Mente ocupada para não servir de oficina do diabo: O objetivo “ralo” das escolas públicas.
Roniel Sampaio Silva
É comum escutar um ditado que difundiu-se na cultura popular: “mente vazia, oficina do diabo”. Pretendo fazer uma breve reflexão acerca desta expressão de modo a relacioná-la com a condição do ofício docente. Vamos pensar para além da repetição deste ditado e tentar aprofundar sobre alguns
possíveis sentidos que alimentam nossa direcionamento docente hoje?
possíveis sentidos que alimentam nossa direcionamento docente hoje?
Tal expressão reverbera tanto em Portugal como no Brasil e tem sua origem pouco esclarecida, mas pela composição do ditado podemos especular que tenha uma relação com a questão religiosa e a concepção cristã de trabalho.
O ditado é bem positivo e válido dependendo da forma e do objetivo que se ocupe a mente. Por essa razão, e outras razões, o percurso da humanidade fez com que surgisse a tendência de se criar um profissional que ocupasse a mente dos jovens para afastá-los dosfins diabólicos: o professor. O professor professa o sujeito sem luz (a-luno), afastando-o do caminho das trevas.
Na nossa tradição de herança lusitana, o professor tem como precursor o jesuíta que fora utilizado para catequizar e “ocupar a mente” dos índios, negros e demais pessoas, cujo o imaginário estava carregado da ideia de que esses precisavam ser inseridas nos paradigmas da sociedade da época. Na concepção de Antônio Nóvoa, este legado faz com que a profissão docente seja vista como um ofício sacerdotal, ou seja, o professor deve trabalhar por amor e não pelo seu retorno financeiro.
A palavra ócio tem origem etinológica relacionada à calma, sossego, tranquilidade serenidade e folga. Com o advento da secularização e do embrionamento da capitalismo a visão religiosa passou a combater efusivamente o ócio e associá-lo à “vagabundagem” e a delinquência. Fazer comércio era negar o ócio, virando negócio daí a origem da palavra. No mundo em que exigia-se uma ocupação cada vez maior, não se tinha tempo para família e filhos, era necessário um profissional que ocupasse a mente dos jovens desistidos de suas famílias e, como ainda não tinham ou não conseguiam se inserir nos “negócios”, eram mal vistos pela sociedade, e de certa forma negados por ela.
Na antiguidade grega clássica, fora criado a scholé, que significa lugar de ócio. Recinto para o qual eram enviadas as pessoas cujo tempo livre era destinado para reflexão. Era um espaço terno, calmo, positivo e de reflexão com um número bem restrito de participantes . Para um grupo seleto da população, o ócio era considerado algo extremamente na referida antiguidade clássica. No entanto, a partir da constituição de uma ética protestante orientada ao trabalho, o ócio das pessoas cujas condições sociais eram mais favoráveis, adquire e se reafirma como algo negativo, como é entendido até hoje.O fato dos profissionais da educação pública não terem adequada valorização profissional e ter condições precárias de trabalho para atuar com a qualidade exigida pela sociedade moderna, nos levam a crer que tais profissionais foram socialmente construídos tão somente para ocupar a mentem dos jovens, ainda que para adiar um problema para um governo futuro. Ao invés de uma formação sólida, marcada por uma grande riqueza cultural, aos alunos de escolas públicas resta apenas a mente ocupada. A ocupação não necessariamente com “coisas” que o tornará um cidadão pleno, crítico e criativo. Assim, com poucas condições dos professores para estimular o desenvolvimento de uma mente crítica, engajada, criativa e preparada nos educandos, resta apenas ocupar a mente destes, para que, pelo menos, não tenham a sua mente ocupada e não seja encaminhado para o próprio “diabo”, para que este se encarregue da mente e continue o serviço o qual não houve condições de ser finalizado adequadamente. Mente ocupada para não servir ao diabo, eis o objetivo “ralo” das escolas públicas e agora falta apenas descobrir quem são exatamente os tantos diabos.