A profissão do[c]ente
Por Cristiano das Neves Bodart
O editorial do jornal O Globo, do dia 10 de setembro, deu ênfase ao “colapso” educacional que surge no horizonte brasileiro. No entanto a decadência da qualidade da educação é destacado apenas como sintoma da “bomba-relógio” que está armada, quanto na verdade é sintoma e causa.
O interesse pela docência não vai existir sem uma escola e uma educação de qualidade. E sem bons docentes essa qualidade não virá. O editorial destaca a baixa remuneração como sendo um dos principais problemas. Nesse ponto, estou de acordo. No entanto, a solução é apresentada de forma um tanto equivocada, na qual, no frigir dos ovos, o professor se tornará o culpado por suas condições precárias de trabalho. É como se o paciente fosse responsável pela sua má sorte.
Assim destacou o editorial:
“Baixa remuneração e falta de condições de trabalho estão entre as principais causas do desinteresse pelo magistério. O problema é que tais demandas costumam ser discutidas quase exclusivamente no âmbito dos interesses corporativos — principalmente a questão salarial.Governos negligenciam, e sindicatos de profissionais de ensino torpedeiam, por exemplo, quaisquer iniciativas que visem a implantar no sistema a remuneração por mérito, criterioso fator de melhorias dos vencimentos; programas de avaliação de desempenho também são tabu”.
O editorial do O Globo erra ao afirmar que um dos problemas são “os sindicatos de profissionais de ensino torpedeiam” […] “quaisquer iniciativas que visem a implantar no sistema a remuneração por mérito, criterioso fator de melhorias dos vencimentos”, assim como os programas de avaliação de desempenho. Erra porque por trás da proposta de remunerar por mérito há uma pretensão clara de pagar bons salários há alguns poucos, podendo assim o político afirmar que “paga bem” o trabalho docente e que os que assim não são tratados, não o são por sua própria culpa, pelo seu baixo desempenho. É a mesma lógica das provas de seleção para ingressar no Ensino Superior: frente a incapacidade do Estado em ofertar vagas à todos, cria-se avaliações e transfere-se aos jovens a responsabilidade de serem excluídos. Outro problema está em “criar docentes aprovadores” de alunos, uma vez que se o índice de aprovação for elevado, logo será tido como um bom professor e, com isso, terá maiores rendimentos salariais.
O editorial vêm engrossar a fila dos que desejam lançar sobre às costas dos docentes a responsabilidade exclusiva da falência do sistema de ensino, como se este fosse composto por apenas docentes e discentes.
O problema é mais complexo e a solução não está apenas em um ponto ou em uma pílula. O risco de faltar professores é grande! Esse alarde é necessário e a resolutividade é urgente. No entanto, a solução apresentada pelo editorial remonta à lógica das linhas de produção fordistas do século passado: recompensar o trabalhador de forma individualizada, com base em sua produtividade. Ignoram que o processo de ensino-aprendizagem é bem mais complexo do que um automóvel e que o tempo para produzir o conhecimento não depende apenas do “produtor”. É consenso que Ford errou ao acreditar que a motivação dependia apenas de recompensa salarial. Ignorou que existem outros fatores, tais como, o prazer pela atividade realizada, a auto-realização, o reconhecimento social, a qualidade do ambiente organizacional, entre outros. O erro se repete.
A falta de atração da carreira de magistério é reflexo de diversos fatores que se avolumam no ambiente organizacional e na sociedade. Nota-se, entre esses fatores, a crescente insegurança do professor na escola, o desrespeito ao educador por parte dos alunos, desvalorização social da figura do professor, as péssimas condições do trabalho docente e do ambiente educacional, a necessidade de ter uma carga horário extensa para conseguir a subsistência, o desinteresse dos alunos [e da sociedade em geral] pelo conhecimento escolar-científico, a crescente libertinagem dos estudantes, a incompatibilidade entre formação/estudos e o salário, o número de alunos por turma, o grande volume de trabalho fora do horário de trabalho, conflitos em sala entre alunos-aluno e professor-aluno, escassez de material didático, falta de apoio para formação continuada, etc.
A bomba-relógio está armada, mas não será desarmada por meio de soluções arcaicas e pontuais. É necessário com urgência uma maior atenção à essa profissão do[c]ente. O primeiro passo é compreender que o remédio certo não é apenas uma pílula, muito menos “do dia seguinte”.
Como citar esse texto:
BODART, Cristiano das Neves. A profissão do[c]ente. Blog Café com Sociologia. 2015. Disponível em: https://cafecomsociologia.com/2015/09/a-profissao-docente.html. Acesso em: dia, mês e ano.
São tantas e complexas questões que, é difícil dizer q passa exclusivamente por está ou aquela, ou, quais protagonistas de fato tem culpa. A vontade política (ou a falta de) em fazer, acredito que seja um dos principais fatores de motivação para o concretizar das ideias e intenções.
Os salários são baixos sim. Mas, como diz o texto, não acredito que seja o ponto principal. A falta de respeito para com o professor, o desinteresse dos alunos, a falta de estrutura familiar, a falta de estrutura das escolas… são tantas as questões que o salário se soma a tudo isso. Ate porque, tenho em minha opinião que a pessoa que escolhe ser educador, não faz deslumbrando riquezas (obvio que se deve ter uma qualidade de vida), mas por paixão, e quando a paixão não é correspondida, vem o término.
A educação deve ser repensada desde sua fundição. Da forma como a vemos hoje (me limito a falar da educação pública), realmente não haverá sustentação que permita continuar.
Cristiano Bodart faz uma análise sucinta mas revela conhecimento apurado sobre as questões da profissão docente no brasil.O texto é revelador e sensível.
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