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Diferença entre nacionalismo e patriotismo

diferença entre nacionalismo e patriotismo

Diferença entre nacionalismo e patriotismo têm relação direta com os conceitos de estado, nação e pátria. Neste texto, iremos discorrer sobre as contribuições teóricas de tais conceitos para entender a diferença entre nacionalismo e patriotismo.

 

Por Matheus Rodrigues dos Santos

 

Destarte, penso ser relevante o esforço para a tentativa de definição, comparação e discussão entre os conceitos de Estado e nação, para que possamos melhor delinear, em seguida, os conceitos de nacionalismo e patriotismo. Para tanto, recuperaremos algumas definições já desenvolvidas sobre o tema. Se trata de uma revisão inicial e não exaustiva com vistas a balizar as primeiras reflexões acerca desses quatro objetos teórico-conceituais que são, em maior ou menor medida, centrais para a realização do presente estudo.

Diferença entre nacionalismo e patriotismo: Estado

Em sua definição clássica e amplamente aceita no ambiente acadêmico, Max Weber sugere que o Estado é uma comunidade humana que possui o monopólio do uso legítimo da força física dentro de determinado território: “O Estado é aquela comunidade humana que, dentro de determinado território – este, o ‘território’, faz parte de suas características – reclama para si (com êxito) o monopólio da coação física legítima” (WEBER, 1982, p. 98).

É possível afirmar, portanto, tratar-se de um conceito político bem delimitado e estritamente racionalizado, ou seja, sem denotações subjetivas ou afetivas, além de gozar de relativa consensualidade teórica e empírica. Refere-se ao conjunto de instituições que administram um território soberano que, por sua vez, normalmente coincide com um país – ainda que essa equivalência nem sempre seja verdadeira. Os Estados (também denominados por Estado-nação, ou Estados nacionais10) são, em última instância, as unidades políticas que dividem e organizam o ordenamento internacional contemporâneo.

Diferença entre nacionalismo e patriotismo: nação

Por sua vez, a nação

Não é apenas uma entidade política, mas algo que produz sentidos – um sistema de representação cultural. As pessoas não são apenas cidadãos/ãs legais de uma nação; elas participam da ideia da nação tal como representada em sua cultura nacional. Uma nação é uma comunidade simbólica (HALL, 2006, p. 49, grifo do autor).

Assim como na definição de Hall (2006), Anderson também atribui elementos simbólicos na constituição da nação: se trata de “uma comunidade política imaginada – e imaginada como sendo intrinsecamente limitada e, ao mesmo tempo, soberana” (2008, p. 32). Imaginada pois, apesar de sua vivência em comunhão, os membros de uma nação jamais conhecerão a todos os outros; limitada porque possui fronteiras finitas, para além das quais existem outras nações; soberana porque surge no momento em que o iluminismo suplantava a legitimidade das sociedades feudais de ordem divina; e, por fim, comunidade porque é concebida por internas camaradagens horizontais, independentemente da desigualdade social existente (ANDERSON, 2008).

Preocupado em estabelecer parâmetros que, uma vez atingidos, poderiam credenciar determinadas sociedades ao posto de “nação”, Mauss (2017, p. 70) propõe que a nação é uma “sociedade material e moralmente integrada, com poder central estável, permanente, fronteiras definidas, relativa unidade moral, mental e cultural dos habitantes, os quais aderem conscientemente ao Estado e às suas leis”. A visão do autor sobre a nação como uma sociedade integrada culturalmente é complementada pelo sentimento de legitimidade11 que os Estados devem possuir perante seus cidadãos. Na compreensão maussiana, a nação se cristaliza a partir de seu enraizamento subjetivo nos habitantes daquela comunidade, bem como em sua identificação com as instituições políticas que o constituem (FOURNIER; TERRIER, 2017).

Nas três definições da ideia de nação mobilizadas acima, é possível observar a presença de elementos que reforçam o caráter cultural dessa entidade que se pretende definir. Diferentemente da proposição de Estado, a nação relaciona-se com aspectos simbólicos de pertencimento, memória, afetividade, solidariedade e identidade coletiva. Por isso, a nação extrapola os atributos físicos, institucionais e burocráticos, característicos do Estado weberiano, para dialogar com outras esferas de subjetividade presentes no corpo demográfico que compõe a sociedade de determinado Estado.

Assim, ela lança as bases da profundidade e legitimidade emocional necessárias para a incorporação da condição nacional presente na consciência coletiva e individual dos grupos sociais nacionais e na reprodução da vida política e social de nossa contemporaneidade. A simples existência das nações faz com que seja difícil concebermos o “‘fim da era do nacionalismo’, que por tanto tempo foi profetizado. Na verdade, a condição nacional [nation-ness] é o valor de maior legitimidade universal na vida política dos nossos tempos” (ANDERSON, 2008, p. 28).

Diferença entre nacionalismo e patriotismo: nação e nacionalismo

As nuances e relações de estabelecimento entre nações e nacionalismo também são frequentemente debatidas e questionadas por diversos autores, em diversas épocas e através de distintas lentes analíticas. Gellner demonstra uma interpretação instrumentalista do nacionalismo ao afirmar que são os movimentos nacionalistas que criam e desenham as nações: “nacionalismo não é o despertar da nação: ele inventa nações onde não existem – mas precisa de elementos de diferenciação preexistentes para trabalhar, mesmo que […] sejam puramente negativas” (1964, p. 168, tradução do autor12). Gellner pressupõe, portanto, que para ser uma ideologia efetiva, o nacionalismo necessita da existência de elementos que permitam o contraste entre o nacional e o que seria o “não-nacional”.

Anderson (2008) não demonstra concordância com a leitura de que o nacionalismo agiria de forma a inventar a nação onde ela não existiria. Para ele, Gellner estaria implicitamente sugerindo que o nacionalismo mascara a existência de comunidades “não-verdadeiras” (os Estados nacionais em processo de formação), produzidas para consolidar o poder às novas elites políticas dos Estados. Anderson, inclusive, discorda da categorização “falsidade/autenticidade” para se referir a comunidades, pois, em último caso, esse raciocínio poderia levar a uma hierarquização entre os tipos de comunidades. Todas as comunidades, segundo o autor, hão de ser imaginadas, visto que é virtualmente impossível conhecer todos os membros pertencentes a tal grupo, tornando necessário o exercício de imaginá-lo para além do que se pode ver em seu cotidiano. Nesse sentido, o que diferencia uma comunidade nacional de outra, é apenas a forma como se a imagina (ANDERSON, 2008).

Retomando o raciocínio de Gellner (1964) a respeito do contraste estabelecido entre o que seria nacional e todo o resto, ou seja, o “não-nacional”, é possível dizer que o nacionalismo norteia o sentido cultural, subjetivo e afetivo da comunidade nacional, mesmo que pela construção de antagonismos. Mais que nortear os sentidos subjetivos da comunidade nacional, o nacionalismo ajuda a consolidá-la através da difusão de uma cultura: “ele almeja fornecer um critério para a determinação da unidade de população adequada para ter um governo exclusivamente próprio, para o legítimo exercício do poder no Estado e para a correta organização de uma sociedade de Estados” (KEDOURIE, 1960, p. 09, tradução do autor13).

Calhoun (2008) desenvolve seu pensamento tentando se afastar das noções reificadas da ideia de nação e nacionalismo, aplicando ênfase à importância do nacionalismo enquanto ferramenta de formação discursiva que modela o mundo moderno: “É um modo de falar, escrever e pensar sobre as unidades básicas da cultura, política e noção de seu lugar no mundo, que ajuda a constituir nações como dimensões reais e poderosas da vida social. As nações não existem ‘objetivamente’ antes de existirem em termos discursivos” (CALHOUN, 2008, p. 37). Segundo Calhoun (2008), sua unção mais básica é a de categorizar e agrupar populações humanas em dois sentidos: tanto oferecendo e induzindo a uma determinada interpretação coletiva da realidade, como um meio de constituir a identidade do grupo de dentro para fora. “O nacionalismo consiste, então, no uso da categoria ‘nação’ para organizar percepções de identidades humanas básicas, agrupando pessoas com outras da mesma nacionalidade, e as distinguindo de membros de outras nações (Idem, p. 53).

Para Calhoun (1997), a presença de certo grau de solidariedade social e algum nível de integração são elementos necessários para se pensar em agrupamentos, comunidades de diversas ordens, como em famílias ou na relação entre membros de um exército, por exemplo. No entanto, não são suficientes para definir ou se pensar em nação – são apenas critérios mínimos. Nesse caso, faz-se necessário um discurso que molde a consciência popular em termos nacionais, e esse é o papel que o autor atribui ao nacionalismo enquanto formação discursiva: uma maneira de

[…] pensar sobre solidariedade social, identidade coletiva e outras questões correlacionadas (como legitimidade política) [que] desempenha um papel crucial tanto na produção de uma autocompreensão nacionalista quanto no reconhecimento de reivindicações nacionalistas de terceiros (CALHOUN, 1997, p. 04, tradução do autor14).

Para auxiliar na compreensão do que significa o nacionalismo, Smith (1991) se propõe a dividir o termo para definir e analisá-lo separadamente a partir de duas categorias: o conceito/termo, de um lado, e a ideologia, de outro. Desse modo, o uso do termo nacionalismo estaria atrelado: 1) ao processo de formação e manutenção dos Estados-nação; 2) à consciência de pertencimento à nação, junto a sentimentos e aspirações por sua segurança e prosperidade; 3) à linguagem e simbolismo da nação; 4) a uma doutrina cultural das nações; 5) a um movimento político e social para atingir objetivos da nação e realizar a vontade nacional (SMITH, 1991). A ideologia nacionalista, ou o nacionalismo enquanto ideologia, por sua vez, possui como proposições centrais:

1. O mundo está dividido em nações, cada uma com sua individualidade, história e destino; 2. A nação é a fonte de todo poder político e social, e a lealdade à nação sobrepõe-se a todas as outras lealdades; 3. Os seres humanos devem se identificar com uma nação se quiserem ser livres e se realizar; 4. As nações devem ser livres e seguras para que a paz e a justiça prevaleçam no mundo (SMITH, 1991, p. 74, tradução do autor15).

Para Maia (2019), o conceito nacionalismo é, assim como a noções de “democracia”, “justiça” e “populismo”, um conceito essencialmente contestado16, ou seja, um conceito-chave sobre o qual não existe um consenso absoluto; mas, ao contrário, costuma abarcar uma série de significados. A autora reconhece que essa polissemia inerente à ideia de “nacionalismo” é um desafio a mais para aqueles que buscam analisá-la com precisão. Contudo, nos oferece uma possível leitura acerca do objeto de estudo: o nacionalismo se trata de uma “ideologia que prescreve a necessária coincidência entre as unidades políticas e as unidades nacionais, ou seja, que cada Nação deve ter o seu próprio Estado” (MAIA, 2019, p. 223). Nessa visão, três seriam os objetivos fundamentais do nacionalismo: 1) garantir unidade, 2) identidade e 3) autonomia à nação; sendo que a soberania popular (a nação como a única fonte legítima de poder político) e a autodeterminação (a nação deve se governar de maneira livre de interferências externas) se configurariam como sendo seus valores centrais (Idem).

A partir das definições trazidas acima, tomemos como central para o presente estudo, a ideia de que o nacionalismo pode ser considerado uma ideologia incontestavelmente consolidada, presente em todas as regiões do planeta, que age de modo a garantir a defesa da unidade, identidade e soberania das nações enquanto fonte maior de legitimidade não somente política mas também como fonte de legitimidade emocional e subjetiva perante seus cidadãos. Além de possibilitar a manutenção e reprodução do sistema de Estados nacionais, o nacionalismo, como uma formação discursiva, age como um marcador identitário social com potencial de categorização e mobilização popular a partir de critérios internos de unificação e critérios externos de diferenciação.

Diferença entre nacionalismo e patriotismo

Por fim, outro termo que aparece de forma recorrente em pesquisas sobre nação e nacionalismo, é “patriotismo”. Na tentativa de estabelecer as fronteiras conceituais entre os dois -ismos, alguns pesquisadores dos campos da Sociologia, História e Psicologia Social, pretenderam contrapor o patriotismo e o nacionalismo de modo que o primeiro carregasse consigo um valor positivo e necessário às sociedades republicanas, presente sobretudo nos países do Ocidente. Já o nacionalismo estaria atrelado a movimentos exclusivistas, chauvinistas e irracionais, sendo, por conseguinte, retratado de maneira negativa, numa visão normativa, em que se pretende combate-lo (CALHOUN, 1997). Ainda nessa tentativa de distanciamento entre os conceitos, alguns autores apostam na existência de uma distinção psicológica entre ambos, mas não em termos de intensidade, e, sim, em direcionamento (BILLIG, 1995).

Essa interpretação pode ser encontrada em um escrito de Dietz (1989), no qual a autora afirma que, ainda no século XIX, o conceito de patriotismo significava uma posição muito mais internacionalista do que estadista ou governamental; relacionavase ao combate à tirania e opressão, e a figura do patriota representava a defesa por igualdade política e justiça social. No entanto, avança a autora, ao final do século XIX, a retórica do patriotismo foi gradualmente assimilada pelo emergente vocabulário de “Estado” e “nação” e sua simbologia. Dessa forma, “sua ideia central foi transferida para as doutrinas nacionais, partidárias e raciais da Era Moderna, perdendo caráter agudamente crítico […] se tornando, assim, a base para o apoio acrítico do [pensamento] ‘meu país, certo ou errado’” (DIETZ, 1989, p. 189, tradução do autor17)

Dietz (1989) sustenta que a despeito de ser um conceito mais antigo, recorrente em diversas épocas históricas e empregado em diferentes contextos políticos, a terminologia “patriotismo”, ao final do século XIX, foi deixando de ser entendida como um senso de dever ao Estado, para ser aplicado como sinônimo de apoio incondicional a governos e programas políticos e de veneração da nação como valor incontestável da modernidade; sendo, assim, utilizada como uma espécie de retórica do Estado. Como resultado, a ideia de patriotismo se distanciou de sua conotação de defesa radical da liberdade e dos direitos constitucionais, presentes ainda no século XVIII (Idem).

Perseguindo o mesmo posicionamento teórico, Bar-Tal contrapõe explicitamente as duas terminologias. O autor começa propondo que o patriotismo não apenas se trata de um fenômeno sociológico, histórico e político, mas também psicológico, e pode ser definido como “uma ligação entre membros de um grupo entre si e em relação ao país em que residem” (1993, p. 48, tradução do autor18). Mais que uma ligação coletiva e em relação ao seu país, o patriotismo é concebido como uma das bases mais importantes na vida de uma sociedade ou uma nação; dessa forma, é um valor desejável, admirável e positivo. Por sê-lo, os sistemas educacionais de cada país buscam, de forma explícita, incutir os valores do patriotismo nas gerações jovens, enfatizando sua importância vital para a reprodução daquela sociedade (BARTAL, 1993). O nacionalismo, por sua vez, estaria, ao lado do chauvinismo, relacionado não somente à defesa do Estado-nação como unidade política soberana e organizadora da vida social, mas à hostilidade e violência a grupos estrangeiros (BARTAL, 1993 apud BILLIG, 1995)

Diferença entre nacionalismo e patriotismo: visão de Connor

Para Connor (1993), “patriotismo” e “nacionalismo” são conceitos estritamente distintos, ainda que nem sempre antagônicos. Patriotismo, segundo o autor, está relacionado à ligação emocional de um cidadão a seu Estado, país, e instituições políticas. Nacionalismo, por sua vez, refere-se à ligação emocional de alguém a seu grupo étnico-nacional. Para conceber e fundamentar tal diferenciação, o pressuposto básico de Connor é o de que nem todo Estado (país) constitui um Estado-nação, ou seja, aqueles “Estados nos quais as fronteiras de um grupo étnico-nacional coincidem precisamente com suas fronteiras políticas” (CONNOR, 1993, p. 374, tradução do autor19). Nos poucos países considerados por Connor como Estados-nação20 – e o autor cita como exemplos, entre outros, Japão e Portugal –, a diferenciação entre “patriotismo” e “nacionalismo” deixa de ser essencial, visto que “a lealdade ao grupo nacional (nacionalismo) e a lealdade ao Estado (patriotismo) fundem-se e se reforçam em um único sentido na percepção da população” (Idem, p. 374, tradução do autor21).

Viroli (1997) entende que a linguagem e a simbologia do patriotismo é, historicamente, empregada para reforçar os ideais de amor às instituições políticas e os ideais de liberdade coletiva, republicanos em natureza. Desse modo, a tirania, o despotismo, a opressão e a corrupção seriam os valores antagônicos ao patriotismo republicano. A linguagem de nacionalismo, por sua vez, teria surgido na Europa no final do Século XVIII para o propósito de reforçar a unidade e a homogeneidade cultural, linguística, étnica de um povo. Seriam “adversários” do nacionalismo, portanto, “a contaminação e a heterogeneidade cultural, impureza racial e a desunião social, política e intelectual” (VIROLI, 1997, p. 01-02, tradução do autor22).

Isso não significa dizer que o patriotismo negligencia, de alguma forma, as esferas cultural, étnica e linguística, uma vez que mesmo a república sempre foi expressa na literatura como uma forma de garantia de liberdade coletiva a uma particular população, com sua própria história e traços culturais (VIROLI, 1997). Portanto, não se trataria de uma definição absoluta ou exclusivista23 . Nesse sentido, Viroli (Idem) propõe que a principal distinção entre os conceitos de “patriotismo” e “nacionalismo” seria a ênfase em que cada ideia repousa. Para patriotas, o principal valor e objetivo político é a república, bem como a liberdade que ela pressupõe aos seus cidadãos; já os nacionalistas teriam como principal valor a ser defendido, a unidade cultural e espiritual da nação

 

Podemos recorrer a um trecho de George Orwell (1945), no qual o autor reforça explicitamente a visão negativa presente na ideia de nacionalismo quando confrontada com a ideia de patriotismo, sumarizando e indo ao encontro do cerne do pensamento dos autores acima mobilizados. Orwell afirma:

O nacionalismo não deve ser confundido com o patriotismo. Ambas as palavras são normalmente usadas de uma maneira tão vaga que qualquer definição é passível de ser disputada, mas é preciso estabelecer uma distinção entre elas, uma vez que duas ideias diferentes e até mesmo opostas estão envolvidas. Por “patriotismo” entendo a devoção a um lugar e um modo de vida particulares, tidos por alguém como os melhores do mundo, mas sem o desejo de impô-los às outras pessoas. A natureza do patriotismo é defensiva, tanto militar como culturalmente. O nacionalismo, por outro lado, é inseparável do desejo de poder. O propósito permanente de qualquer nacionalista é garantir mais poder e mais prestígio não para si próprio, mas para a nação ou unidade em nome da qual escolheu anular a sua individualidade (ORWELL, 1945, s.p, grifos do original).

 

Diferença entre nacionalismo e patriotismo: consirações finais

A interpretação de que o nacionalismo está necessariamente relacionado a uma visão de homogeneidade étnica e coesão e unidade política e social, é criticada por Billig (1995), que acredita haver um viés ocidentalista perante tal argumentação. O autor demonstra críticas a leitura que concebe o patriotismo como um valor cívico e o nacionalismo como um valor étnico, exclusivamente: “a distinção seria convincente se houvesse critérios claros e inequívocos, além de uma exigência ideológica para distinguir ‘nós’ de ‘eles’” (BILLIG, 1995, p. 55), tradução do autor24). O autor elabora uma crítica direcionada à política e às instituições estadunidenses que, segundo ele, se esforçam para transmitir a impressão de que a lealdade aos Estados Unidos é um valor não apenas a ser defendido, mas também exaltado, de forma que não poderia ser irracional, perigoso ou imperialista, como se pretende retratar o nacionalismo. Para tanto, a saída foi a elaboração de um novo rótulo para representa-lo – o patriotismo: “‘Nosso’ nacionalismo aparece como ‘patriotismo’ – uma força benéfica, necessária e, frequentemente, americana” (Idem, p 55, tradução do autor25).

Em comum, as definições e as simbologias históricas do conceito de “patriotismo”, realizada pelos autores até aqui, atribuem a ele uma denotação positiva, até mesmo necessária. O patriotismo, assim, estaria relacionado aos valores de liberdade, civilidade e republicanismo, distantes de qualquer noção xenofóbica, expansionista, imperialista, etnocêntrica, chauvinista e irracional, que acompanhariam o conceito de nacionalismo. Tal interpretação, no entanto, não é unânime e passou a ser gradualmente contestada pela literatura que ganhou corpo em seguida, sobretudo a partir da segunda metade dos anos 90 (BILLIG, 1995; CALHOUN, 1997; CANOVAN, 1996). Essas novas leituras questionam até que ponto a fronteira conceitual entre os dois termos são, de fato, verificáveis, ou se estão alinhadas a uma tentativa de distanciar-se e, ao mesmo tempo, justificar seu próprio nacionalismo: o nacionalismo cotidiano do Norte Global.

Referência:

SANTOS, Matheus Rodrigues dos et al. ” Brasil acima de tudo, Deus acima de todos”: uma análise dos usos do nacionalismo e patriotismo na candidatura presidencial de Jair Bolsonaro em 2018. 2021.

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Roniel Sampaio Silva

Mestre em Educação e Graduado em Ciências Sociais. Professor do Programa do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Piauí – Campus Campo Maior. Dedica-se a pesquisas sobre condições de trabalho docente e desenvolve projetos relacionados ao desenvolvimento de tecnologias.

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