Redução de danos política: Por uma esquerda para além disso

Redução de danos: O campo institucional não foi feito para esquerda vencer

Por Roniel Sampaio-Silva

Chegamos na redução de danos. Passamos por um processo doloroso e distópico com a ascensão de Bolsonaro à presidência de 2018. Mesmo derrotando esta figura nas urnas, tivemos uma acelerada (re)intensificação do conservadorismo que se instalou no Congresso. A chamada “onda conservadora” se constitui como uma força latente em um país de contradições coloniais como o nosso. É preciso ressaltar que, no âmbito eleitoral e institucional, a esquerda sempre estará em desvantagem, uma vez que as ditas instituições são configuradas para operar contra os trabalhadores. A luta institucional não deve ser abandonada, porém, deve ser pautada como secundária. Lembre-se que foram as instituições que prenderam Lula e golpearam Dilma.

Redução de danos a logo prazo, vira dano

O que seria uma esquerda redução de danos? Desde que Lula retornou ao poder para fazer contraponto ao bolsonarismo, tem havido um esforço do governo federal em se contrapor a essa força política, negociando e barganhando direitos historicamente conquistados pelos trabalhadores. Flexibiliza-se de forma moderada e progressiva direitos que eram negados como ruptura, os quais antes revelavam o caráter fascista do capital. Porém, o que se tem observado é que essas concessões em favor de supostas negociações democráticas têm repercutido negativamente na vida material dos trabalhadores nas últimas décadas. Portanto, essa redução de danos a longo prazo não melhora as condições de vida dos trabalhadores, e intensifica a exploração.

Redução de danos política é uma postura de se contrapor a um parlamento e outras instituições conservadoras, barganhando direitos da classe trabalhadora sob uma alegação fatalista que não há outra alternativa.

Como superar a redução de danos?

Primeiro, não é fácil gerenciar todas essas contradições. Entretanto, há de se considerar todas as dimensões no processo, não apenas as institucionais. É necessário, sobretudo, considerar que os trabalhadores são uma força política consistente e fundamental que estão em movimento. A essência da democracia está na base. Se as instituições são conservadoras e não atendem aos interesses da classe trabalhadora, é mais que oportuno mobilizar os trabalhadores para pressionar tais forças políticas. Prova disso é o exemplo recente do “Movimento vida além do trabalho”, que precisou dar uma sacudida no governo para que esse, timidamente, se posicionasse. Sem a classe trabalhadora nenhum governo de esquerda se legitima como tal.

A classe trabalhadora está em movimento

O trabalhador está em constante transformação. Altas tecnologias se contrapõem às formas precarizadas de vida, serviços públicos subfinanciados cada vez menos presente que dão lugar às igrejas neopentecostais… É fato que o trabalhador que antes passava fome e vivia em situação de extrema vulnerabilidade teve melhora na sua condição de vida e obviamente deseja melhorá-la. Entretanto, a expectativa de melhora constante está dando lugar a uma estagnação oriunda de um aparelhamento radical do estado brasileiro cada vez mais engessado no neoliberalismo. Aceitar o neoliberalismo como visão de mundo é mergulhar em um abismo de distanciamento de um governo que se comprometeu com uma agenda, mas que se vale de artifícios fatalistas para pôr em prática outra. A contradição teoria e prática pode não ser entendida por todos, mas é vivida de forma cruel por muitos trabalhadores que cada vez mais desacreditam na melhoria de vida pela articulação coletiva e busca amparo no religioso.

Não podemos abandonar a escola

A luta de classes também se manifesta nas instituições. É possível construir consciência de classe nas igrejas neopentecostais? Sim, embora exemplos como o pastor Henrique Vieira, também deputado do PSOL, sejam raros. As escolas públicas, por sua vez, têm promovido a consciência de classe, mesmo com suas contradições. Nos períodos eleitorais, pastores e professores frequentemente estão em lados opostos, pois muitos pastores têm posições próximas à burguesia e no geral os professores estão mais próximos da classe trabalhadora. Assim, a escola pública brasileira, em certas circunstâncias, se contrapõe às igrejas na disputa ideológica, com igrejas reforçando uma consciência de direita e as escolas, de esquerda. Enquanto as igrejas avançam, a escola pública, que historicamente foi um dos locais de contraponto da esquerda, tem sido entregues, por um governo de esquerda, às privatizações e a fundações privadas que suplantam currículos de acordo com seus interesses de direita.

Superar a redução de danos política é urgente. Para isso, é fundamental o compromisso e organização sistemática da classe trabalhadora para que esta atue como poder moderador. Neste contexto, a tem papel fundamental.

Roniel Sampaio Silva

Mestre em Educação e Graduado em Ciências Sociais. Professor do Programa do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Piauí – Campus Campo Maior. Dedica-se a pesquisas sobre condições de trabalho docente e desenvolve projetos relacionados ao desenvolvimento de tecnologias.

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