Redes sociais como tribunal: A Alta Idade da Mediocridade e a cruzada contra a racionalidade II: As redes sociais como tribunal da mediocridade”

redes sociais como tribunal

Redes sociais como tribunal são instrumento de juilgamento para que que os julgadores se sintam melhores, em superioridade.  Cabe ao júri um ritual de sacrifício em favor do Deus mercado.

Por Roniel Sampaio-Silva

Redes sociais como tribunal em favor do Deus mercado
No período das últimas cruzadas, a Europa passou por várias transformações sociais e econômicas, as quais intensificaram o circuito comercial, dando origem ao Mercantilismo e as Grandes Navegações. Com isso, houve uma grande fermentação cultural, política e econômica. Esse período ficou conhecido com humanismo. Paralelo a isso, a Igreja Católica começou a combater alguns dos efeitos dessas transformações sociais. O fluxo comercial, o diálogo com outros povos e a necessidade do desenvolvimento científico e tecnológico favoreciam ao desenvolvimento de um espírito crítico que ameaçavam a hegemonia política e cultural da instituição. O resultado foi imediato, a instauração do Tribunal do Santo Ofício, conhecido como Inquisição.

Milhares de anos depois, as redessociais online tornaram-se um espaço de encontro de diferentes ideias,ideologias, crenças e valores e passaram a ser um espaço de circulação deideias e crenças as quais colocaram em um mesmo espaço pessoas ricas e pobres,acadêmicos e pouco letrados etc. As velhas hegemonias da “nova Igreja”, “Agrande mídia”, tornaram-se questionáveis, a audiência e os lucros diminuíram eos discursos tornaram-se mais plurais. Como resultado tem havido uma novainquisição cultural, pautada no conspiracionismo e maximização do sentimento demedo, terror com uma pitada de pseudo-nacionalismo.

A nova “Santa Instituição” passa a ser a Grande Mídia, a qual tem amplos poderes no nosso tempo, se dizendofalar em nome do “Povo” e alertando para as heresias contra o seu Deus: O Capital. A doutrina precisa ser preservada, para isso é convocado sacerdotes,guardião das tradições.  As escriturassagradas passam a ser Von Mises, Constantino, Reinaldo Azevedo e Olavo de Carvalho. Milhares de seguidores são recrutados pela televisão e pelos jornaisque direcionam os seus telespectadores a buscarem os sites dos profetas. Essassão as novas rotas das cruzadas.

Onde o exército sagrado e os “infiés” se encontram? Nas redes sociais online; onde o confronto se acirra. Os “infiés” que usam referências empíricas e leituras acadêmicas e contra esses os inquisidores repetem jargões e liberam a sua moral mais irracional para combater o “mal”.
Vale lembrar que grande parte das multidões que perseguiam os acusados de “bruxaria” eram iletrados ou pouco letrados no período da Inquisição. O letramento na época não era enojado, a Reforma Protestante que tentou fomentar o letramento para que os próprios fiés pudessem ler e interpretar as escrituras foram chamados de “hereges”. Na nossa “Nova Inquisição” não é muito diferente. Enquanto o julgamento e sentença cabia a instituição
Religiosa, hoje os soldados da inquisição são a população medíocre e quem julga é a Grande Mídia. Tudo com as bênçãos do “Deus Mercado”.
Aos que escapavam da morte na inquisição, poderiam ser excomungados. Hoje o “Deus Mercado” excomunga quem não paga em dia suas dívidas onerosas através dos serviços de proteção ao crédito. Agora, cabe aos “cidadãos de bem”, especialmente rotulados como classe média, reforçar o poder ideológico dominante para usar a tribuna (redes sociais online) a fim de defender as novas instituições hegemônicas… Cuidado ao divergir deles, você corre o risco de ser excomungado, ou ser bloqueado nas redes sociais de seu círculo de amizade. Ou ainda, sua crítica pode ser exporta ao ridículo baseado na mediocridade geral.

Cristiano Bodart

Doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP), professor do Centro de Educação e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal de Alagoas (Ufal). Pesquisador do tema "ensino de Sociologia". Autor de livros e artigos científicos.

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