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Texto para reflexão

Estes textos oferecem uma visão diferenciada e interessante sobre vários acontecimentos cuja análise pode ser feita por meio da sociologia.

A reflexão é um importante instrumento intelectual para fazer com que o indivíduo consiga perceber a relação entre as estruturas sociais e as biografias individuais.

Na Sociologia sempre esteve presente a discussão entre indivíduo e sociedade (agencia vs. estrutura), chegando ao ponto de estudiosos mais radicais, principalmente nas primeiras décadas do século XX, ignorar os estudos que tinham seu foco no
indivíduo. Simmel, por exemplo, foi um sociólogo renegado por anos por esse motivo.  Bauman e May nos ajudam a entender em quais condições o indivíduo é objeto da Sociologia. Para esses autores “atores individuais tornam-se objeto das observações de estudos sociológicos à medida que são considerados participantes de uma rede de interdependência .

Desse modo os textos para reflexão ensejam uma análise de como nós nos relacionamos com nossa estrutura e proporcionam um contraponto discurso do discurso dominante.

  • O programa Esquenta e a Naturalização das Desigualdades Sociais

    O programa Esquenta e a Naturalização das Desigualdades Sociais

    Convido-o a refletir (sem muito compromisso com o rigor científico) uma questão social com o auxílio da Sociologia…
    MG 016333
    Os dois lados (embora existam vários) da moeda do programa de tv “Esquenta”.
    O programa exibido na TV aberta, chamado “Esquenta”, parece ter uma proposta de criar uma aproximação entre artistas e a população de menor poder econômico, assim como colocar a cultura destes na maior vitrine do país: Rede Globo.
    Hoje, almoçando na companhia agradável de duas amigas conterrâneas (embora estávamos em um restaurante paulistano – contatos sociais que São Paulo nos proporciona) chamou-me a atenção o referido programa por ter como convidado um grupo de garis vestido com uniformes de trabalho. Possivelmente o produtor do programa teria como objetivo valorizar esses profissionais tão importantes, o que parece, a princípio, ser legítimo. Mas uma questão precisa ser posta em mesa: tal ação não estaria colaborando para a naturalização das desigualdades sociais? Não me refiro apenas a presença dos garis, mas ao formato do programa Esquenta.
    Ao exaltar a vida cotidiana das pessoas em condições de exclusão social, não estaria
    levando-os a aceitar suas condições sociais de [quase sempre] subcidadania?
    Por um lado há claramente uma tentativa de reduzir o preconceito em relação as “comunidades” dos morros e de áreas mais carentes das cidades brasileiras, mas por outro, parece que há uma naturalização velada da pobreza. Ao mesmo tempo que busca reduzir a discriminação, pode estar criando um sentimento de satisfação e acomodação com a vida cotidiana – muitas vezes sofrida. O argumento de que é importante valorizar o ser humano independente de sua classe social, não [em minha percepção] se enquadra na presente questão. Valorizar o ser humano não é convidá-lo a ir no programa com seu uniforme de trabalho, como se esse indivíduo se reduzisse apenas a um único papel social, o de gari. Antes de ser gari, ele é pai, amigo, cidadão…
    O orgulho de ser um subcidadão pode ser perigoso a essas próprias pessoas, uma fez que podem ser acomodar com as suas situações sociais. Uma pergunta poderia aqui ser feita: mas qual o problema de eu ser gari? A resposta que eu daria seria a seguinte: o problema não está na profissão, mas nas condições salariais e de qualidade de trabalho, e gostaria que seus sonhos o lançasse mais ao horizonte promissor.
    Pense: Nossos sonhos são o impulso motivacional para maiores conquistas, além daquelas que estão próximas de nossos olhos. A naturalização pode significar o sepultamento ou o aborto desses sonhos.
    Nota: Esquenta! é um programa apresentado por Regina Casé e tem direção de núcleo de Guel Arraes, direção de Monica Almeida e criação de Hermano Vianna e Regina Casé.
  • Ei, psiu! Você que vai às ruas protestar e que cobra ações dos políticos, sabe o que é Accountability?

    Ei, psiu! Você que vai às ruas protestar e que cobra ações dos políticos, sabe o que é Accountability?

    Ei, psiu! Você que vai às ruas protestar e que cobra ações dos políticos, sabe o que é Accountability?

    Por Cristiano das Neves Bodart

    Democracia demanda liberdade de expressão/manifestação e condições para sua efetivação consciente. O conhecimento das regras do jogo é de suma importância para a efetivação de uma democracia sólida. Você, leitor, que vai às ruas protestar, sabe o que é Accountability? Tal conceito me parece chave para compreender a democracia e suas regras, assim como fundamental para a compreensão de nosso papel de cidadãos.

    O conceito accountability foi, inicialmente, problematizado sob à luz da realidade brasileira por Anna Maria Campos, quando em 1987, período de elaboração da Constituição Federal Brasileira, escreveu o artigo “Public service accountability: a comparative perspective”, publicado em 1988 e republicado em português em 1990.

    Campos (1990) descreveu sua dificuldade de traduzir a palavra accountability para o português quando a ouviu pela primeira vez em uma aula dos Estados Unidos, embora dominasse muito bem o inglês. Descreveu Campos que,    […] no primeiro dia de aula não consegui acompanhar a discussão sobre accountability, incapaz de traduzir a palavra para o português(1). O único indício que pude captar foi que, apesar do som, nada tinha a ver com contabilidade. Após as aulas corri aos dicionários, que não me ajudaram. Tampouco me ajudaram os índices dos livros de leitura obrigatória. No dia seguinte, o debate continuou e, apesar do meu esforço, não logrei captar o significado da palavra, mas consegui entender que se discutia um conceito-chave no estudo de administração e na prática de serviço público. De volta ao Brasil com a minha charada, perguntei a muitas pessoas que talvez pudessem traduzir a palavra. Aqueles que tinham participado de programas de doutorado, nos EUA, confessaram que não sabiam como traduzi-la. Tentei fora da área de administração pública, pessoas competentes em inglês, muitos perguntavam: “Accountab••• Quê?” Desisti da ideia de tradução e me concentrei no significado(CAMPOS, 1990, p. 2).

    Afirma Campos (1990, p.2) que a dificuldade de tradução da palavra para o português estava na falta de conhecimento do conceito, de sua prática, “razão pela qual não dispomos em nosso vocabulário”. A partir dessa constatação, Campos indagou qual seria a consequência dessa ausência para a realidade da Administração pública brasileira.

    Em 2009, Pinho e Sacramento buscaram (re)percorrer o caminho de Campos na busca, nos dicionários tradutores, do sentido da palavra accountability em Português. Concluíram que,

    […] adota-se o pressuposto de que não existe mesmo uma palavra única que o expresse em português.2 O que se percebe são “traduções” diferentes para o termo por par- te de vários autores, ainda que os termos produzidos possam estar próximos ou convergentes. Em síntese, não existe perfeita concordância nas traduções (PINHO; SACRAMENTO, 2009, p. 1346).

    Devido a dificuldade de encontrar uma tradução para a palavra, Campos (1990) buscou o sentido do conceito. Para ela, o tema accountability “devia estar relacionado com a questão dos direitos do cidadão”, tratando-se de um tema de cunho normativo, sobretudo ligados aos deveres do administração pública  e do governo para com os cidadãos.

    O conceito de accountability parece ser sinônimo de responsabilidade objetiva ou obrigação de responder por algo. Caracterizado por uma responsabilidade subjetiva “acarreta a responsabilidade de uma pessoa ou organização perante uma outra pessoa, fora de si mesma, por alguma coisa ou por algum tipo de desempenho” (MOSHER, 1968, apud CAMPOS, 1990, p. 2). Assim, a accountability deve ser exigida “de fora para dentro”, ou seja, cabe o administrador público ser cobrado, responsabilizado pelos seus atos perante os cidadãos. Caberia saber, destacou Campos,

    quem – fora do detentor da função pública – deveria ser reconhecido como capaz de compelir ao exercício da accountability; quem teria o poder de declarar alguém responsável: um cliente, um eleitor, um burocrata de nível mais elevado, um legislador, um tribunal? (CAMPOS, 1990, p. 4).

    Certamente não é apenas os cidadãos os responsáveis pela fiscalização da Administrador público. Existem outras pressões “de fora”. Desta forma, podemos afirmar que a accountability pode ser dividida em dois tipos, a Accountability vertical e a Accountability horizontal. Prefiro chamá-los, respectivamente, de accountability social e accountability institucional. Isso por ser mais didático sua compreensão.

    No primeiro tipo, a sociedade exerce o seu poder de pressão sobre os seus governantes, punindo-os ou agraciando-os por meio do voto e por meio de outros mecanismos. No accountability institucional é exercido pela ação mútua de fiscalização entre os poderes ou setores. Dentre os setores podemos citar as agências estatais de supervisionamento, avaliação e punição, se for o caso, dos agentes ou das instituições públicas.

    A questão que levantamos é se temos, tido no Brasil, accountability social e/ou institucional. Se olharmos ao redor, a resposta parece ser a velha expressão: “mais ou menos”. Por um lado, instituições que têm perdido crédito junto à sociedade. Por outro, a sociedade que se afasta a cada dia da vida pública e, consequentemente, das ações de pressão e fiscalização dos seus representantes. Em contrapartida, há grupos, sobretudo de jovens, se organizando para cobrar ações públicas mais eficientes e maior justiça social, assim como protestando contra a corrupção e exigindo mais transparência na coisa pública, assim como maior participação social. Nesse contexto a internet e a rua parece ser “o palco da vez” na busca de maior accountability na gestão pública.

    Carecemos de dar novos passos, sobretudo rumo ao aprofundamento da accountability social. Necessitamos com urgência criar mais conselhos de fiscalização e acompanhamento social da gestão pública. Práticas como o Orçamento Participativo e o “Site Transparência” são bons caminhos para a maior transparência da gestão pública, mas não podemos parar por ai. Em um contexto de crise das instituições, a população deve e pode ampliar a accountability social.

    Referências

    CAMPOS, Anna Maria. Accountability: quando poderemos traduzi-la para o Português. Revista de Administração Pública, 1990 (Fev./abr.).

    PINHO, José Antonio Gomes de; SACRAMENTO,  Ana Rita Silva. Accountability: já podemos traduzi-la para o português? Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, 43(6), 2009. (Nov./Dez.). Disponível em: < https://www.scielo.br/pdf/rap/v43n6/06.pdf> Acessado em 25 de Outubro de 2013.

  • Feliz dia dos professores; parabéns aos que lutam!

    Feliz dia dos professores; parabéns aos que lutam!

    Por Roniel Sampaio Silva

     

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    Pra mim hoje é uma data como qualquer outra, 15 de outubro de uma data comemorativa qualquer. Mais um dos tantos dias de trabalho, labuta e sobretudo de luta. Neste dia só faria sentido se fosse uma data que boa parte dos docentes encampassem uma luta por uma educação melhor e não para ser um mero
    desencargo de consciência no calendário.Apesar disso, agradeço imensamente meus alunos e amigos que me felicitaram nesta data pela consideração a minha pessoa nesta ocasião. Sou feliz com o trabalho que desenvolvo e é motivante saber que há pessoas de boa índole que o reconhecem.

    Todavia, dia do professor para mim é só mais uma data qualquer assim como dia do índio, dia da mulher e dia do trabalhador quando não se tem reflexão crítica. É possível que essas datas tenham sido criadas com a finalidade de criar um espaço temporal com reconhecimento simbólico que não ocorre minimamente no universo material. Na mesma medida, a fala do professor “heroi” e que “trabalha por amor” é um discurso sorrateiro para camuflar a ideia desprofissionalizante da categoria.

    Sempre fui muito defensivo quanto às datas comemorativas, sejam elas quais forem. Tenho a impressão de que muitas destas datas e feriados brasileiros servem, em certa medida,  tão somente para desviar o foco das pessoas em relação  às lutas uma vez que tais datas criam um discurso de memória do passado distante a fim de sublimar as lutas futuras.

    Por curiosidade, pesquisei quais países os quais comemoram o tal “Dia do professor”. A maioria deles – por coincidência – são Estados nações cujo nome não aparece na lista dos que mais valorizam os profissionais da educação. Isso é um caso a se pensar…

    Diariamente somos massacrados com trabalhos precarizados, desvalorização salarial, descaso e violências de todos os tipos. Ao contrário do que se pensa, o calendário está aí pra  marcar a ferro e fogo  desvalorização e não a desvalorização. Nos lugares em que se valorizam de fato a educação todo dia é dia do professor.

    Por fim, apesar de agradecer tais felicitações sinto que não sou digno delas uma vez que não estou na rua lutando por uma educação melhor como tantos outros professores. Façamos dessa data não uma memória distante do passado pseudoglorioso, mas uma brado de esperança de lutas futuras, do contrário ela ficará presa para sempre no calendário e no universo do “simbólico” e não passará de uma exclamação infeliz e vazia.

    Parabéns aos professores, sobretudo, os que lutam!

  • Por que postamos fotos de quando éramos criança em nosso perfil do Facebook?

    Por que postamos fotos de quando éramos criança em nosso perfil do Facebook?

    Foto de criança no perfil? 

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    Por que postamos fotos de quando éramos criança em nosso perfil do Facebook?

    Por Cristiano das Neves Bodart
     
     
    Acredito que todos os usuários de Facebook notaram a onda de uso de fotos de perfis de quando o dono da conta era ainda criança, ou fotos de quando ainda seu filho era pequeno. “Certamente cada pessoa tem sua motivação pessoal”, diriam muitas pessoas. Para a Sociologia os eventos que se repetem entre um número significativo de indivíduos merece uma atenção maior para serem compreendidos. A resposta de que “certamente cada pessoa tem sua motivação pessoal” não esclarece o fato, uma vez que não trata-se de uma mera coincidência de milhões de pessoas fazerem a mesma coisa; pelo contrário, à luz da Sociologia é possível buscar e, talvez, encontrar uma regularidade existente, assim como uma motivação para além da motivação pessoal. Tentarei levantar alguns caminhos para uma reflexão sociológica desse fenômeno.
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    Teriam os usuários do Facebook apenas despertado um interesse em homenagear as crianças? Acredito
    que não é apenas o princípio da homenagem o elemento motivador, haja vista que existe o dia do idoso e nem por isso há uma “onda” de postagem de fotos dos seus avós. Considero a hipótese de que a motivação está muito mais relacionada a si mesmo do que às outras crianças.
     .
    A ideia de criança, ao longo da História, foi-se construindo até chegar ao que entendemos hoje: período de inocência, de dependência, de despreocupação com compromissos e de pensamentos e atitudes sinceras. É, a meu ver, essa imagem de “criança” – em contraposição a ideia de “adulto” – que parece motivar o desejo de “vender uma imagem” à sua rede de relacionamento via Fecebook.
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    A “Consciência Coletiva” (conceito de Durkheim) é a impulsora de tal atitude. A ideia de que a criança é  inocente, dependente de atenção, despreocupada com as futilidades da vida e marcada por pensamentos e atitudes sinceras que parece motivar os indivíduos a buscarem emitir tais valores aos amigos. Ainda que não seja uma ação pensada racionalmente, busca-se transmitir ao outro que valoriza e/ou busca tais princípios infantis, ao mesmo tempo que emite a mensagem de que os “adultos” devem rever seus “passos”.
     .
    Outro elemento motivador é a necessidade de fugir dos excessos de responsabilidades, de se “esconder” dos males do mundo. Voltar a ser criança, ainda que no imaginário, seria voltar a viver “tempos que não voltam”, tempos onde a amizade era desinteressada, onde as coisas mais simples nos impressionavam, época em que o mundo nos deixava admirados… época que sem que percebêssemos filosofávamos sobre tudo e todos, isso independente de sua importância no mundo dos adultos.
    .
    Postar uma foto de quando éramos crianças é uma fuga, ainda que não eficaz, do mundo dos adultos e a tentativa de retornar no tempo em busca de princípios e perspectivas que parecem extintos no mundo dos adultos.
     
     
  • Jornais e palanques eleitorais. você consegue diferenciar?

    Jornais e palanques eleitorais. você consegue diferenciar?

    Por Cristiano Bodart

    Sabemos que todos os indivíduos e grupos têm suas opções e opiniões diante da realidade social. Igualmente temos ciência de que ninguém fala ou escreve de forma neutra, sem por à mesa suas considerações pessoais. O fato é que, a “imparcialidade” é um mito; porém a clareza da parcialidade deve ser posta à mesa, isso chama-se honestidade. Essa honestidade parece estar escassa entre os meios de comunicação. Conta-se nos dedos de uma das mãos os veículos jornalísticos importantes que abrem espaço para as multiplicidades de opiniões. Quero dizer com isso que, você, leitor, deve estar atento a “manipulações” ideológicas e partidaristas tão presentes nos jornais que circulam nossa região. Parecem, se não os são, verdadeiros palanques eleitorais.

    Essa semana, por exemplo, me deparei com um exemplo claro que mencionarei aqui por ocorrer em todos os cantos do país. O Caso embora particular, retrata a realidade da região de muitos leitores. O jornal “O Capixaba” [jornal impresso de circulação em duas cidades capixabas, Anchieta e Piúma] trazia em capa a manchete “100 dias de gestão”, afirmando que a equipe do jornal teria realizado um balanço da gestão de Marcus Assad, prefeito em Anchieta, e da gestão de Samuel Zuqui, prefeito de Piúma. No primeiro momento, achei bem válido e propício o tema. Mas isso só nos primeiros segundos que duraram a leitura da manchete. Ao continuar observando e lendo o jornal, notei posição partidarista política do editor.

    Ainda na capa, duas imagens. Uma representando Anchieta,ES e outra Piúma,ES. Na imagem representativa de Anchieta estava um urubu comendo lixo na rua. Na imagem que representava Piúma, a avenida beira mar cheia de gente próxima ao trio elétrico. O editor poderia facilmente ter invertido as legendas, haja visto que as praias de Anchieta igualmente estiveram repletas de turistas e as ruas de Piúma igualmente urubus mexendo no lixo. Desta forma, notei, logo na capa “de onde estava falando o editor”: da oposição à Marcus Assad e em defesa de Samuel Zuqui, prefeitos de Anchieta e de Piúma, respectivamente.

    Ao continuar lendo o referido jornal, logo no editorial, há uma reclamação de que o assessor de comunicação de Marcus Assad teria excluído seus jornais de uma reunião ou coletiva. O editorial clama por bom tratamento, mas não disfarça, em seu jornal “O Capixaba”, a oposição ferrenha ao prefeito de Anchieta, Marcus Assad.

    Fui à leitura do texto que supostamente estaria apresentando um balanço dos 100 dias de administração de Assad e de Zuqui. Na suposta avaliação da gestão de Marcus Assad, o jornal trouxe o título: “Marcha à ré em Anchieta: cem dias, sem nada (de bom)”. Sob esse título o que se lê é uma listagem dos supostos aspectos negativos e uma defesa do que chamou de “imaculada gestão passada”. O trecho onde afirma que “se as ações para se  manter no mínimo o ritmo de competência e avanços já conquistados, se novos projetos em favor da população forem criados estaremos aqui, nesse mesmo espaço, tecendo elogios […] (sic)” (O Capixaba, Abril, 2013, p. 3), deixa claro que a matéria tem por objetivo tecer críticas e não fazer uma avaliação da gestão, o que é uma pena não ocorrer.

    Virando a página, fui à leitura da suposta avaliação da gestão de Samuel Zuqui. O título da matéria era “Prefeito Samuel Zuqui faz balanço de 100 dias de mandato e anuncia aumento do ticket aos servidores”. Logo me veio a seguinte pergunta: a avaliação da gestão de Assad foi uma forte crítica, evidenciando apenas supostos pontos negativos identificados pelo jornal que ficou “zangado” por ter sido excluído de uma reunião e a avaliação da gestão de Samuel Zuqui foi feita por ele mesmo? Fico imaginando como se tem dois pesos e duas medidas quando interesses ocultos (pelo menos pra mim) estão envolvidos.

    Se o mesmo peso e a mesma medida fossem usados, a matéria seria bem diferente; a começar pelo preço do ticket que continua bem abaixo do valor pago pela prefeitura de Anchieta. Quanto à suposta valorização do servidor, o jornal poderia, por exemplo, ter mencionado que o referido prefeito processou a categoria dos professores por buscar diálogo e que andou não recebendo em seu gabinete os responsáveis legais pela categoria. Poderia ter feito menção de que a cidade anda às escuras por não ter empresa contratada para manutenção da iluminação pública, assim como tem deixado as ruas repletas de entulhos por não ter local onde depositá-los. Poderia citar que desrespeitosamente não cumpriu com sua palavra no que diz respeito a colocar nas secretarias equipes técnicas invés de cabos eleitorais e resultados de acordos políticos. Poderia ter feito menção ao fato dele não cumprir com o documento assinado em público em outubro de 2012, no qual se comprometia, se eleito fosse, colocar em prática o programa de combate a corrupção elaborado pela sociedade civil e assinada, em forma de abaixo-assinado, por centenas de pessoas. Várias coisas poderiam ser citadas, caso o peso e a medida fossem a mesma para ambos os prefeitos.

    Não é objetivo nesse texto avaliar ambas as gestões, apenas demonstrar, como a política partidária continua nos jornais que circulam em nossa região. Para perceber como alguns jornais se transformaram em palanques, basta ver que alguns outrora denunciavam os problemas da sociedade; mas hoje, abraçado financeiramente pelo poder público municipal, apenas tecem elogios descarados. Ao invés de informar, querem formar opiniões favoráveis aos seus interesses partidaristas.

    Leitor, esteja atento para identificar o que é jornal e o que é palanque eleitoreiro.

  • Accountability: em busca da limitação do poder dos nossos representantes políticos

    Accountability: em busca da limitação do poder dos nossos representantes políticos

    Accountability: controle social

    Para os que valorizam a “atividade de cidadão” sugerimos a leitura de um texto publicado originalmente no Portal 27.  Trata-se de um texto que evidencia a importância da Accountability, sobretudo a acoountability social.
     
     
    Por Cristiano Bodart

     

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    No sistema democrático, o voto não confere ao representante político um poder soberano. O voto é a ação de delegar a obrigação de exercer o poder em nome e benefício do povo (em latim, demo), recebendo em troca salário e status social.
    Dotado do poder atribuído, o representante político deve responder por seus atos, seja prestando conta, seja pagando por eles, quando realizados fora do plano inicial de representatividade coletiva e dos limites legais.
    Ao longo da História os teóricos da política discutiram diversas formas de limitar o poder, muitos dele apontando o modelo democrático como um frutífero caminho.
    No Brasil, a Democracia ainda é bastante jovem, se comparada com a democracia estadunidense e de outros países europeus. Com a crescente corrupção no seio de nossa Democracia, torna-se necessário aperfeiçoarmos as formas de limitação do poder de nossos representantes, assim como acompanhar suas ações. Nesse contexto a accountability torna-se cada vez mais necessária na gestão pública. Continue lendo o texto aqui
  • Sobre a noção de vocação, principalmente

    Sobre a noção de vocação, principalmente

    Por Camillo César Alvarenga*

     

     

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    A vocação se aproxima objetivamente da noção de profissão, principalmente quando esta vocação é a vida intelectual, no caso da vida acadêmica, quando educação é profissionalização para o mundo do trabalho. Logo ser cientista social é uma profissão em regime de contra- hegemonia e uma constituição de ser humano e social.

    Este texto existe pela simples necessidade de que a atividade intelectual, sistemática e metodologicamente preparada, seja capaz de libertar o estudante de Ciências Sociais de toda ideologia e alienação. E que os seus pressupostos, sejam eles ação e a teoria, e partam da premissa da práxis, como exercício reflexivo e crítico de transformação do real – “concreto pensado” – e da sua comunidade, para tencionar um enfrentamento de fluxos de forças no seio da sociedade em que está inserido. Indo além da compreensão das contradições que o regem, dos sentidos que agem sobre seu

    entendimento do mundo social, que a medida de uso e do valor de seu tempo, e que o trabalho intelectual e social por ele realizados, sejam operados para melhor interpretar e vivenciar sua utopia e se encontrar com sua distopia. Para que a emergência de um edifício de conhecimento combativo avance sobre a urgência de um mundo e uma vida social com suas necessidades e lutas cotidianas.

    Num cenário onde a academia é feita um panóptico, e entre outros, o estudante de Ciências Sociais continua ativamente a busca da organização de pensamentos para construir-estruturar suas relações humanas com os outros indivíduos, com seu grupo, com sua classe, enfim, toda a complexidade da civilização erguida ao seu redor. A determinação imperativa da “ciência” através da produção/reprodução do conhecimento desprezando, por vezes, os limites necessários da prática filosófica para (re)formular a experiência sobre bases próprias da realidade particular e socialmente compartilhada, leva-nos à necessidade de criticar a experiência empírica pelo prisma da cultura.

    A ironia, o cinismo, a indiferença, o preconceito revelam a face psicológica utilizada no “esporte de combate” que é a vida universitária. Em análise, na constituição de um universo cosmopolita e popular, o movimento real das “verdades” – das forças intelectuais libertárias versus forças racionalizadas e anti-intelectuais burocratizadas – deve se valer de uma solução social onde o cimento da vida contemporânea não se volte aos esquemas modernos e, sim, aproxime a força da ação social orientada e a finalidade que a vida do espírito crítico e militante objetiva no contexto tal – a invenção de um ser apto a lidar com a dimensão material e simbólica da cultura, com a natural ambiguidade da política, comprometido com a superação do evolucionismo da teoria racial, da superioridade de gênero, da luta de classe e suas contradições da desigualdade econômica e do mundo histórico do trabalho no espaço dialético do seu cotidiano.

    Enquanto vivemos a massificação do ensino superior, assistimos cada vez mais distanciados e alienados a fatalidade da condenação a uma educação em estado precário e rarefeito potencial de transformação das faculdades e capacidades humanas. Decorrência da complexa acumulação de funções entre gestão, administração e ensino, no caso dos professores em seus departamentos. Numa vida em que o sistema de contradições ossifica a vida cotidiana, busca-se mais que mais um termo diferente, mas sim, uma outra ideia de ser, que entre reacionários, utópicos, progressistas, anarquistas e outras falíveis concepções que se espalham e abarcam as desigualdades de forças materiais e intelectuais no jogo de privilégios e poderes, onde não há muitas escolhas.

    Estas considerações talvez descortinem questões nem sempre postas, enquanto flertamos entre a tragédia e a comédia, o drama indecente com uma realidade indiferente que é uma constante. Sem dúvida podemos imaginar que nossa mazela, com a exceção de alguns raros, é a satisfação de alguém que secretamente nos acomete suas mais pungentes ações enquanto os estudantes, cientistas sociais em formação, são sacrificados nas permutas entre as forças dirigentes em disputa por um projeto de feição difusa.

    *Graduando em Ciências Sociais/UFRB, e Pesquisador na Fundação Hansen Bahia.  Blog: https://scombros.blogspot.com.br/ Currículo Lattes: https://lattes.cnpq.br/3835461164143283

  • Mente ocupada para não servir de oficina do diabo: O objetivo “ralo” das escolas públicas.

    Mente ocupada para não servir de oficina do diabo: O objetivo “ralo” das escolas públicas.

    Mente Vazia Oficina do Diábo6

    Mente ocupada para não servir de oficina do diabo: O objetivo “ralo” das escolas públicas.

    Roniel Sampaio Silva
    É comum escutar um ditado que difundiu-se na cultura popular: “mente vazia, oficina do diabo”. Pretendo fazer uma breve reflexão acerca desta expressão de modo a relacioná-la com a condição do ofício docente. Vamos pensar para além da repetição deste ditado e tentar aprofundar sobre alguns
    possíveis sentidos que alimentam nossa direcionamento docente hoje?
    Tal expressão reverbera tanto em Portugal como no Brasil e tem sua origem pouco esclarecida, mas pela composição do ditado podemos especular que tenha uma relação com a questão religiosa e a concepção cristã de trabalho.
    O ditado é bem positivo e válido dependendo da forma e do objetivo que se ocupe a mente. Por essa razão, e outras razões, o percurso da humanidade fez com que surgisse a tendência de se criar um profissional que ocupasse a mente dos jovens para afastá-los dosfins diabólicos: o professor. O professor professa o sujeito sem luz (a-luno), afastando-o do caminho das trevas.
    Na nossa tradição de herança lusitana, o professor tem como precursor o jesuíta que fora utilizado para catequizar e “ocupar a mente” dos índios, negros e demais pessoas, cujo o imaginário estava carregado da ideia de que esses precisavam ser inseridas nos paradigmas da sociedade da época. Na concepção de Antônio Nóvoa, este legado faz com que a profissão docente seja vista como um ofício sacerdotal, ou seja, o professor deve trabalhar por amor e não pelo seu retorno financeiro.
    A palavra ócio tem origem etinológica relacionada à calma, sossego, tranquilidade serenidade e folga. Com o advento da secularização e do embrionamento da capitalismo a visão religiosa passou a combater efusivamente o ócio e associá-lo à “vagabundagem” e a delinquência. Fazer comércio era negar o ócio, virando negócio daí a origem da palavra. No mundo em que exigia-se uma ocupação cada vez maior, não se tinha tempo para família e filhos, era necessário um profissional que ocupasse a mente dos jovens desistidos de suas famílias e, como ainda não tinham ou não conseguiam se inserir nos “negócios”, eram mal vistos pela sociedade, e de certa forma negados por ela.
    Na antiguidade grega clássica, fora criado a scholé, que significa lugar de ócio. Recinto para o qual eram enviadas as pessoas cujo tempo livre era destinado para reflexão. Era um espaço terno, calmo, positivo e de reflexão com um número bem restrito de participantes . Para um grupo seleto da população, o ócio era considerado algo extremamente na referida antiguidade clássica. No entanto, a partir da constituição de uma ética protestante orientada ao trabalho, o ócio das pessoas cujas condições sociais eram mais favoráveis, adquire e se reafirma como algo negativo, como é entendido até hoje.O fato dos profissionais da educação pública não terem adequada valorização profissional e ter condições precárias de trabalho para atuar com a qualidade exigida pela sociedade moderna, nos levam a crer que tais profissionais foram socialmente construídos tão somente para ocupar a mentem dos jovens, ainda que para adiar um problema para um governo futuro. Ao invés de uma formação sólida, marcada por uma grande riqueza cultural, aos alunos de escolas públicas resta apenas a mente ocupada. A ocupação não necessariamente com “coisas” que o tornará um cidadão pleno, crítico e criativo. Assim, com poucas condições dos professores para estimular o desenvolvimento de uma mente crítica, engajada, criativa e preparada nos educandos, resta apenas ocupar a mente destes, para que, pelo menos, não tenham a sua mente ocupada e não seja encaminhado para o próprio “diabo”, para que este se encarregue da mente e continue o serviço o qual não houve condições de ser finalizado adequadamente. Mente ocupada para não servir ao diabo, eis o objetivo “ralo” das escolas públicas e agora falta apenas descobrir quem são exatamente os tantos diabos.
  • Em defesa das regras do jogo: punir, não punir e como punir alunos rebeldes.

    Em defesa das regras do jogo: punir, não punir e como punir alunos rebeldes.

    Por Cristiano Bodart
    Em uma escola do interior do sul do estado do Espírito Santo a professora puniu um aluno por não levar o livro didático para a aula. Punição: repetir 100 vezes a mesma frase, de que ela não pode esquecer de levar o livro para escola” (Reportagem do Jornal Local).

     

    1239685 10151808548689429 2118699592 nAplicar sanções aos alunos que não cumprem as normas básicas da escola é fundamental para não se estabelecer um estado de anomia, situação marcada pela sensação de que não existem normas de convivência social e que tudo pode ser praticado. Por outro lado, normas ou punições injustas e desproporcionais podem tem um impacto contrário sobre a convivência social, além de ferir a integridade moral ou física do aluno.

    As normas existem para proporcionar condições mínimas de funcionamento da interação social. Mas existem dois problemas muito comuns ligados as normas: 1. Não serem criadas de forma participativa, sendo impostas de cima para baixo; 2. Não existir, junto a norma, uma sanção clara e aplicável à todos, o que também deve ser definido de forma participativa junto à comunidade (nunca no improviso). Antes de aplicar alguma sanção ao educando é importante que o corpo técnico-pedagógico da escola observe esses dois pontos.Normas construídas de forma participativa são mais observadas pelos envolvidos, assim como as punições estabelecidas serão mais facilmente aceitas por todos, além da legitimidade social que o corpo técnico-pedagógico terá.

    No caso da criança que teria sido obrigada a reproduzir frases em escola da região, fica bem claro as condições das normas escolares: improviso, impopularidade, desproporcionalidade. Ainda que tal punição tivesse resultados educativos, do ponto de vista moral e ético, me parece ser inaceitável. Escrever frases de forma repetitiva me parece desproporcional ao erro de deixar de fazer a atividade, além de ser pouco educativa. Repetir ações dão resultados, mas não sem objetivos e metas, como no caso de punições aos alunos. Pelo contrário, isso pode leva-lo a detestar os estudos.

    A escola, enquanto instituição, vive um momento de crise, fruto do princípio de anomia que se estabelece já no lar dos educandos. Estes acostumados a não obedecer as normas acabam fazendo o mesmo no espaço escolar. A escola, por sua vez, marcada por resquícios da ditadura militar, impõe normas e punições sem participação social, e marcadas por improvisos, onde as penas não são claras e universais, além de desproporcionais às faltas. Consequentemente, acorrem essas aberrações que vemos por ai…