencial no espaço social” [Bourdieu, Estruturas Sociais e Estruturas Mentais]
O habitus coloca o indivíduo em seu lugar porque lhe dá práticas que parecem ser corretas para cada ocasião. Neste caso, o campo social não pode ser estudado isolado do habitus: se fizermos assim, correremos o risco de voltarmos à concepções objetivistas da sociedade.
O estudo combinado de habitus e campo social é o estudo – grosso modo – do Uno social. O sujeito não é diferente da sociedade, já que só pode ser sujeito dentro dela; já a sociedade não é sociedade sem sujeito. De certa forma, ambos nascem juntos, não há ser social sem sociedade e vice-versa.
A “grande sacada” de Bourdieu foi ter entendido que o ser físico durkheimiano não é diferente do ser social. O físico também existe a partir do social, basta ler o texto de Marcel Mauss – sobrinho de Durkheim – sobre as técnicas corporais. É neste texto que Mauss, por sua vez, coloca o habitus em jogo, o descrevendo como técnicas sociais incorporadas, “esses ‘hábitos’ variam não simplesmente com os indivíduos e suas imitações, variam sobretudo com as sociedades, as educações, as conveniências e as modas, os prestígios. É preciso ver técnicas e a obra da razão prática coletiva e individual, lá onde geralmente se vê apenas a alma e suas faculdades de repetição” [Marcel Mauss, As técnicas do corpo].
Habitus e campo social são parte de uma mesma arma conceitual. São resoluções para problemas interligados.
Referências
- Gilson Pereira e Afrânio Catani. Espaço social e espaço simbólico: introdução a uma topologia social.
- Colunas Tortas. Pierre Bourdieu e o campo social.
- Marcel Mauss. As Técnicas do Corpo IN: Sociologia e Antropologia.
* O autor desse texto também escreve em Obivios Magazine e Colunas Tortas