(Publicada em Ensino Superior Unicamp, Ano 1, n. 2, 2010, pp.16-25)
Temos alguns problemas básicos no ensino médio. Uma peculiaridade do Brasil, na comparação com outros países da América Latina, Europa, Estados Unidos, é o fato de o nosso sistema de ensino médio ser praticamente um só. Há um pequeno setor de ensino profissional ou técnico, muito pequeno; isso não dá alternativas para os estudantes que queiram seguir diferentes caminhos.
A necessidade de um sistema diversificado tem a ver com os interesses diversificados das pessoas; e também com o fato de que a educação básica é muito desigual, e que nem todas as pessoas tem condições de fazer o mesmo tipo de curso médio. Pelo fato de o modelo ser único — o modelo tradicional, acadêmico, ele mesmo com uma série
A necessidade de um sistema diversificado tem a ver com os interesses diversificados das pessoas; e também com o fato de que a educação básica é muito desigual, e que nem todas as pessoas tem condições de fazer o mesmo tipo de curso médio. Pelo fato de o modelo ser único — o modelo tradicional, acadêmico, ele mesmo com uma série
de problemas específicos –, parte das pessoas não conseguem acompanhar o programa e não chegam ao final; ou então, chegam ao final com tantas dificuldades que não têm condições de continuar estudando e de adquirir uma atividade profissional adequada. Temos assim um problema de diversificação; e o sistema predominante, que é quase o único que existe, têm vícios e defeitos, decorrentes de seu conteúdo muito formal e do modelo muito antiquado de ensino, enciclopedista. Há uma carga muito grande de cursos, em que se pede ao aluno decorar e repetir certos conteúdos. O sistema não é formativo e está muito condicionado pela competição para a universidade – o que determina o conteúdo dos cursos. Os cursos
considerados melhores no ensino medio sao aqueles que preparam melhor para os vestibulares mais competitivos. Essa formação não é muito adequada.
Que outros problemas esse modelo único traz?
Por exemplo: a quantidade de cursos que os alunos têm que fazer – um pouquinho de química, um pouquinho de física, um pouquinho de filosofia, um pouquinho de história – no final, ele não aprende nada.
Outro problema: o curso é um ritual de repetições. O aluno precisa ser capaz de papaguear o que está escrito no livro. Em poucos casos isso se transforma realmente em uma aprendizagem. No modelo ingles, por exemplo, há o A-level. O aluno escolhe três temas e trabalha neles: ele se prepara durante o ensino médio naqueles conteúdos que escolheu. Digamos, matemática, química e inglês; ele vai se aprofundar, tem a oportunidade de tomar conhecimento daquilo lendo e discutindo; no processo de aprofundamento, o aluno tem a possibilidade de ganhar competência, de ganhar capacidade. O ensino médio americano é desigual; há coisas boas e coisas ruins. O inglês é melhor. O francês também é um bom sistema; embora, para o meu gosto, um pouco rígido. O nosso sistema é uma tentativa de copiar mal o sistema francês. Se a cópia fosse bem feita, o aluno teria uma boa iniciação à ciência, receberia boa educação de bons professores de matemática, de física. Mesmo assim, hoje em dia, em que os campos de conhecimento são muito vastos, não se pode esperar que a pessoa aprenda tudo. Aprender alguns teoremas de física ajuda a pessoa em alguma coisa? Ela não aprende física moderna, pois a matemática no ensino médio não é suficiente; para que serve isso então? Se o aluno realmente for fazer uma carreira tecnológica, precisaria se aprofundar mais; se vai fazer uma carreira em direito, não precisaria daquilo. Pode-se argumentar que qualquer pessoa hoje em dia precisa saber matemática. Acredito que as pessoas tem que entender as questões da ciência e da tecnologia – porque são importantes, que papel têm na sociedade moderna. Mas aprender as fórmulas da química, os modelos matemáticos da Física, não sei se ajuda. É necessário dar opções às pessoas. Dadas as opções, o aluno tem condições de se aprofundar mais em áreas mais delimitadas. A lei de diretrizes e bases inclui essa concepção de dar alternativas. Mas, na prática brasileira, o que vem acontecendo é colocar mais matérias obrigatórias – filosofia, sociologia…–, o que vai matando a ideia da flexibilidade.
Ver restante da entrevista em: https://www.schwartzman.org.br/simon/2010revunicamp.pdf