Autor: Roniel Sampaio Silva

  • Alienação Parental Lei

    Alienação Parental Lei? A noção de alienação parental, desde sua formulação legislativa na Lei nº 12.318/2010, tem provocado intensos debates no campo jurídico, psicológico e das ciências sociais. Se por um lado a legislação visa proteger os vínculos parentais e assegurar o melhor interesse da criança, por outro, há indícios de que sua aplicação tem produzido efeitos colaterais graves, especialmente em contextos de violência doméstica e desigualdade de gênero. A abordagem predominante nas ciências jurídicas e psicológicas, centrada em diagnósticos periciais e dispositivos de controle institucional, é progressivamente criticada pela sociologia, que questiona o papel normativo da lei e seus impactos sociais e simbólicos sobre as mulheres e as crianças.

    A partir da leitura sistemática da literatura brasileira sobre o tema, conforme apresentada por Cardeal et al. (2025), é possível identificar que a alienação parental, longe de ser uma mera técnica de recomposição familiar, opera como uma “tecnologia da não violência” (Schuch, 2013), que reorganiza a dinâmica familiar segundo padrões patriarcais de convivência, sob o pretexto do melhor interesse da criança. Tal dispositivo tem sido apropriado, frequentemente, por genitores do sexo masculino como estratégia jurídica para contestar denúncias de violência e reverter decisões de guarda, revelando seu caráter ambíguo e potencialmente opressor.

    Este artigo tem como objetivo analisar sociologicamente o conceito e a aplicação da lei de alienação parental no Brasil, problematizando seus fundamentos epistemológicos, suas consequências práticas e suas implicações sobre as relações de gênero e de poder nas famílias. A análise baseia-se em uma abordagem qualitativa, sustentada por autores clássicos e contemporâneos das ciências sociais, especialmente aqueles que contribuem para o debate sobre patriarcado, institucionalização da família e biopolítica.


    1. A gênese da alienação parental e sua institucionalização jurídica

    O conceito de alienação parental surgiu nos Estados Unidos, nos anos 1980, com o psicólogo Richard Gardner, que cunhou a expressão “Síndrome da Alienação Parental” (SAP) para descrever um suposto distúrbio observado em filhos de pais separados, caracterizado pela rejeição injustificada de um dos genitores, supostamente induzida pelo outro (Gardner, 1985). Embora carente de validação científica, a ideia ganhou força no meio jurídico internacional, sendo adaptada no Brasil em forma de norma legislativa.

    No país, a Lei nº 12.318/2010 incorporou a noção de alienação parental como um fenômeno jurídico, sem, no entanto, adotar formalmente o termo “síndrome”. A despeito dessa distinção terminológica, como apontam Cardeal et al. (2025), grande parte da produção acadêmica e da prática forense ainda associa diretamente a alienação parental à SAP, sem distinções conceituais rigorosas. Isso contribui para a patologização de comportamentos parentais e o enquadramento moralizante das disputas por guarda e convivência.

    Conforme observa Oliveira (2019), a alienação parental vem sendo usada como resposta jurídica a conflitos intrafamiliares, muitas vezes esvaziando a complexidade das relações parentais e transformando disputas legítimas em atos de desvio. Essa prática, ao privilegiar uma suposta neutralidade técnica da psicologia e do direito, ignora os contextos históricos, sociais e afetivos nos quais essas relações se inserem.


    2. A sociologia da família e o patriarcado como chave analítica

    A sociologia há muito tempo se debruça sobre a estrutura familiar como uma instituição reguladora das relações sociais, reprodutora de normas, valores e desigualdades. Nas análises clássicas, como as de Durkheim, a família é entendida como um dos pilares da moralidade social; para Engels (1979), no entanto, ela constitui uma célula fundamental de reprodução das relações de dominação, especialmente do patriarcado.

    No contexto da alienação parental, o uso do dispositivo legal revela uma continuidade da lógica patriarcal sob nova roupagem institucional. Como demonstram Severi e Villarroel (2021), a lei é frequentemente utilizada por homens acusados de violência para reverter acusações e contestar a guarda dos filhos, mobilizando uma narrativa que coloca a mulher como vingativa e manipuladora. Trata-se de um reposicionamento estratégico do poder masculino no espaço familiar, que encontra na LAP uma ferramenta para a manutenção da autoridade simbólica e legal.

    O conceito de “tecnologias patriarcais”, desenvolvido por Cardeal et al. (2025), é útil para compreender esse processo. Segundo as autoras, a LAP funciona como uma tecnologia de controle que regula o comportamento materno, punindo desvios do modelo de “boa mãe” e silenciando denúncias de violência. Assim, a lei não apenas intervém na dinâmica familiar, mas a reconfigura a partir de um ideal normativo patriarcal.

    3. A atuação do sistema de justiça e o apagamento das vozes infantis

    O sistema de justiça desempenha um papel central na operacionalização da Lei da Alienação Parental. Como indicam Cardeal et al. (2025), a aplicação da LAP depende quase sempre da produção de laudos psicológicos ou biopsicossociais que classificam a família como funcional ou disfuncional. Esses documentos funcionam como “verdades jurídicas” capazes de fundamentar decisões como alteração da guarda, imposição de visitas assistidas e acompanhamento psicológico compulsório.

    Essa prática levanta sérias preocupações sociológicas quanto ao modo como a infância é tratada nesses processos. Embora o princípio do “melhor interesse da criança” esteja presente no discurso jurídico, na prática, as crianças e adolescentes são frequentemente desconsiderados como sujeitos de direitos e silenciados em suas experiências subjetivas (D’Almeida, 2018). O foco recai, em grande parte, sobre o comportamento dos adultos, especialmente da mãe, que é recorrentemente responsabilizada pelos conflitos.

    Nakamura (2020) problematiza a superficialidade com que o interesse da criança é tratado nos processos de alienação parental, sobretudo nos casos em que denúncias de abuso ou violência são descartadas como falsas memórias implantadas. A crítica evidencia como o aparato jurídico pode reproduzir uma lógica adultocêntrica e sexista, na qual a mulher é culpabilizada e a criança invisibilizada. Assim, o dispositivo legal se afasta de seu suposto propósito de proteção infantil e atua, paradoxalmente, como mecanismo de opressão.


    4. A patologização das condutas e a crítica à pseudociência

    Outro ponto de tensão revelado pela análise sociológica da LAP diz respeito à patologização das condutas familiares. A incorporação da SAP — ainda que informalmente — no judiciário brasileiro reforça uma abordagem reducionista, que converte disputas complexas em quadros clínicos ou comportamentais, muitas vezes sem base empírica robusta (Sousa, 2019).

    Essa lógica patologizante ecoa o que Foucault (2001 [1975]) chamou de “poder de normalização”. Ao identificar comportamentos como anômalos ou desviantes, o sistema jurídico e os especialistas atuam como dispositivos de correção social. No caso da alienação parental, o laudo psicológico assume a função de declarar o “anormal”, atribuindo à mulher o lugar da desestabilizadora da ordem familiar. O resultado disso é a legitimação de medidas coercitivas, travestidas de proteção.

    Cardeal et al. (2025) demonstram que muitos dos instrumentos psicológicos utilizados para diagnosticar a AP carecem de validação científica e precisão psicométrica, o que compromete sua confiabilidade. A ausência de um protocolo claro e padronizado de avaliação reforça a crítica à utilização acrítica da psicologia pelo sistema de justiça, que, em nome da neutralidade técnica, se exime de refletir sobre os vieses ideológicos de suas práticas.


    5. O viés de gênero e a culpabilização das mulheres

    A análise sociológica da alienação parental não pode ignorar sua intersecção com as desigualdades de gênero. A literatura revisada evidencia que as mulheres são as principais acusadas de AP, especialmente quando denunciam violência doméstica ou sexual. Isso ocorre porque a LAP, na prática, se transforma em um instrumento de silenciamento e retaliação contra mães que rompem com padrões tradicionais de submissão (Malta; Nicácio, 2021).

    De acordo com Diniz (2011), o sistema judiciário tende a reproduzir estereótipos de gênero, tratando as mulheres como instáveis, vingativas ou manipuladoras. Quando elas tentam proteger seus filhos de situações de risco, são acusadas de alienadoras; quando silenciam, são negligentes. Essa armadilha revela a lógica da maternidade patriarcal, em que à mulher cabe cuidar, calar e suportar, sob pena de perder o direito à maternidade.

    Nesse cenário, a alienação parental se converte em um novo tipo de violência institucional de gênero, conforme apontam Severi e Villarroel (2021). A mulher deixa de ser vista como cuidadora legítima para ser tratada como ameaça à ordem familiar, sobretudo quando desafia a autoridade masculina. Trata-se de uma forma de reatualização do patriarcado, que utiliza o discurso técnico-jurídico como mecanismo de controle e disciplinamento.


    6. A contradição entre proteção e punição: a criança em segundo plano

    Embora o discurso jurídico afirme que a LAP visa ao bem-estar infantil, os dados mostram que a criança raramente é o sujeito principal das decisões. Em vez disso, ela se torna objeto de disputa entre adultos, sendo muitas vezes exposta a situações de sofrimento, insegurança e revitimização (Brandão, 2019).

    O princípio do “melhor interesse da criança” é constantemente invocado, mas pouco problematizado. Como afirmam Cardeal et al. (2025), a escuta da criança é frequentemente instrumentalizada, e seus relatos desacreditados, especialmente quando corroboram denúncias feitas pela mãe. Nessas situações, prevalece a ideia de que a criança foi manipulada, o que resulta na sua desautorização simbólica e na negação de sua experiência.

    Sottomayor (2011) adverte que a judicialização das relações familiares pode produzir efeitos devastadores sobre a infância, sobretudo quando os processos se prolongam por anos e expõem os menores a múltiplas intervenções. A lógica punitiva e adversarial dos tribunais é pouco compatível com o cuidado e a escuta necessários em contextos de vulnerabilidade afetiva.

    7. Crítica institucional: a judicialização da vida privada

    A crítica à Lei da Alienação Parental também passa por uma análise institucional mais ampla, em que se observa a crescente judicialização da vida privada. Ao transferir para o judiciário o papel de mediador dos conflitos familiares, especialmente em contextos de separação, guarda e convivência, o Estado acaba por reforçar dinâmicas autoritárias, centradas na norma, na punição e no controle, em detrimento da escuta, do diálogo e da autonomia familiar (Oliveira, 2020).

    A sociologia crítica, nesse sentido, alerta para os riscos de uma intervenção estatal pautada por instrumentos de correção e disciplinamento que desconsideram os vínculos afetivos e as subjetividades envolvidas. Como indicam Coelho (2013) e Maciel (2019), a atuação de psicólogos e assistentes sociais no âmbito da LAP muitas vezes é instrumentalizada pelo sistema de justiça para legitimar decisões previamente orientadas por concepções normativas de família, gênero e infância.

    Essa judicialização não apenas alimenta o litígio e a desconfiança entre os genitores, como também transforma o conflito familiar em um problema técnico a ser solucionado por peritos e magistrados, em vez de ser compreendido em sua complexidade social e emocional. Como afirmam Loures e Felippe (2020), trata-se de uma estratégia institucional que, sob o pretexto da proteção, acaba por reatualizar o poder patriarcal e punir, em especial, as mulheres.


    8. Contribuições da sociologia da infância ao debate

    A sociologia da infância propõe uma mudança de perspectiva fundamental: enxergar a criança como sujeito social ativo, dotado de voz, agência e direitos. Esse campo do conhecimento, consolidado a partir dos anos 1990, contesta a visão adultocêntrica que permeia as instituições sociais, incluindo o judiciário, e reivindica a escuta qualificada das crianças em processos que dizem respeito diretamente às suas vidas (Santomé, 2013).

    No debate sobre alienação parental, essa perspectiva é fundamental para desconstruir a lógica que trata a criança como objeto de disputa e a reduz a um campo de manipulação parental. Como destacam Brandão (2019) e Nakamura (2020), escutar a criança não significa apenas colher seu depoimento, mas reconhecer sua subjetividade, respeitar sua narrativa e protegê-la dos efeitos colaterais da judicialização exacerbada.

    A crítica sociológica à LAP, portanto, não se limita à denúncia de seus efeitos sobre as mulheres. Ela inclui também a afirmação dos direitos das crianças e adolescentes à convivência segura, ao cuidado afetivo e à autonomia relacional. Essa é uma dimensão muitas vezes esquecida nos processos judiciais, onde a escuta infantil é conduzida sem formação específica, sem tempo adequado e, frequentemente, com viés interpretativo que descredibiliza o que é dito.


    9. Considerações finais

    A alienação parental, enquanto categoria jurídica e prática institucional, está longe de ser um fenômeno neutro. Como demonstrado ao longo deste artigo, trata-se de uma construção social situada, marcada por disputas simbólicas e estruturada por relações de poder, especialmente as de gênero. A Lei nº 12.318/2010, ao invés de apenas proteger vínculos parentais, tem sido utilizada para criminalizar condutas maternas, silenciar denúncias de violência e reforçar modelos patriarcais de família.

    A partir da análise sociológica, é possível compreender a LAP como um dispositivo de normalização que, sob o discurso técnico da psicologia e da proteção infantil, reproduz desigualdades históricas e retira da mulher e da criança o direito à palavra e à autonomia. A intervenção judicial, muitas vezes pautada por laudos precários e orientada por estereótipos de gênero, age mais para punir do que para proteger.

    É urgente, portanto, repensar os marcos legais e institucionais que regem as disputas familiares, incorporando princípios de justiça social, escuta qualificada e abordagem interseccional. Isso exige o reconhecimento das experiências de mulheres e crianças como legítimas, bem como a crítica aos saberes periciais que naturalizam o sofrimento, transformando-o em diagnóstico.

    A sociologia tem um papel fundamental nesse processo: desnaturalizar o jurídico, dar visibilidade aos sujeitos silenciados e propor uma leitura crítica dos dispositivos de poder que regulam a vida privada. No caso da alienação parental, a tarefa é clara: não se trata de negar a existência de conflitos parentais ou suas implicações emocionais, mas de recusar sua criminalização seletiva e patriarcal. A luta, aqui, é pelo direito à proteção sem opressão.

    Referências Bibliográficas

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    CARDEAL, Camila et al. Tecnologias patriarcais: uma revisão sistemática sobre a alienação parental. Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v. 33, n. 1, e95074, 2025. DOI: 10.1590/1806-9584-2025v33n195074.

    COELHO, Maria Isabel S. A lei da alienação parental (Lei 12.318/2010): concepções e práticas de psicólogos peritos. Fortaleza: UNIFOR, 2013.

    DINIZ, Debora. Estereótipos de gênero nas cortes internacionais: um desafio à igualdade. Revista Estudos Feministas, v. 19, p. 451-462, 2011.

    FOUCAULT, Michel. Os anormais. São Paulo: Martins Fontes, 2001.

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    MALTA, Rafaella; NICÁCIO, Camila. Do acesso ao segredo ao (des)acesso à justiça. Antropolítica, n. 51, 2021.

    NAKAMURA, Carlos Renato. O mito do superior interesse da criança e do adolescente. In: CONSELHO REGIONAL DE PSICOLOGIA DE SÃO PAULO (Org.). Cristalização, patologização e criminalização da vida no sistema de Justiça: “Alienação Parental” e a atuação da/o psicóloga/o. São Paulo: CRP-SP, 2020. (Caderno Temático n. 38)

    OLIVEIRA, Camilla Felix B. de. Entre conflitos familiares e resoluções consensuais: a judicialização em tempos de humanização da Justiça. Manaus: UFAM, 2020.

    SEVERI, Fabiana; VILLARROEL, Camila. Alienação parental e a produção da maternidade patriarcal. Revista Estudos Feministas, v. 29, n. 2, 2021.

    SOUSA, Analicia. A síndrome da alienação parental e o discurso jurídico: uma análise crítica. Revista de Estudos Sociais, v. 21, n. 1, p. 79-92, 2019.

    SOTTOMAYOR, Maria Clara. Criança, tribunal e afeto: a audição da criança em processo judicial. Coimbra: Almedina, 2011.

  • Artigo de divulgação cientifica

    Vivemos em uma sociedade na qual o conhecimento científico ocupa posição central, não apenas nas esferas técnicas e produtivas, mas também nas instâncias políticas e culturais. A ciência, muitas vezes idealizada como o pináculo da racionalidade, tornou-se um dos principais vetores da organização social, definindo desde políticas públicas até práticas cotidianas. Nesse cenário, o artigo de divulgação científica surge como um importante mediador entre o saber especializado e o público leigo. Mais do que uma ferramenta de educação, ele representa um instrumento de poder simbólico, de legitimação e, em alguns casos, de exclusão social.

    Entender o papel dos artigos de divulgação científica exige uma reflexão crítica que considere os fatores históricos, sociais e políticos envolvidos em sua produção, circulação e recepção. A partir da obra de Sarita Albagli (1996), busca-se aqui uma análise detalhada sobre como a divulgação científica participa da constituição da cidadania, ora promovendo a democratização do conhecimento, ora reforçando desigualdades estruturais.

    2. Fundamentos históricos da divulgação científica

    A popularização da ciência possui raízes profundas, ligadas às transformações ocorridas na passagem da Idade Média para a Modernidade. A chamada “revolução científica”, ocorrida nos séculos XVI e XVII, e as mudanças sociais que a acompanharam, como o Humanismo e o Renascimento, prepararam o terreno para o surgimento de uma nova racionalidade baseada na experimentação, na razão e na objetividade (Albagli, 1996). A ascensão da burguesia e o fortalecimento do capitalismo impulsionaram o desenvolvimento técnico-científico, que passou a ser compreendido como um diferencial estratégico para o progresso material das nações.

    A consolidação da ciência como força produtiva ganhou ainda mais força a partir da Revolução Industrial. A utilização de descobertas científicas em processos produtivos e bélicos evidenciou seu poder transformador. No pós-Segunda Guerra Mundial, a ciência passa a ser institucionalizada em níveis sem precedentes, e a sua popularização torna-se um imperativo político e econômico (Prewitt, 1983). Surge então o paradoxo: enquanto a ciência alcança prestígio inédito, também se intensificam as críticas aos seus efeitos colaterais, como o uso destrutivo de tecnologias e a alienação do público em relação aos seus fundamentos e impactos.

    3. Conceitos e distinções fundamentais

    Divulgação científica não se confunde com comunicação científica ou difusão científica, embora compartilhe elementos com ambas. Enquanto a comunicação científica destina-se a especialistas e utiliza jargões próprios da academia, a divulgação visa o público leigo e traduz esse conteúdo para uma linguagem acessível (Bueno, 1984). Já a difusão científica, mais abrangente, pode incluir tanto especialistas quanto não-especialistas.

    Nesse contexto, o artigo de divulgação científica assume papel educativo, cívico e mobilizador. Seu objetivo vai além da mera transmissão de informações: ele busca formar uma opinião pública crítica, capaz de participar do debate sobre os rumos da ciência e de suas aplicações sociais (Anandakrishnan, 1985). Esse caráter multifacetado confere à divulgação científica uma importância estratégica nos processos de construção da cidadania.

    4. Dimensões sociais e políticas da divulgação científica

    A divulgação da ciência pode operar como mecanismo de emancipação social, permitindo que diferentes segmentos da população compreendam os fenômenos que impactam suas vidas. Por outro lado, pode também funcionar como instrumento de dominação simbólica, ao reproduzir concepções elitistas sobre o saber legítimo.

    Albagli (1996) destaca que a motivação por trás da divulgação científica mudou ao longo do tempo. Se no passado a ênfase estava na beleza e na curiosidade sobre o mundo natural, hoje ela responde a interesses econômicos e políticos mais complexos. Em países periféricos, como o Brasil, isso se manifesta na tentativa de legitimar decisões tecnocráticas ou justificar investimentos em áreas estratégicas, muitas vezes alheias às reais necessidades da população.

    Além disso, a autora expõe duas interpretações antagônicas sobre o crescimento das ações de divulgação científica. De um lado, estão aqueles que veem nelas uma forma de fomentar a participação democrática nos processos decisórios. De outro, há os que enxergam um movimento conservador e corporativista, cujo objetivo seria reforçar o prestígio da ciência e blindá-la contra críticas sociais (Wynne, 1992).

    5. O papel dos meios de comunicação

    A mídia ocupa um lugar privilegiado na divulgação científica. Desde os periódicos científicos do século XVII até os atuais programas televisivos e portais digitais, a informação científica circula amplamente entre o público. Contudo, essa circulação nem sempre ocorre de forma crítica ou democrática. A lógica mercantilista do jornalismo tradicional, marcada pelo sensacionalismo e pela superficialidade, muitas vezes compromete a qualidade e a profundidade da informação científica veiculada (Melo, 1984).

    Há, ainda, um predomínio da chamada “big science”, ou seja, das grandes descobertas e tecnologias de ponta, em detrimento dos saberes locais, das ciências humanas e dos debates éticos. Como observa Albagli (1996), isso contribui para a reprodução do mito da ciência como instância neutra e incontestável, invisibilizando os conflitos de interesse e as assimetrias de poder que a atravessam.

    6. Museus e centros de ciência: espaços de experiência

    Além da mídia, os museus e centros de ciência desempenham papel crucial na popularização do conhecimento científico. Esses espaços, historicamente associados à educação formal e à preservação do patrimônio, vêm se reinventando como ambientes interativos, nos quais o visitante é estimulado a experimentar, observar e formular hipóteses (Bragança Gil, 1988).

    Nos chamados “centros de ciência”, a proposta é aproximar o visitante da lógica da pesquisa científica por meio da metodologia hands-on: tocar, mexer, testar, construir. No entanto, como alerta Albagli (1996), mesmo essas experiências carregam limitações. Sem um referencial teórico claro, muitas atividades correm o risco de se transformarem em mero entretenimento, esvaziando seu potencial educativo.

    7. Educação científica formal e informal

    A relação entre divulgação científica e educação escolar é complexa. Por um lado, a escola tem o papel de sistematizar o conhecimento e desenvolver habilidades cognitivas e críticas. Por outro, a ciência circula em múltiplos espaços informais, como a televisão, a internet, os museus e até mesmo o cotidiano. Segundo Miller (1992), é a combinação entre educação formal e experiências informais que promove uma compreensão mais ampla da ciência.

    Nesse sentido, o artigo de divulgação científica atua como ponte entre esses dois mundos, contribuindo para a formação contínua e ampliada dos cidadãos. A sua eficácia, no entanto, depende de uma série de fatores: linguagem adequada, contextualização social, conexão com o cotidiano do leitor e compromisso ético com a informação.

    8. Os desafios da divulgação científica no Sul global

    Nos países em desenvolvimento, como o Brasil, a divulgação científica enfrenta obstáculos estruturais. Além das desigualdades socioeconômicas e educacionais, há a questão da dependência tecnológica, que torna a ciência praticada nesses contextos muitas vezes importada, desconectada das demandas locais (Sharafudin, s/d). Isso agrava a exclusão cognitiva, pois os temas tratados nos artigos de divulgação muitas vezes não dialogam com a realidade de parte significativa da população.

    Albagli (1996) observa que, apesar das limitações, a divulgação científica nesses países é ainda mais urgente, pois pode funcionar como uma ferramenta de enfrentamento das desigualdades e promoção de práticas mais conscientes em áreas essenciais como saúde, meio ambiente e alimentação. Ela defende que a popularização da ciência seja pensada não apenas como uma ação técnica, mas como uma prática social transformadora, pautada pela inclusão e pela justiça cognitiva.

    9. Limites e potencialidades dos artigos de divulgação científica

    O artigo de divulgação científica, enquanto gênero textual, apresenta uma série de particularidades. Deve ser claro, conciso, acessível, mas sem abrir mão do rigor conceitual. Deve ser atrativo, mas não sensacionalista. Sua força reside justamente nessa capacidade de traduzir, sem distorcer, e de contextualizar, sem vulgarizar.

    No entanto, há sempre o risco de simplificação excessiva, de submissão à lógica do mercado e de reiteração de discursos hegemônicos. Isso exige dos autores um compromisso ético com a ciência e com os leitores. Para cumprir seu papel de instrumento de cidadania, o artigo de divulgação científica precisa romper com a imagem da ciência como verdade absoluta e neutra, revelando suas disputas internas, seus limites e seu enraizamento social.

    A tarefa é dupla: popularizar a ciência e, ao mesmo tempo, desmistificá-la. Isso implica mostrar que o conhecimento científico é produto de contextos históricos, decisões políticas, interesses econômicos e valores culturais. Como afirma Wynne (1992), mais importante do que informar sobre conteúdos científicos é discutir as instituições que os produzem, os critérios que os legitimam e os impactos que geram.

    10. Conclusão

    O artigo de divulgação científica constitui uma ferramenta poderosa para a construção da cidadania científica. Ao tornar o conhecimento acessível, ele pode fortalecer a autonomia dos sujeitos, ampliar sua capacidade crítica e promover uma participação mais qualificada nos debates públicos sobre ciência, tecnologia e sociedade.

    Contudo, para que esse potencial se realize, é necessário repensar os modelos de produção e circulação da informação científica. Isso inclui valorizar os saberes locais, combater o elitismo acadêmico, promover a interdisciplinaridade e adotar perspectivas inclusivas e participativas. É preciso, como propõe Albagli (1996), evitar que a divulgação científica se torne apenas um instrumento de legitimação do status quo e que se perca a oportunidade de fomentar uma cultura científica verdadeiramente democrática.

    O desafio está lançado: fazer da ciência um bem comum, e do artigo de divulgação científica, um canal de diálogo entre o saber técnico e as necessidades da população. Trata-se de uma construção permanente, que requer compromisso político, sensibilidade social e rigor intelectual.


    Referências

    ALBAGLI, S. Divulgação científica: informação científica para a cidadania? Ciência da Informação, v. 25, n. 3, p. 396-404, 1996.

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  • Ação Social Tradicional e formação social

    A ação social tradicional é uma das categorias centrais da tipologia de Max Weber, um dos clássicos da sociologia. Seu estudo permite uma compreensão mais profunda dos comportamentos enraizados em costumes, valores transmitidos entre gerações e estruturas de poder legítimas em contextos sociais específicos. A partir da elaboração do tipo ideal, Weber oferece uma ferramenta metodológica que, embora não se confunda com a realidade empírica, permite interpretá-la e decodificá-la. Este texto tem como objetivo analisar a ação social tradicional em suas várias dimensões, articulando-a às formas de dominação legítima, aos tipos de educação e às configurações históricas nas quais se manifesta.

    A Tipologia da Ação Social em Weber

    Weber (1971) classifica a ação social em quatro tipos ideais: racional com relação a fins, racional com relação a valores, afetiva e tradicional. Esta última se refere àquelas condutas que se mantêm por força do costume, da repetição e da continuidade cultural. Elas não surgem de reflexão racional ou emoção momentânea, mas da aceitação de uma prática consagrada pelo tempo. Segundo Viana (2004), este tipo de ação está diretamente ligado às formas de dominação tradicional, como o patriarcalismo e a gerontocracia.

    A ação tradicional possui, portanto, um alto grau de estabilidade social, sendo essencial para a manutenção de ordens sociais que se legitimam pelo respeito às tradições. Neste tipo de contexto, as mudanças sociais ocorrem de forma lenta, através de um processo de acomodação e não de ruptura.

    Dominação Legítima e Ação Tradicional

    A relação entre ação social tradicional e dominação legítima é central na obra de Weber. Ele identifica três tipos puros de dominação legítima: tradicional, carismática e racional-legal. A dominação tradicional é sustentada por crenças em costumes e normas estabelecidas, sendo exemplificada pelas relações patriarcais. O poder é exercido por aqueles que detêm um status tradicionalmente reconhecido, como o patriarca, o monarca hereditário ou o ancião da comunidade (Weber, 1986).

    Nas formas de dominação tradicional, os subordinados não obedecem a uma lei impessoal ou ao carisma do líder, mas à tradição que legitima a autoridade. Como salienta Freund (1987), essa obediência é tida como um ato de devoção ao costume, à ordem estabelecida, e não como resultado de um convencimento racional.

    Educação Tradicional como Expressão da Ação Social

    Weber também relaciona os tipos de educação com os tipos de dominação. A educação tradicional é aquela voltada à formação de um tipo específico de homem, moldado pelos valores do estamento ao qual pertence. Trata-se de uma educação voltada às elites tradicionais, que visa preservar os valores, o estilo de vida e o status do grupo dominante.

    A educação tradicional, segundo Weber (1971), não busca a formação de especialistas ou técnicos, mas de sujeitos cultos conforme o modelo consagrado. Os letrados chineses são um exemplo emblemático dessa forma de educação, como apontado por Viana (2004), pois eram educados não apenas para dominar conteúdos, mas para encarnar os valores confucianos e manter a ordem estamental.

    Permanência da Ação Tradicional na Modernidade

    Apesar da crescente racionalização das sociedades modernas, a ação tradicional permanece presente em vários aspectos da vida social. Instituições como a família, a escola e a religião conservam em suas práticas elementos de tradição. Como observa Hobsbawm (1990), muitas tradições modernas são “invenções” recentes, mas se consolidam por meio da repetição e da criação de um passado compartilhado.

    Mesmo na política, frequentemente são acionados discursos e símbolos tradicionais para legitimar lideranças. A relação entre eleitores e líderes pode assumir traços tradicionais, como a fidelidade a nomes ou famílias políticas, independentemente da eficiência racional de suas propostas.

    Considerações Finais

    A ação social tradicional, apesar de frequentemente vista como resquício do passado, ainda estrutura muitos aspectos das relações sociais contemporâneas. Ela não apenas sustenta formas de dominação legítima e modelos educacionais específicos, como também oferece um quadro analítico essencial para compreender a persistência de práticas, instituições e valores que resistem à racionalização moderna.

    Referências

    FREUND, Julien. A Sociologia de Weber. Rio de Janeiro: Forense, 1987. HOBSBAWM, Eric. A invenção das tradições. São Paulo: Paz e Terra, 1990. VIANA, Nildo. Weber: Tipos de educação e educação burocrática. Guanuncuns, Rev. da Faculdade de Educação e Ciências Humanas de Anicuns, 2004. WEBER, Max. Ensaios de Sociologia. Rio de Janeiro: Zahar, 1971. WEBER, Max. Os Três Tipos Puros de Dominação Legítima. In: Cohn, Gabriel (org.). Weber. São Paulo: Ática, 1986.

  • Aula sobre redação: domine os fundamentos para o ENEM domine 6 etapas

    Aula sobre redação: domine os fundamentos para o ENEM domine 6 etapas

    Aula sobre redação: A importância da aula sobre redação na formação crítica e cidadã

    Escrever bem não é apenas uma habilidade escolar: trata-se de uma ferramenta essencial para a vida em sociedade, o exercício da cidadania e o acesso a oportunidades. Nesse sentido, a aula sobre redação cumpre um papel fundamental no desenvolvimento de competências cognitivas, linguísticas e sociais dos estudantes, especialmente quando o foco está voltado para produções dissertativo-argumentativas, como as exigidas pelo Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).

    A proposta de redação do Enem parte do pressuposto de que o estudante deve articular conhecimentos diversos, defender um ponto de vista com coerência e coesão e apresentar uma proposta de intervenção social fundamentada e respeitosa aos direitos humanos. Para tanto, a cartilha A Redação do Enem 2023 detalha as cinco competências avaliadas, sendo elas: domínio da modalidade escrita formal da língua portuguesa; compreensão da proposta e desenvolvimento do tema; construção de argumentos; coesão textual e elaboração de proposta de intervenção (BRASIL, 2023).

    Nas aulas de redação, é essencial que o estudante compreenda a relevância de cada uma dessas competências. A Competência I, por exemplo, exige o domínio gramatical e ortográfico, assim como a construção sintática adequada. Isso reforça a importância do ensino contínuo da gramática normativa e do uso da língua em diferentes gêneros textuais. Como explica Fiorin (2017), a linguagem é um instrumento de ação no mundo; por isso, o domínio da norma culta possibilita ao sujeito maior inserção nos espaços sociais formais.

    Mais do que regras, a redação exige consciência de estrutura e propósito. O texto dissertativo-argumentativo é uma composição organizada logicamente, com introdução, desenvolvimento e conclusão. A Competência II valoriza a capacidade do aluno em compreender o tema proposto e desenvolver sua argumentação com base em repertório sociocultural. Segundo Antunes (2014), a boa escrita nasce de um bom leitor, e, por isso, o desenvolvimento de habilidades leitoras deve estar intrinsecamente ligado ao processo de produção textual.

    Além disso, a Competência III do Enem avalia como o estudante seleciona, organiza e interpreta informações e argumentos. Esse é o ponto em que se expressa a originalidade e a autoria, o que pressupõe não apenas repetir conteúdos, mas selecionar ideias pertinentes e desenvolvê-las criticamente. Nesse contexto, o papel do professor de redação é atuar como mediador entre o conteúdo e a prática, incentivando o planejamento do texto, a revisão e a reflexão metalinguística.

    O texto deve também apresentar coesão e continuidade temática, aspectos avaliados pela Competência IV. Conforme a cartilha do Enem, espera-se o uso eficaz de operadores argumentativos e pronomes referenciais, garantindo a articulação lógica das ideias. Koch e Elias (2006) destacam que a coesão não é meramente gramatical: ela envolve a construção de sentido e o encadeamento semântico das ideias.

    Por fim, a Competência V exige que o estudante proponha uma intervenção social viável e detalhada, respeitando os direitos humanos. Essa é, sem dúvida, uma das marcas mais significativas da redação do Enem, pois requer que o estudante assuma uma postura cidadã diante do problema discutido. Para isso, a escola deve estimular a consciência crítica e o debate sobre questões sociais, promovendo o protagonismo juvenil.

    A prática da redação não deve estar restrita aos momentos de avaliação. É preciso desenvolver uma cultura de escrita no cotidiano escolar, com exercícios progressivos, leituras reflexivas e análises de textos-modelo. Como observa Geraldi (1997), ensinar a escrever é ensinar a pensar, pois o ato de escrever demanda organização, clareza de ideias e domínio argumentativo.

    Portanto, uma aula sobre redação eficaz deve ser estruturada de modo a contemplar a leitura crítica, o planejamento textual, a escrita e a reescrita. Cada etapa do processo contribui para a formação integral do aluno, desenvolvendo não apenas sua competência linguística, mas também seu senso ético e sua capacidade de intervenção social.

    No próximo bloco, aprofundaremos o papel das competências avaliativas do Enem, relacionando-as a práticas pedagógicas eficazes em sala de aula.

    Aula sobre redação: As cinco competências do Enem como eixo estruturante

    Compreender as cinco competências da matriz avaliativa do Enem é essencial para planejar e conduzir uma aula sobre redação eficaz. Elas não apenas norteiam os critérios de correção da prova, mas também oferecem parâmetros sólidos para o ensino da escrita argumentativa na educação básica. Quando internalizadas pelo estudante, essas competências funcionam como bússolas para a construção de um texto claro, coeso e pertinente.

    Aula sobre redação: Competência I: Domínio da modalidade escrita formal

    A primeira competência refere-se ao domínio da norma-padrão da língua portuguesa. Esse domínio não se limita ao uso correto da ortografia, da acentuação ou da pontuação, mas estende-se à construção sintática complexa e à escolha adequada do vocabulário. Como afirma Cunha (2011), escrever bem exige não apenas saber as regras, mas saber aplicá-las de modo pertinente ao contexto e à intenção comunicativa.

    De acordo com a cartilha do Inep (2023), textos com estruturas sintáticas complexas, boa organização dos períodos e uso adequado da variedade formal da língua são os que mais se destacam nessa competência. Por isso, nas aulas de redação, é recomendável promover atividades que valorizem a prática da escrita formal, como a reescrita de textos, o uso de conectores apropriados e o reconhecimento de desvios gramaticais em produções alheias.

    Além disso, é necessário mostrar ao estudante que o erro gramatical não é apenas uma falha de forma, mas pode comprometer o sentido e a credibilidade do texto. Segundo Possenti (2002), a norma culta é um dos códigos que regulam o acesso aos espaços de poder. Assim, dominar a escrita formal é também um ato de empoderamento linguístico.

    Aula sobre redação: Competência II: Compreensão da proposta e do gênero textual

    A segunda competência exige que o aluno compreenda o tema proposto, aplique conceitos interdisciplinares e respeite a estrutura do texto dissertativo-argumentativo. É aqui que o papel da leitura ganha relevância. O estudante precisa ir além da decodificação dos textos motivadores e ser capaz de formular um ponto de vista próprio, com base em seus conhecimentos de mundo.

    A aula sobre redação deve, portanto, incluir práticas de leitura ativa, interpretação crítica dos textos base e exercícios que estimulem a formulação de teses claras. Como ressalta Rojo (2009), a leitura é um processo interativo que envolve o conhecimento prévio do leitor, sua capacidade interpretativa e sua posição crítica diante do texto.

    No contexto do Enem, abordar parcialmente o tema pode levar ao tangenciamento, e fugir completamente do recorte temático resulta em anulação da redação. Por isso, o professor precisa ensinar estratégias de análise temática, como a identificação do sujeito do enunciado, do problema social implicado e da intencionalidade discursiva da proposta.

    Aula sobre redação: Competência III: Seleção e organização de argumentos

    Essa competência está relacionada à capacidade do estudante de defender uma tese por meio de argumentos consistentes e bem organizados. Ela revela o grau de autoria do texto, isto é, o quanto o estudante consegue sustentar sua opinião com base em informações, fatos e dados pertinentes.

    Como afirma Koch (2009), a argumentação exige não só lógica e coerência, mas também criatividade e clareza na exposição das ideias. Nas aulas de redação, o professor pode trabalhar com atividades que envolvam a análise de estratégias argumentativas, o uso de repertórios socioculturais produtivos e a elaboração de mapas mentais ou esquemas para planejamento textual.

    Importa destacar que a Competência III exige uma progressão argumentativa. Isso significa que os parágrafos do desenvolvimento devem se conectar de forma lógica e cumulativa, e não simplesmente repetir a mesma ideia com palavras diferentes. Como lembra a cartilha do Inep (2023), a presença de um projeto de texto é essencial: o estudante deve organizar antecipadamente o que vai dizer e como vai desenvolver seus argumentos.

    Aula sobre redação: Competência IV: Coesão textual

    A quarta competência avalia a habilidade do aluno em articular as partes do texto por meio de mecanismos linguísticos adequados. Trata-se da coesão, que pode ser sequencial (com o uso de conectivos) ou referencial (com o uso de pronomes, advérbios e substituições lexicais). É ela que garante a fluidez da leitura e a compreensão global do texto.

    Segundo Fávero e Koch (2015), coesão não é sinônimo de uso excessivo de conectores. Um bom texto coeso é aquele que apresenta encadeamento lógico e progressão temática, com recursos que evitam repetições desnecessárias e rupturas abruptas entre as partes.

    Nas aulas, atividades práticas como reescrita de trechos truncados, substituição de termos repetidos por pronomes ou sinônimos e exercícios de inserção de conectores podem ser úteis para o desenvolvimento dessa competência. Além disso, trabalhar com textos exemplares – como as redações nota mil disponibilizadas pelo Inep – contribui para que o estudante perceba como os recursos coesivos atuam na construção da argumentação.

    Aula sobre redação: Competência V: Proposta de intervenção

    Por fim, a quinta competência valoriza a capacidade do aluno em propor uma solução para o problema abordado, respeitando os direitos humanos. Essa proposta deve ser detalhada, viável, relacionada ao tema e articulada ao restante do texto.

    A cartilha (BRASIL, 2023) recomenda que a proposta contemple cinco elementos: a ação, o agente, o modo de execução, a finalidade e um detalhamento complementar. Isso significa que não basta dizer “é necessário combater o problema”; é preciso indicar quem o fará, como fará e com que objetivo.

    Do ponto de vista pedagógico, essa competência estimula o protagonismo estudantil e a visão crítica sobre as questões sociais. Trabalhar com estudos de caso, análise de políticas públicas e elaboração de propostas concretas em sala de aula são estratégias eficazes para desenvolver essa habilidade.

    Como reforça Freire (1996), a educação deve formar sujeitos críticos, capazes de intervir no mundo com consciência e responsabilidade. A proposta de intervenção é, nesse sentido, a expressão mais visível dessa dimensão formativa da redação no Enem.

    Aula sobre redação: Estratégias práticas para a construção da redação em sala de aula

    O êxito de uma aula sobre redação depende não apenas da transmissão de conteúdos teóricos, mas sobretudo do envolvimento do estudante em atividades significativas que despertem seu senso crítico, sua capacidade argumentativa e sua autoria textual. Nesse sentido, é fundamental que o ensino de produção textual seja planejado como um processo contínuo, que articule leitura, análise, escrita e reescrita.

    Etapa 1: Leitura crítica e interpretação temática

    Antes de iniciar a produção escrita, o estudante precisa compreender com clareza o tema proposto. Essa etapa vai além da simples leitura dos textos motivadores. Como orienta a cartilha do Enem (BRASIL, 2023), o participante deve ser capaz de identificar o recorte temático, a situação-problema e os elementos centrais da proposta.

    Em sala de aula, uma estratégia eficaz é realizar rodas de conversa e debates interpretativos sobre temas de relevância social. A leitura de reportagens, ensaios curtos, gráficos e infográficos também amplia o repertório sociocultural do aluno e desenvolve sua capacidade de análise crítica.

    Outro recurso útil é a produção de mapas conceituais com os principais conceitos e campos semânticos relacionados ao tema. Essa ferramenta favorece a visualização das relações entre ideias, o que contribui diretamente para a clareza argumentativa na redação.

    Etapa 2: Construção da tese e do projeto de texto

    Definir um ponto de vista claro e coerente é a base para um bom texto dissertativo-argumentativo. Essa tese deve ser explícita logo na introdução e sustentada ao longo de todo o texto. Como ensina Menegassi (2010), a clareza argumentativa exige planejamento. A escrita improvisada, sem organização prévia, tende a resultar em textos incoerentes ou repetitivos.

    Por isso, é essencial que o professor incentive o uso de esboços de redação antes da versão final. Um modelo produtivo é o chamado “roteiro T.A.P.E.F” (Tese, Argumentos, Proposta de intervenção, Exemplos, Finalização), que permite ao aluno planejar o conteúdo de cada parágrafo de forma estruturada.

    Nessa etapa, também é possível trabalhar com exercícios de reformulação de teses confusas, identificação de ideias centrais e secundárias em exemplos reais e simulações de organização lógica do texto.

    Etapa 3: Desenvolvimento dos argumentos

    A argumentação é o coração do texto dissertativo. Ela deve ser construída com base em fatos, dados, exemplos, analogias e repertórios relevantes. É importante que cada parágrafo do desenvolvimento tenha uma ideia central clara, articulada com a tese e aprofundada por meio de justificativas.

    Para desenvolver essa competência, o professor pode utilizar estratégias como:

    • Estudo de casos sociais reais: análise de reportagens e documentários que exemplificam o problema abordado;

    • Aplicação de repertórios socioculturais: introdução de conceitos de filósofos, sociólogos e pensadores, como Bauman, Foucault, Paulo Freire, Simone de Beauvoir, entre outros, adaptados ao nível de ensino;

    • Produção de argumentos em duplas: cada grupo propõe um argumento e os demais devem apontar falhas ou reforços, promovendo o aprimoramento coletivo.

    Essa prática ajuda os estudantes a perceberem que o argumento não é apenas um enunciado de opinião, mas uma construção lógica sustentada por raciocínio crítico.

    Etapa 4: Coesão textual e fluidez

    A fluidez do texto está diretamente ligada à capacidade do aluno em conectar as ideias de forma orgânica. É aqui que entra a importância da coesão textual. Segundo Neves (2002), a coesão se dá por mecanismos de referência, substituição, elipse, conectores e sequências lógicas, que devem ser aplicados com intencionalidade e clareza.

    Em aula, o professor pode trabalhar com trechos desorganizados de textos para que os alunos reescrevam com coesão, bem como propor atividades de substituição lexical e inserção de conectores. Outra prática eficiente é o “texto sem conectores”: o estudante recebe um parágrafo sem nenhum operador argumentativo e deve inserir os conectores adequados, justificando suas escolhas.

    Além disso, é possível fazer oficinas de reescrita, nas quais os alunos analisam redações reais (como as disponíveis nas cartilhas do Enem) e identificam os recursos coesivos empregados.

    Etapa 5: Elaboração da proposta de intervenção

    A proposta de intervenção é um diferencial da redação do Enem e exige atenção especial nas aulas. Segundo a cartilha (BRASIL, 2023), a proposta deve conter cinco elementos: agente, ação, modo de execução, efeito e detalhamento.

    Para praticar essa competência, é útil aplicar o exercício do “P.A.M.E.D” (Pessoa, Ação, Meio, Efeito, Detalhe), que ajuda o estudante a estruturar sua proposta de forma completa. Por exemplo:

    Pessoa (agente): Ministério da Saúde
    Ação: promover campanhas educativas
    Meio: veiculadas nas mídias sociais e escolas públicas
    Efeito: reduzir o preconceito sobre saúde mental
    Detalhe: com o apoio de psicólogos e influenciadores digitais

    Outra atividade interessante é a comparação entre propostas bem e mal formuladas. O professor pode apresentar duas versões de intervenção e pedir que os alunos identifiquem qual atende aos critérios exigidos e qual não o faz, explicando os motivos.

    Além disso, é essencial reforçar a importância de respeitar os direitos humanos na proposta. Propostas que incitem violência, intolerância ou discursos de ódio, mesmo que não explícitos, podem levar à anulação da redação.

    Etapa 6: Reescrita e avaliação colaborativa

    A escrita é um processo. Por isso, o estímulo à reescrita é fundamental. O estudante precisa perceber que revisar e refazer fazem parte do processo de aprimoramento textual. Como destaca Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004), a reescrita favorece a aprendizagem efetiva porque permite refletir sobre o próprio texto e sobre os critérios que orientam sua produção.

    A correção colaborativa – com grupos de estudantes analisando produções uns dos outros – também é uma excelente estratégia. A socialização das produções escritas, seguida de feedback orientado, promove a autonomia e o senso crítico.

    Aula sobre redação – Práticas avaliativas e organização do ensino de redação

    Uma aula sobre redação eficaz deve integrar momentos de aprendizado, produção, correção, revisão e avaliação contínua. Isso significa abandonar a lógica da redação como “produto final” e assumi-la como um “processo formativo”. Assim, ao longo do ano letivo, o estudante precisa ser acompanhado com regularidade, por meio de devolutivas construtivas, intervenções pedagógicas e estratégias que o auxiliem a avançar em cada uma das competências exigidas no Enem.

    Aula sobre redação – Avaliação diagnóstica e contínua

    A primeira etapa para um planejamento bem-sucedido das aulas de redação é a aplicação de uma avaliação diagnóstica. Esse instrumento permite identificar as principais dificuldades da turma e traçar metas de aprendizagem específicas. Com base nos dados coletados, o professor pode estabelecer prioridades: se muitos alunos têm dificuldades com a estrutura argumentativa, por exemplo, o foco inicial poderá ser a construção do projeto de texto.

    Durante o ano, avaliações periódicas (mensais ou bimestrais) devem ser realizadas para monitorar o progresso dos estudantes. O ideal é que essas avaliações não se limitem à atribuição de notas, mas venham acompanhadas de uma análise criteriosa da redação, com destaque para pontos fortes, aspectos a melhorar e sugestões de reescrita. Conforme Dolz et al. (2004), a avaliação formativa transforma o erro em oportunidade de aprendizagem.

    Aula sobre redação – Correção comentada por competência

    Uma das formas mais eficazes de avaliação é o uso das rubricas da cartilha do Enem (BRASIL, 2023), que discriminam os níveis de desempenho em cada uma das cinco competências. Ao apresentar essas rubricas aos alunos, o professor favorece a compreensão dos critérios e estimula a autonomia dos estudantes na autoavaliação.

    Durante a devolutiva, é recomendável que o professor aponte a nota estimada para cada competência, explique os motivos e sugira reescritas parciais. Uma prática enriquecedora é a correção comentada em sala, com leitura de trechos exemplares e discussão coletiva sobre como melhorar a coesão, aprofundar a argumentação ou tornar a proposta de intervenção mais concreta.

    Essa prática estimula o pensamento metacognitivo do aluno, isto é, sua capacidade de refletir sobre o próprio processo de produção textual. Segundo Scallon (2008), uma avaliação de qualidade é aquela que informa, orienta e desafia o estudante a avançar em sua trajetória.

    Aula sobre redação – Portfólios e autoavaliação

    Outra estratégia valiosa é a construção de portfólios individuais. O portfólio é uma coletânea de redações produzidas pelo aluno ao longo do ano, acompanhadas por registros reflexivos. Nele, o estudante pode observar sua evolução, identificar seus padrões de erro e perceber sua progressiva apropriação das competências exigidas.

    O portfólio permite ao professor e ao aluno uma visão longitudinal da aprendizagem, favorecendo intervenções mais precisas e personalizadas. Além disso, promove o protagonismo discente, pois valoriza o esforço e a superação, e não apenas o desempenho imediato.

    Paralelamente, a autoavaliação deve ser incentivada. Ao revisar sua própria produção com base em uma matriz ou checklist, o aluno se torna mais consciente do que já domina e do que precisa melhorar. Essa prática fortalece o papel ativo do estudante no processo de aprendizagem.

    Aula sobre redação – Simulados e redações com tempo controlado

    Em preparação ao Enem, é essencial que os estudantes sejam expostos a simulações reais da prova. A redação sob tempo cronometrado (1h a 1h30) ajuda a desenvolver estratégias de planejamento textual, controle de ansiedade e tomada de decisão rápida.

    Além disso, simular a situação de prova permite avaliar se o aluno está conseguindo cumprir todos os elementos exigidos, como:

    • Tese clara na introdução;

    • Dois ou mais parágrafos argumentativos bem articulados;

    • Proposta de intervenção completa;

    • Uso adequado da norma-padrão e dos recursos coesivos.

    Após os simulados, é fundamental oferecer devolutivas rápidas e detalhadas, para que os estudantes consigam revisar e aprender com suas produções. A prática frequente com simulações contribui diretamente para a melhoria do desempenho e da autoconfiança.

    Aula sobre redação -proposta de cronograma anual de ensino da redação

    Abaixo, segue uma sugestão de cronograma didático para um ano letivo de ensino médio, considerando uma aula semanal de redação com carga horária de 50 a 100 minutos:

     

    Mês Conteúdo principal Atividades sugeridas
    Fevereiro Diagnóstico e introdução ao texto dissertativo Redação diagnóstica, leitura de temas, rodas de conversa
    Março Estrutura do texto: introdução, desenvolvimento e conclusão Aulas expositivas, mapas mentais, produção de parágrafos
    Abril Argumentação e repertório sociocultural Análise de textos exemplares, debates temáticos, redações parciais
    Maio Coesão e coerência textual Oficinas de conectores, reformulação de parágrafos, reescritas
    Junho Proposta de intervenção Exercícios com a estrutura P.A.M.E.D, análise de propostas incompletas
    Julho Simulado I Redação completa com tempo cronometrado, correção comentada
    Agosto Temas contemporâneos e interdisciplinaridade Produção orientada com temas variados, uso de dados e citações
    Setembro Avaliação formativa e revisão de competências Autoavaliação, construção de portfólios, debates sobre direitos humanos
    Outubro Simulado II Redação completa, com matriz de correção, discussão de estratégias
    Novembro Intensivo de redação: temas anteriores do Enem Produção de redações com foco em repertório e organização textual
    Dezembro Avaliação final e apresentação do portfólio Apresentação de progresso individual, plano de estudos para revisão

    Este cronograma é flexível e pode ser adaptado conforme a realidade escolar, o calendário letivo e o nível da turma. O mais importante é manter a constância e a progressividade, criando um ambiente de escrita contínua e significativa.

    Considerações finais: formar escritores, formar cidadãos

    A aula sobre redação ultrapassa os limites da gramática normativa ou da estrutura textual. Trata-se, em sua essência, de um espaço pedagógico privilegiado para o exercício da reflexão, da empatia, da escuta e da crítica. Ensinar a escrever é também ensinar a pensar, a argumentar, a se posicionar no mundo – e, por isso, está no cerne da formação cidadã.

    A redação exigida no Enem, com seu formato dissertativo-argumentativo e sua proposta de intervenção social, reforça a importância de um ensino comprometido com os valores democráticos, com os direitos humanos e com a formação de sujeitos ativos e conscientes. Como destaca a cartilha (BRASIL, 2023), a redação não é apenas uma prova de língua portuguesa, mas uma avaliação de competências cognitivas, sociais e éticas.

    A escrita como construção coletiva

    A prática da escrita deve ser compreendida como um processo em constante construção. Ao longo da vida escolar, o estudante precisa ser estimulado a escrever com regularidade, a ler criticamente, a planejar seus textos, a argumentar com fundamento e a revisar suas próprias produções. Esse percurso formativo exige a mediação do professor, mas também a criação de uma comunidade de aprendizagem em que todos os sujeitos possam interagir, dialogar e crescer juntos.

    Como defendem Bakhtin e Volochinov (2006), todo ato de linguagem é um ato social. Assim, o texto não nasce isolado, mas em meio a uma rede de discursos, valores, ideologias e sentidos. A aula sobre redação, portanto, deve ser um espaço dialógico, em que o estudante aprenda a ouvir e a ser ouvido, a reconhecer os múltiplos pontos de vista e a defender o seu com responsabilidade.

    O papel do professor: mediador e formador

    O professor de redação é mais do que um corretor de textos: é um mediador de sentidos, um formador de consciências. Sua atuação exige conhecimento técnico, sensibilidade pedagógica e compromisso com a aprendizagem significativa. Cabe a ele criar condições para que o aluno se aproprie das competências necessárias à produção textual, mas também para que compreenda o papel social e político da escrita.

    Nesse processo, a escuta ativa e a valorização das trajetórias dos estudantes são fundamentais. Muitos chegam ao ensino médio com insegurança diante da escrita, associando-a ao erro, à punição ou à exclusão. Por isso, o professor precisa construir uma relação Fortune Tigerde confiança e encorajamento, mostrando que escrever é um direito, e não um privilégio de poucos.

    A construção de uma didática da redação que seja inclusiva, crítica e emancipadora passa, também, pela valorização das diferentes vozes presentes na sala de aula. É preciso reconhecer os saberes dos estudantes, suas vivências, suas referências culturais e suas formas de expressar-se. Como lembra Paulo Freire (1996), ensinar exige respeito aos saberes dos educandos.

    Redação como ferramenta de transformação

    Ao escrever, o estudante organiza seu pensamento, ressignifica experiências, interpreta o mundo e projeta possibilidades de ação. A proposta de intervenção, exigida na redação do Enem, é uma metáfora potente para esse gesto de transformação: é quando o aluno, ao final de sua argumentação, se pergunta o que pode ser feito para mudar a realidade que analisa.

    Esse exercício de pensar soluções, de propor alternativas e de imaginar novos cenários é, sem dúvida, um dos maiores ganhos da aula de redação. Ele mobiliza a criatividade, a empatia e a cidadania. E é justamente por isso que a escola não pode tratar a produção textual apenas como um treinamento para o vestibular, mas como parte integrante da formação integral do ser humano.

    Caminhos para fortalecer o ensino da redação

    Para que as aulas de redação sejam, de fato, transformadoras, algumas ações podem ser destacadas como prioritárias:

    • Integração entre leitura, escrita e oralidade: trabalhar a produção textual em articulação com atividades de escuta, debate, interpretação e análise crítica de discursos.

    • Formação continuada dos professores: investir na atualização docente sobre as exigências do Enem, metodologias ativas, avaliação formativa e competências socioemocionais.

    • Ambientes de escrita colaborativa: criar oficinas, blogs escolares, jornais, murais e outras plataformas para que os alunos publiquem e socializem suas produções.

    • Valorização do processo, e não apenas do produto: reconhecer o esforço, a evolução e a autoria dos estudantes em vez de focar unicamente na nota da redação.

    • Trabalho interdisciplinar: relacionar temas da redação com conteúdos de história, sociologia, filosofia, geografia e ciências, ampliando o repertório e o pensamento crítico.

    A aula sobre redação é, portanto, uma poderosa ferramenta de humanização, expressão e emancipação. Ao dominar a palavra escrita, o estudante ganha voz, ganha espaço e ganha poder. E, como educadores, cabe-nos o desafio e o privilégio de guiá-los nesse caminho.

    • BAKHTIN, Mikhail; VOLOCHINOV, Valentin. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec, 2006.

    • BRASIL. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). A Redação do Enem 2023: cartilha do participante. Brasília: Inep/MEC, 2023.

    • FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

    Aula sobre redação

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    Aula sobre redação

  • Tarefa de casa como ação transformadora: 4 considerações

    Tarefa de casa como ação transformadora: 4 considerações

    Tarefa de casa: um conceito em disputa

    A tarefa de casa (TC), elemento recorrente do cotidiano escolar, ocupa um lugar ambivalente nas práticas pedagógicas: ora é valorizada como instrumento de reforço de aprendizagem, ora criticada por reproduzir modelos pedagógicos tradicionais descontextualizados. A presente discussão visa compreender seu papel a partir de uma abordagem crítica e dialética da educação, com fundamento na Psicologia Histórico-Cultural (THC) e na Pedagogia Histórico-Crítica (PHC), perspectivas que enfatizam a formação do pensamento teórico como objetivo central da atividade educativa.

    Historicamente, a tarefa de casa foi concebida como meio de fixação do conteúdo escolar, estando intrinsecamente relacionada a práticas pedagógicas marcadas pela repetição e memorização. Essa concepção, segundo Nogueira (2002), ancora-se na tradição liberal da educação, que considera o sucesso escolar como mérito individual, desconsiderando as desigualdades de acesso ao saber sistematizado.

    Autores como Libâneo (1994) reconhecem que a TC pode cumprir papel didático relevante quando associada à consolidação do que é aprendido em sala de aula, mas alertam para os riscos de seu uso mecânico. Para Libâneo, a TC, entendida como extensão do período escolar, deve ser integrada ao projeto pedagógico da escola e não tratada como responsabilidade exclusiva do estudante ou de sua família.

    A crítica contemporânea ao uso irrefletido da tarefa de casa encontra amparo em estudos como o de Carvalho (2006), que discute sua função como instrumento de avaliação informal e extensão da escola para dentro do lar, muitas vezes transferindo às famílias responsabilidades que caberiam à instituição escolar. Ao analisar a TC sob essa ótica, evidencia-se que ela pode reproduzir desigualdades sociais ao exigir condições objetivas de estudo fora da escola que não estão ao alcance de todos.

    Contudo, a TC não precisa ser descartada. Ao contrário, pode ser ressignificada à luz de uma concepção pedagógica comprometida com o desenvolvimento integral dos sujeitos. A Teoria Histórico-Cultural, formulada por Vygotsky e aprofundada por Leontiev e Davidov, propõe compreender a aprendizagem como processo mediado socialmente, no qual a apropriação dos conteúdos científicos promove o desenvolvimento psíquico. Nessa perspectiva, o papel da TC não é o de reforçar conteúdos por memorização, mas o de integrar-se à atividade de estudo que mobiliza o estudante em direção à formação do pensamento teórico (Davidov, 1988).

    A articulação entre a THC e a PHC, ambas ancoradas no materialismo histórico-dialético, permite compreender a tarefa de casa como ação inserida no movimento histórico de transformação da realidade. Conforme Saviani (2011), a função clássica da escola é a transmissão sistemática do saber elaborado, e é nesse horizonte que a TC deve ser pensada: como parte do processo de apropriação da cultura acumulada pela humanidade, contribuindo para a humanização e emancipação dos estudantes.

    Nesse sentido, a tarefa de casa adquire novos contornos quando situada como parte da atividade de estudo, ou seja, não mais como instrumento de punição ou avaliação disfarçada, mas como atividade que, ao mobilizar o estudante para o conhecimento científico, contribui para o seu desenvolvimento. Para isso, no entanto, é necessário que ela esteja orientada por objetivos pedagógicos consistentes e contextualizados, que considerem as condições reais dos sujeitos implicados.

    Leontiev (1983) propôs uma teoria da atividade humana segundo a qual a ação educativa deve estar ancorada em motivos concretos e em necessidades reais, construídas historicamente. A tarefa de casa, sob essa ótica, só tem sentido se vinculada a um objetivo formativo e se puder ser integrada às experiências do estudante, conectando o saber escolar à vida cotidiana e à realidade social. Como afirmam Pasqualini e Abrantes (2016), é o professor, por meio de sua base orientadora, que deve mediar essa construção de sentido.

    Dessa forma, resgatar a tarefa de casa como ação de estudo significa romper com práticas mecânicas e instrumentalizadas e assumir uma concepção pedagógica comprometida com a formação plena dos sujeitos. A TC deve contribuir para o desenvolvimento de capacidades cognitivas superiores, como a abstração, a generalização e a reflexão crítica, elementos fundamentais para a constituição do pensamento teórico. Esse é o desafio que se coloca à prática pedagógica contemporânea.

    A tarefa de casa e a formação do pensamento teórico

    A ressignificação da tarefa de casa no contexto escolar exige compreender sua inserção na estrutura da atividade humana, conforme delineado por Leontiev (1983). Na Teoria da Atividade, as ações só adquirem pleno valor quando orientadas por um motivo concreto que, por sua vez, emerge de uma necessidade historicamente construída. Assim, uma tarefa apenas faz sentido quando conecta-se à realidade do sujeito que a realiza, possibilitando-lhe apropriar-se ativamente do conhecimento.

    Segundo Elkonin (1987), o desenvolvimento psíquico da criança passa por etapas determinadas pela atividade que domina cada fase. Na idade escolar, essa atividade é o estudo, cujo objetivo é a formação do pensamento teórico. Tal concepção é reforçada por Davidov (1988), que defende que a atividade de estudo permite a internalização de conceitos científicos, estruturando formas superiores de pensamento e ampliando as capacidades cognitivas do estudante.

    A tarefa de casa, ao integrar essa atividade, pode favorecer a autonomia intelectual, o senso de responsabilidade e a autorregulação dos estudos. Contudo, isso somente ocorre se a TC for pensada como ação de estudo com finalidade formativa e não como repetição automatizada. Asbahr (2016) ressalta que a TC é uma das ações que compõem a atividade de estudo, juntamente com a leitura, a escrita reflexiva e a realização de exercícios orientados, desde que seu objetivo seja promover a mediação entre o conteúdo e a realidade vivida pelo estudante.

    Em seu estudo, Asbahr (2014) discute o papel do sentido pessoal e da significação social na formação do motivo para a ação de estudo. O sentido não nasce do conteúdo em si, mas da relação que o estudante estabelece com ele, quando reconhece sua utilidade e pertinência em sua trajetória formativa. A TC, nesse contexto, passa a ser vista não como mera obrigação escolar, mas como possibilidade de transformação de si mesmo através do conhecimento.

    Davidov e Markova (1987) destacam que a atividade de estudo pressupõe a criação de motivos que impulsionem o estudante a realizar ações voltadas para a apropriação consciente do saber. É nesse movimento que a tarefa de casa pode atuar como produtora de motivos de aprendizagem, desde que planejada com intencionalidade pedagógica e articulada a um projeto educativo que vise ao desenvolvimento pleno do estudante.

    Ainda que a TC seja frequentemente criticada por reforçar desigualdades – quando aplicada de forma mecânica e descolada do contexto de vida dos alunos –, é preciso reconhecer seu potencial enquanto prática pedagógica significativa. Quando bem planejada e integrada à proposta curricular, pode mobilizar os estudantes para além da repetição de conteúdos, estimulando a curiosidade, o espírito investigativo e a autonomia na busca pelo conhecimento.

    No entanto, esse processo não ocorre espontaneamente. Como apontam Eidt e Duarte (2007), os motivos e interesses para a aprendizagem não são inatos, mas são socialmente construídos. A criança não nasce com desejo natural de estudar; ela precisa ser conduzida a descobrir o valor do conhecimento. Essa tarefa cabe à escola, que, por meio de sua mediação, deve transformar o conteúdo escolar em algo relevante para a formação do estudante.

    É nesse ponto que a figura do professor se torna central. Conforme enfatizam Pessoa e Leonardo (2020), a forma como o docente vivencia seu papel e organiza suas ações de ensino interfere diretamente na apropriação dos conteúdos escolares pelos estudantes. A TC, nesse contexto, deve ser fruto de uma prática docente reflexiva, intencional e sensível às particularidades dos alunos.

    Gasparin (2003) argumenta que o processo pedagógico deve partir de situações-problema que instiguem o raciocínio e mobilizem o estudante a buscar respostas. A tarefa de casa pode ser um meio privilegiado para propor tais situações, desde que seja planejada para promover o raciocínio autônomo, o pensamento abstrato e a capacidade de estabelecer relações entre o conhecimento e a vida.

    Isso significa que a TC precisa ir além da simples cópia de exercícios ou da repetição de fórmulas. Ela deve colocar o estudante em movimento intelectual, desafiá-lo a pensar, a investigar, a argumentar. Quando isso acontece, a tarefa de casa deixa de ser um fardo para se tornar uma ação significativa, capaz de promover a aprendizagem consciente e a formação de sujeitos críticos e criativos.

    A tarefa de casa deve ser, portanto, um instrumento a serviço da formação omnilateral do estudante. Segundo Saviani (2008), a educação escolar deve proporcionar o acesso aos conhecimentos historicamente produzidos, articulando o saber sistematizado às necessidades reais dos sujeitos. A TC, nesse horizonte, pode contribuir para a formação do “cidadão histórico”, capaz de compreender e transformar sua realidade por meio do saber.

    Assim, ao ser concebida como ação de estudo, a tarefa de casa deixa de ser um simples apêndice do trabalho em sala de aula e passa a integrar o processo educativo em sua totalidade. Cabe ao professor, nesse processo, criar situações didáticas desafiadoras, mediadas por objetivos claros e vinculadas a projetos de formação crítica e emancipatória.

    Tarefa de casa e o desenvolvimento da autonomia e da auto-organização dos estudantes

    Quando a tarefa de casa é compreendida como ação integrante da atividade de estudo, seu potencial pedagógico se amplia, permitindo que ela atue diretamente na formação da autonomia e da auto-organização dos estudantes em relação aos seus estudos. Trata-se de uma mudança significativa na maneira como a escola compreende e utiliza esse recurso, deslocando-o de uma perspectiva tradicional, centrada na repetição e memorização, para uma abordagem que valoriza o protagonismo do estudante na apropriação do conhecimento.

    Leontiev (1983) afirma que toda ação humana é motivada por necessidades, que são historicamente construídas e socialmente mediadas. No caso da atividade de estudo, a necessidade de conhecer, de se apropriar do saber científico, não é espontânea: precisa ser formada no decorrer da escolarização. É nesse processo que a tarefa de casa pode se tornar um instrumento decisivo. Ao ser estruturada de maneira a suscitar o interesse, o questionamento e a reflexão, ela contribui para o desenvolvimento de motivos internos para o estudo, favorecendo a organização voluntária da conduta do estudante.

    A auto-organização para os estudos, como destaca Asbahr (2016), é uma das expressões mais importantes da maturidade escolar. Ao realizar tarefas de casa que exigem planejamento, levantamento de hipóteses, análise de informações e elaboração de conclusões, o estudante se exercita no controle de suas ações cognitivas, desenvolvendo a capacidade de gerenciar o próprio processo de aprendizagem. A autonomia, nesse caso, não é concebida como um dom inato, mas como um produto da ação pedagógica intencional.

    Essa concepção é reforçada por Pasqualini e Abrantes (2016), ao afirmarem que a atividade de estudo é resultado da atividade orientadora do professor. É ele quem deve criar situações educativas que provoquem o estudante a pensar, duvidar, investigar. A TC, como uma dessas situações, deve ser cuidadosamente planejada para desencadear processos mentais complexos e promover a internalização dos conteúdos escolares.

    No exemplo proposto por Feitosa e Barroco (2024), ao solicitar que estudantes meçam objetos do cotidiano para compreender conceitos de massa e comprimento, o professor não apenas propõe uma tarefa com significado prático, mas também incentiva o estudante a mobilizar operações mentais de comparação, análise e inferência. É nesse movimento que a TC adquire sentido e se transforma em ação de estudo.

    Ao reconhecer a tarefa de casa como portadora de potencial formativo, é necessário também superar a dicotomia entre conteúdo e experiência. A proposta não é instrumentalizar a vida cotidiana como conteúdo, nem reduzir o conhecimento científico a experiências subjetivas, mas sim integrar o saber sistematizado às experiências vividas pelo estudante. Isso exige do professor sensibilidade didática e domínio teórico para articular o conteúdo ao contexto sociocultural dos alunos, promovendo uma aprendizagem significativa.

    Duarte (2004) lembra que o processo educativo, na perspectiva histórico-cultural, ocorre por meio da internalização de significações sociais, que são produzidas coletivamente ao longo da história. A tarefa de casa, nesse sentido, deve possibilitar que o estudante se aproprie dessas significações, compreendendo o conteúdo como uma construção humana e, portanto, passível de ser recriada, interpretada e transformada.

    Ao se apropriar do conhecimento por meio da TC, o estudante amplia sua capacidade de abstração e generalização, habilidades fundamentais para o pensamento teórico. Esse tipo de pensamento, segundo Davidov (1988), é caracterizado pela capacidade de compreender a essência dos fenômenos, de ir além da aparência imediata e de formular conceitos universais a partir de dados particulares. A TC, ao promover a mobilização do pensamento teórico, cumpre uma função fundamental na escolarização: a formação de sujeitos intelectualmente autônomos.

    Por outro lado, não se pode desconsiderar que a tarefa de casa também pode produzir efeitos negativos quando utilizada de forma inadequada. O uso excessivo, descontextualizado e punitivo da TC pode gerar sentimentos de ansiedade, desmotivação e fracasso escolar. Como destacam Soares (2017) e Carvalho (2006), muitas vezes a TC é vivida pelos estudantes como um fardo, uma obrigação mecânica e pouco significativa. Nesses casos, ela deixa de cumprir sua função pedagógica e contribui para o afastamento do estudante da aprendizagem.

    Por isso, o planejamento da TC deve considerar não apenas os objetivos pedagógicos, mas também as condições concretas dos estudantes: tempo disponível, ambiente de estudo, apoio familiar, acesso a recursos didáticos. A democratização do acesso ao saber pressupõe o reconhecimento das desigualdades sociais e a adoção de práticas pedagógicas que busquem superá-las, e não acentuá-las.

    Nesse contexto, é relevante pensar na articulação entre família e escola. Embora a tarefa de casa seja uma responsabilidade do estudante, o envolvimento da família pode contribuir para a criação de um ambiente favorável ao estudo, desde que esse envolvimento não reproduza a lógica meritocrática da responsabilização individual. Como afirma Carvalho (2004), é papel da escola orientar as famílias quanto à função formativa da TC, fortalecendo o vínculo entre os sujeitos que compartilham o processo educativo.

    Nogueira (2002) adverte que, para que a tarefa de casa deixe de ser uma violência consentida e passe a ser uma prática pedagógica significativa, é necessário que ela esteja orientada por um projeto educativo coerente, que reconheça a centralidade do ensino na formação humana. A TC não é, por si só, boa ou má: sua qualidade pedagógica depende da intencionalidade com que é planejada e da mediação com que é realizada.

    Ao final deste bloco, reforça-se que a tarefa de casa, compreendida como ação de estudo, pode atuar como fator de desenvolvimento da autonomia intelectual e da auto-organização dos estudantes, desde que esteja alinhada aos princípios da educação emancipadora. Cabe à escola, e em especial ao professor, construir caminhos que possibilitem à TC cumprir esse papel, contribuindo para a formação de sujeitos críticos, autônomos e capazes de se apropriar do conhecimento como instrumento de transformação da realidade.

    O papel do professor na mediação da tarefa de casa como ação formadora

    Para que a tarefa de casa desempenhe seu papel formativo e se configure como ação de estudo, é indispensável que o professor assuma uma função mediadora ativa. Na perspectiva da Pedagogia Histórico-Crítica, conforme propõe Saviani (2011), o ensino não é apenas um meio para a transmissão de conteúdos, mas um processo intencional de mediação entre o conhecimento sistematizado e o sujeito que o apreende. Nesse processo, a tarefa de casa não é um apêndice do trabalho pedagógico, mas uma extensão orientada da atividade docente, devendo estar articulada ao planejamento didático, aos objetivos da aprendizagem e ao contexto social do educando.

    A mediação do professor na construção de ações de estudo implica considerar tanto o conteúdo quanto a forma como ele é proposto. Isso significa que a TC deve ser elaborada com clareza de objetivos, com atenção às possibilidades concretas dos estudantes, e com estratégias que incentivem o engajamento crítico. Conforme Pasqualini e Eidt (2016), a ação pedagógica deve considerar a etapa de desenvolvimento da criança, respeitando sua capacidade de operar com o simbólico e o abstrato, sem reduzir o conteúdo à experiência imediata, mas mediando a relação entre o concreto e o conceito científico.

    Ao elaborar uma tarefa de casa, o professor precisa considerar os elementos centrais da estrutura da atividade: o motivo, a ação e a operação (Leontiev, 1983). A TC deve partir de um motivo real, socialmente construído, que desperte no estudante o interesse pela aprendizagem. Esse motivo é transformado em ação, que deve ter um objetivo definido – por exemplo, compreender um conceito, resolver um problema, interpretar uma situação –, e, por fim, deve apresentar operações adequadas, isto é, meios coerentes com os objetivos e as condições dos estudantes.

    Essa estrutura permite ao professor organizar tarefas que vão além da simples repetição e memorização. A proposta pode ser instigante, desafiadora e significativa. Por exemplo, ao trabalhar o conceito de desigualdade social em uma aula de Sociologia, o professor pode propor como tarefa de casa que o estudante entreviste familiares ou vizinhos sobre suas experiências com acesso à saúde ou educação, sistematize as respostas e relacione os dados a conceitos vistos em sala. Essa tarefa mobiliza habilidades cognitivas e sociais, articula teoria e prática e promove o engajamento com o conteúdo.

    Como bem observa Gasparin (2003), o processo pedagógico deve partir de situações-problema que instiguem o pensamento e conduzam o estudante à elaboração de sínteses. A tarefa de casa, nesse sentido, pode ser uma poderosa aliada na problematização da realidade, desde que estruturada para provocar o pensamento crítico e fomentar o diálogo com os conteúdos científicos.

    Além disso, é fundamental que o professor valorize o retorno da tarefa de casa em sala de aula. A devolutiva não deve ser apenas correção de erros, mas momento de sistematização do conhecimento, de escuta ativa e de diálogo entre os estudantes e os saberes construídos. Como apontam Davidov e Markova (1987), a aprendizagem não se encerra na realização da ação, mas no retorno reflexivo sobre ela. Assim, a correção e discussão das tarefas devem ser compreendidas como parte constitutiva da atividade de estudo.

    Outro aspecto relevante da mediação docente é o acompanhamento contínuo. A tarefa de casa não deve ser uma atividade delegada ao acaso, mas acompanhada em seu processo e resultado. Professores atentos ao percurso de seus estudantes conseguem identificar dificuldades, propor intervenções oportunas e adaptar suas estratégias pedagógicas. Isso exige planejamento, sensibilidade e compromisso com a aprendizagem real e significativa.

    A concepção da tarefa de casa como ação de estudo também desafia o professor a refletir sobre sua própria formação. Conforme defende Martins (2013), a formação docente precisa estar ancorada em fundamentos epistemológicos e filosóficos coerentes com uma educação transformadora. O domínio técnico-pedagógico, ainda que necessário, não basta. É preciso compreender a natureza do conhecimento, os processos de desenvolvimento psíquico e as implicações sociais do trabalho educativo.

    A proposta de uma tarefa de casa significativa exige do professor o domínio da ciência que ensina e também uma leitura crítica da realidade dos seus alunos. O conhecimento pedagógico deve ser articulado ao conhecimento do mundo vivido pelos estudantes, criando pontes entre o conteúdo e a realidade concreta. Isso requer um professor pesquisador, reflexivo, criativo e comprometido com a formação de sujeitos capazes de transformar sua realidade.

    Essa mediação, conforme discutem Pessoa e Leonardo (2020), é também afetiva e simbólica. O sentido que o estudante atribui à tarefa depende, em grande medida, da relação que estabelece com o professor. Se este valoriza o esforço, reconhece o progresso e incentiva o pensamento autônomo, cria condições para que o estudante desenvolva um sentido pessoal positivo em relação ao estudo. Esse aspecto, muitas vezes negligenciado, é essencial para que a tarefa de casa se torne parte da formação integral do sujeito.

    A escola, enquanto instituição social, tem o dever de criar essas condições, mas é no cotidiano da sala de aula que se concretizam ou se negam essas possibilidades. A tarefa de casa, nesse contexto, não pode ser pensada de forma isolada, mas deve estar inserida em um projeto educativo mais amplo, que articule ensino, pesquisa e extensão, conforme os princípios da pedagogia crítica.

    A criação de ambientes colaborativos também pode potencializar o uso da tarefa de casa como ação de estudo. Propostas como projetos de pesquisa, portfólios, diários de aprendizagem e fóruns virtuais possibilitam que a TC extrapole os limites da disciplina e da sala de aula, promovendo o trabalho em equipe, o diálogo entre saberes e o protagonismo estudantil. Esses dispositivos, aliados à intencionalidade pedagógica, transformam a TC em ação de formação integral.

    Ao assumir essa postura, o professor contribui não apenas para o desempenho escolar de seus estudantes, mas para sua constituição enquanto sujeitos históricos, críticos e criadores. A TC deixa de ser um simples dever e se transforma em um espaço-tempo de exercício da liberdade responsável, do pensar autônomo e da construção da identidade intelectual.

    Considerações finais

    A tarefa de casa, frequentemente banalizada nas práticas escolares, revela-se, à luz da Teoria Histórico-Cultural e da Pedagogia Histórico-Crítica, um poderoso instrumento formativo, desde que compreendida e estruturada como uma ação da atividade de estudo. Mais do que mero exercício de fixação, ela deve ser pensada como parte do processo intencional de apropriação do saber sistematizado, promovendo o desenvolvimento das capacidades intelectuais superiores e contribuindo para a formação de sujeitos críticos, autônomos e socialmente conscientes.

    A trajetória histórica da tarefa de casa mostra como suas formas e sentidos foram moldados por diferentes projetos pedagógicos e interesses ideológicos. Da sua origem no contexto da pedagogia tradicional, centrada na memorização e na disciplina, até seu quase abandono pelos defensores da Escola Nova, a TC oscilou entre ser vilã e redentora. No entanto, conforme argumenta Saviani (2011), a superação dessas polarizações exige uma pedagogia crítica, que compreenda a educação como processo de humanização e não como simples transmissão de conteúdos ou espontaneísmo metodológico.

    Feitosa e Barroco (2024) mostram que a TC, ao ser planejada com base na atividade de estudo, pode desempenhar papel central no desenvolvimento psíquico do estudante. Nesse contexto, é papel do professor propor tarefas que tenham sentido pessoal e significação social, isto é, que dialoguem com os interesses e experiências dos estudantes, mas que também promovam sua inserção crítica no mundo da cultura e da ciência. Essa articulação entre a vida cotidiana e o saber sistematizado é essencial para que o conhecimento escolar se torne elemento constitutivo da identidade dos sujeitos aprendentes.

    A formação da autonomia e da auto-organização dos estudantes não é um processo espontâneo, tampouco um dom natural. É, como afirmam Duarte (2004) e Asbahr (2016), resultado de uma prática pedagógica intencional, mediada, planejada, sustentada por objetivos claros e fundamentos teóricos consistentes. A TC, nesse cenário, contribui para que o estudante construa relações conscientes com o saber, mobilize estratégias cognitivas complexas e desenvolva o pensamento teórico, conforme defendido por Davidov (1988).

    Todavia, para que a tarefa de casa cumpra essa função, é necessário romper com práticas escolares fragmentadas, burocráticas e desprovidas de reflexão pedagógica. A TC precisa ser reconfigurada como parte do currículo escolar, planejada coletivamente, articulada às diretrizes de ensino e ao projeto político-pedagógico da escola. Mais do que isso, deve ser assumida como expressão do compromisso ético e político da escola com a formação omnilateral do ser humano.

    Essa reconfiguração exige também repensar a formação docente. Como lembra Martins (2013), não basta capacitar o professor para aplicar técnicas; é preciso formar educadores capazes de compreender o papel social da escola, o significado do conhecimento e as dinâmicas que constituem o desenvolvimento humano. Uma formação ancorada no materialismo histórico-dialético, que articule teoria e prática, é condição para que o professor compreenda a tarefa de casa como mais do que um instrumento didático: como uma ação político-pedagógica de transformação da realidade.

    Conclui-se, portanto, que a tarefa de casa, longe de ser um resquício arcaico ou um fardo imposto aos estudantes, pode ser ressignificada como instrumento de emancipação intelectual, desde que situada no interior de um projeto educativo crítico e transformador. Sua reinvenção exige compromisso com o ensino, respeito à infância e à adolescência, compreensão do desenvolvimento humano e, sobretudo, fé na capacidade dos estudantes de apropriar-se do saber e transformá-lo em prática consciente de liberdade.

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  • Aula sobre meio ambiente

    Aula sobre meio ambiente

    Para iniciar uma Aula sobre meio ambiente é preciso ter alguns pressupostos e noções em mente. O ensino médio é uma etapa crucial na formação cidadã dos jovens. É neste período que valores, identidades e posicionamentos ganham maior nitidez, abrindo espaço para reflexões que transcendam os limites da sala de aula e toquem diretamente na realidade cotidiana dos estudantes. Dentro desse contexto, promover uma aula sobre meio ambiente não deve ser apenas uma oportunidade para apresentar conceitos científicos, mas um ponto de partida para o exercício da criticidade, da empatia e da ação transformadora.

    O 1º Caderno do Professor – Ensino Médio, desenvolvido pela Secretaria de Educação do Pará, em parceria com o Instituto Iungo, propõe uma abordagem inovadora, contextualizada e profundamente engajada com os desafios atuais da educação ambiental. A partir da perspectiva da Amazônia e das juventudes amazônidas, o material constrói um percurso didático que integra ciência, cultura, história e cidadania, articulando teoria e prática em um ciclo de 10 horas, dividido em cinco situações de aprendizagem.

    Essa proposta vai ao encontro das diretrizes da BNCC, mobilizando competências gerais como o uso crítico e consciente dos saberes (CG1), o desenvolvimento do pensamento científico (CG2) e o exercício da argumentação ética com foco na sustentabilidade (CG7). Ao mesmo tempo, ela incorpora os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030 da ONU, com ênfase nos ODS 11 (Cidades e Comunidades Sustentáveis) e ODS 13 (Ação Contra a Mudança Global do Clima).

    A importância da educação ambiental no Ensino Médio em Aula sobre meio ambiente

    A educação ambiental é muito mais do que ensinar sobre reciclagem ou mudanças climáticas. Trata-se de um processo formativo contínuo que busca integrar conhecimentos, habilidades, valores e atitudes, com o objetivo de formar sujeitos capazes de refletir criticamente sobre sua relação com a natureza e com os outros seres humanos. Conforme definido na Declaração de Tbilisi (Unesco, 1977), a educação ambiental deve promover a percepção da interdependência entre os aspectos naturais e sociais do ambiente, visando à construção de uma nova ética planetária.

    No Brasil, a Lei nº 9.795/1999 estabeleceu a Política Nacional de Educação Ambiental e consolidou os princípios que norteiam esse campo do saber. Entre eles, destaca-se a valorização da diversidade cultural, a promoção da participação social e a articulação interdisciplinar. Isso significa que uma aula sobre meio ambiente precisa dialogar com diferentes áreas do conhecimento, respeitando os contextos socioculturais dos alunos e incentivando sua atuação como agentes de transformação.

    Situação de Aprendizagem 1: “Educação Ambiental: também estamos nesta história” para Aula sobre meio ambiente

    A proposta didática do Caderno do Professor inicia com uma situação de aprendizagem que convida os estudantes a refletirem sobre o que é educação ambiental e qual o seu papel na sociedade contemporânea. Trata-se de uma aula introdutória, com duração de duas aulas, que busca mobilizar o repertório prévio dos jovens e provocar o debate sobre emergências ambientais, história das conferências internacionais e possibilidades de atuação cidadã.

    A aula começa com um bate-papo instigante chamado “Educação ambiental tem a ver com…”. Por meio de frases provocativas, os estudantes são incentivados a tomar posicionamentos e justificá-los. Essa dinâmica cria um ambiente participativo e favorece o desenvolvimento da argumentação crítica. As frases propostas, como “Educação ambiental tem pouco a ver com questões individuais” ou “Educação ambiental tem mais a ver com Biologia do que com outras matérias”, abrem margem para análises que ampliam a visão dos estudantes sobre a amplitude e a complexidade da temática ambiental.

    Durante essa atividade, é importante que o(a) professor(a) atue como mediador(a), incentivando a reflexão e promovendo conexões com o cotidiano dos estudantes. Ao final, propõe-se que eles reformulem uma das frases discutidas, incorporando os conhecimentos construídos no debate. Essa estratégia estimula a autonomia intelectual e valoriza o protagonismo estudantil no processo de ensino-aprendizagem.

    Conexão com a realidade amazônica e os fóruns ambientais para Aula sobre meio ambiente

    Outro ponto central dessa etapa introdutória é a apresentação dos principais fóruns internacionais sobre meio ambiente, como a Conferência de Estocolmo (1972) e a Rio-92. Em vez de uma abordagem expositiva e enciclopédica, o material propõe que os estudantes compreendam esses eventos a partir de uma perspectiva crítica: os fóruns surgem muitas vezes como reação a desastres ambientais, e não como prevenção. Daí a importância de desenvolver uma educação ambiental propositiva, que antecipe os problemas e promova mudanças de comportamento individuais e coletivas.

    Nesse sentido, é fundamental contextualizar as emergências ambientais com exemplos locais e regionais. O Pará, por exemplo, tem vivenciado inúmeros conflitos socioambientais relacionados à mineração, à grilagem de terras e à degradação de ecossistemas. Ao mesmo tempo, o estado tem se destacado por iniciativas como o Programa Territórios pela Paz (TerPaz), que promove oficinas de educação ambiental com crianças e adolescentes em diferentes territórios da Grande Belém. Essas ações reforçam a ideia de que a Amazônia não é apenas vítima, mas também protagonista de soluções sustentáveis.

    Proposta de rotação por estações: uma metodologia ativa para Aula sobre meio ambiente

    Na segunda aula da situação de aprendizagem, o Caderno propõe uma metodologia ativa conhecida como “rotação por estações”. Os estudantes são divididos em pequenos grupos e passam por diferentes atividades temáticas, como:

    • Estação 1: O que são emergências ambientais?

    • Estação 2: Conferência de Estocolmo e o desastre de Minamata

    • Estação 3: Rio-92 e o desastre de Chernobyl

    Essa dinâmica favorece a aprendizagem colaborativa, o uso de recursos tecnológicos e a análise crítica de contextos históricos e ambientais. Além disso, permite que os estudantes façam conexões entre o passado e o presente, reconhecendo-se como parte ativa da construção de um futuro mais justo e sustentável.

    Ao final das atividades, realiza-se uma roda de conversa para sistematizar as aprendizagens e aprofundar as discussões. Algumas perguntas disparadoras sugeridas são: “Ainda acontecem emergências ambientais?”, “Como a educação ambiental pode evitar desastres?”, “Vocês se sentem parte da história ambiental do nosso planeta?”. Essas questões ajudam a consolidar os conhecimentos e a fortalecer o vínculo afetivo e ético com o meio ambiente.

  • Significado de 01/01: dia internacional da paz

    Significado de 01/01: dia internacional da paz

    Qual o significado de 01/01? O primeiro dia do ano, 1º de janeiro, é marcado por celebrações globais e, ao mesmo tempo, por uma profunda carga simbólica que ultrapassa o calendário civil. Desde 1968, essa data também é consagrada pela Igreja Católica como o Dia Mundial da Paz, representando um chamado universal à superação dos conflitos por meio do bem comum e da justiça. A mensagem proferida pelo Papa João Paulo II em 2005, cujo mote era “Não te deixes vencer pelo mal, vence antes o mal com o bem”, oferece elementos valiosos para uma análise geopolítica dessa celebração e da sua relação com o ordenamento internacional.

    A data de 01/01, nesse contexto, adquire um duplo significado: de um lado, representa a renovação simbólica do tempo; de outro, torna-se um marco político e diplomático de valores universais. Segundo o Papa João Paulo II (2005), a paz é o resultado de uma “árdua batalha”, vencida quando se enfrenta o mal com atitudes éticas, ações de justiça e amor social. Essa leitura coloca a paz como um processo ativo e não apenas como a ausência de guerra — perspectiva que dialoga diretamente com os conceitos contemporâneos de segurança humana na geopolítica.

    A Paz como Projeto Global e o significado de 01/01

    A paz, na leitura geopolítica, está diretamente vinculada à estabilidade das relações internacionais, à autodeterminação dos povos e ao respeito aos direitos humanos. Para autores como Fiori (2004), a geopolítica moderna exige considerar a paz não apenas como equilíbrio entre potências, mas como a construção de estruturas que sustentem a justiça internacional. Nessa direção, a mensagem papal de 01/01/2005 ecoa: “a única opção realmente construtiva é […] aborrecer o mal e aderir ao bem” (João Paulo II, 2005).

    Essa noção é reforçada pela visão da paz como “bem comum”, conforme o Concílio Vaticano II já havia destacado em “Gaudium et Spes” (n. 26), e que é reafirmada na mensagem papal. A paz não é monopólio de Estados ou organizações internacionais; ela é responsabilidade coletiva e exige uma ética global baseada na solidariedade entre as nações e na universalidade dos direitos.

    O Mal como Estratégia de Poder: Conflitos e Assimetrias e o significado de 01/01

    A reflexão geopolítica da mensagem também emerge da crítica ao “círculo vicioso do mal pelo mal”, expresso na violência armada, no terrorismo e na injustiça estrutural. O Papa denuncia explicitamente os conflitos que se perpetuam por ações de vingança, como o caso da Palestina, do Iraque e de diversas nações africanas. Para geógrafos políticos como Yves Lacoste (1993), a guerra e a violência são expressões diretas da geopolítica, pois revelam a disputa por espaço, recursos e controle simbólico do território.

    Nesse sentido, o significado de 01/01 extrapola a tradição religiosa para se tornar um marco estratégico no calendário diplomático: um momento de reafirmação da luta pelo bem global, em contraponto aos projetos hegemônicos que produzem desigualdade e exclusão. A mensagem papal pode, então, ser interpretada como um manifesto ético e geopolítico, pois convoca os líderes mundiais e os cidadãos a se posicionarem frente aos conflitos com ações de reconciliação e justiça.

    A Ética Cristã e a Ordem Mundial e o Significado de 01/01

    No centro da reflexão do Papa João Paulo II está a noção de que o mal “passa pela liberdade humana”, o que implica responsabilidade ética individual e coletiva. Isso remete diretamente à ideia de “poder normativo” nas relações internacionais, conceito trabalhado por Joseph Nye (2004), segundo o qual a influência global não se dá apenas por meios militares ou econômicos, mas também pela capacidade de disseminar valores e práticas legítimas.

    Assim, a mensagem de 01/01 pode ser compreendida como uma tentativa de reafirmar uma ética internacional alternativa ao realismo político, que historicamente dominou as relações entre Estados. A proposta cristã de “vencer o mal com o bem” pode ser lida como uma crítica à geopolítica da força e da dominação, oferecendo, em seu lugar, uma geopolítica da fraternidade, onde o poder está subordinado ao bem comum.

    O Bem Comum como Eixo da Geopolítica Solidária e o significado de 01/01

    Outro ponto crucial da mensagem papal é a articulação entre paz e bem comum. O Papa destaca que “quando em todos os níveis se cultiva o bem comum, cultiva-se a paz” (João Paulo II, 2005). A geopolítica do século XXI exige, de fato, uma nova gramática para as relações internacionais, centrada na interdependência entre os povos, no compartilhamento equitativo dos recursos e no combate às causas estruturais da pobreza.

    Autores como Milton Santos (2001) defendem a necessidade de uma globalização alternativa, fundada em um novo contrato moral entre os povos. A crítica ao “desenvolvimento desigual” e à marginalização de nações inteiras no sistema internacional está em consonância com o apelo do Papa por uma redistribuição justa dos bens da terra e dos frutos do progresso científico e tecnológico.

    Ao propor uma “mobilização moral e econômica” em escala planetária, a mensagem do Dia Mundial da Paz de 01/01/2005 adquire uma função geopolítica estratégica: ela convoca os Estados, as instituições financeiras internacionais e a sociedade civil global a reformular suas práticas com base na equidade, na solidariedade e na cooperação.

  • 4 Ways Technology Is Changing How We Learn

    4 Ways Technology Is Changing How We Learn

    Tech has changed how we learn in ways we didn’t think were possible.

    The way we learn is constantly changing. For example, we now use AI to help in more advanced ways. So, it’s better not to constrain its function to merely those basic tasks, but to explore its potential in enhancing learning, problem-solving, and decision-making processes across various fields.. Technology is changing how we learn by making it easier to access, more personalised, and more interesting.

    These ways are invaluable for students because they help them solve issues that prevent them from learning. This blog will discuss four main ways that technology has changed education. 

    Ways to Change Education

    Here, we will discuss the four critical ways technology is changing education, such as helping with personalized learning and smart tutoring.

    Using Platforms for Online Learning

    The rise of online learning sites like Coursera, Udemy, and Khan Academy has caused significant changes in the way schools work. These platforms offer several ways to learn, from online classes to courses needed to improve your skills for a better job. So anyone with an internet connection can learn.

    Students can now learn from the best without being in a standard classroom because well-known colleges and professionals in the field offer online courses. This change makes learning more personalised to fit the wants and styles of different students.

    Easy access and adaptability

    One of the best things about online learning tools is that they give you much freedom. Students can learn independently, going over topics again if necessary and fitting in tasks around their schedules.

    Because of this, students can balance their schoolwork with tools, and they can move forward in their classes as their schedules and circumstances allow. 

    E-learning platforms give you the freedom standard school systems don’t usually give you, whether you’re a full-time student, a working professional, or someone who just wants to try something new.

    Using Virtual and Augmented Reality in Education

    Augmented and virtual reality (AR/VR) are making learning more engaging and changing how we study. With these technologies, students can interact with subjects like science, history, and medicine in new ways. They can conduct virtual experiments, explore historical events in 3D, or even practice surgery in a simulated environment..

    Using your hands to learn makes it more fun and helpful. It helps you understand better and gain valuable skills.

    Engage and Keep Customers

    VR and AR help students become more involved by making learning fun and engaging. These tools give students real-time feedback and let them dig deeper into topics, helping them stay focused and remember complex ideas.

    Students involved in their education are more likely to remember and understand things better.

    Image-to-Text Conversion Technology (OCR)

    Image-to-text conversion technology (OCR) extracts text from images, transforming printed or handwritten content into digital text. OCR is transforming classrooms by helping students to access materials more easily.

    It also allows for the quick digitization of printed content, making learning resources more accessible and efficient.

    Faster Extraction and Enhanced Learning

    OCR technology speeds up text extraction from photos, saving time and labour. It also improves the learning process by turning textbooks, notes, and other study materials into editable and searchable formats, making resources more accessible and increasing educational efficiency.

    Artificial Intelligence in Personalized Learning

    AI-powered tutors are revolutionising education by customising learning paths for each student’s needs. These innovative systems check how well students are doing, figure out their skills and weaknesses, and then adjust their lessons to fit.

    This ensures that each student gets material tailored to their learning style and speed, making the learning process more effective and personalised.

    Automated Feedback, Grading, and Data-Driven Insights

    AI can rapidly evaluate student work, automating comments and grading to deliver prompt responses. This not only saves time for educators but also provides pupils with fast feedback on their progress. 

    Furthermore, AI monitors student performance over time, utilising data-driven insights to change learning techniques and content. This guarantees that the pace and complexity of the material adapt to the student’s specific requirements and skills.

    Conclusion

    We learn in new ways because technology makes it more personalised, open, and fun. Students can now learn in ways that were not possible before due to VR and AR, which offer engaging experiences and more flexible online learning tools. These changes happen more quickly with OCR and AI tools that make school more open to everyone and better meet the needs of each student. So, not a single kid gets behind.

    The future of education looks brighter as these tools get better. They give students more ways to learn, connect, and do well at school and work. Technology doesn’t just allow us to learn new things and change how we study.

     

     

  • ABNT sumário: Regras e Formatação

    ABNT sumário? A normalização de trabalhos acadêmicos é uma etapa fundamental para garantir a padronização, clareza e legitimidade dos documentos produzidos em âmbito educacional. No Brasil, a referência normativa central é a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), entidade responsável por definir diretrizes que organizam o conteúdo formal de teses, dissertações, artigos científicos e demais textos acadêmicos.

    A padronização, além de organizar os elementos estruturais de um trabalho, facilita sua leitura, indexação e recuperação de informações, como ressalta o CEFET-MG (2024) em seu manual de normalização. Entre esses elementos estruturais, o sumário se destaca como uma peça-chave para garantir a inteligibilidade do documento.

    ABNT sumário – Conceito e Função do Sumário Segundo a ABNT

    De acordo com a ABNT NBR 6027:2012, o sumário é definido como “a enumeração das divisões, seções e outras partes de um documento, na mesma ordem e grafia em que a matéria nele se sucede, acompanhada do respectivo número da página”. Ou seja, ele funciona como um roteiro que organiza a leitura e permite acesso rápido às seções do texto.

    A construção adequada do sumário tem implicações diretas sobre a credibilidade do trabalho. Como afirma Lakatos e Marconi (2003), a organização lógica de um texto científico contribui para a coerência da pesquisa e para o seu reconhecimento no meio acadêmico. Assim, o sumário, ao refletir com exatidão a divisão interna do trabalho, torna-se essencial para uma apresentação formal qualificada.

    ABNT sumário – Regras Gerais para a Elaboração do Sumário

    Conforme orienta o manual do CEFET-MG (2024), o sumário deve ser elaborado apenas após a finalização do texto e conter exclusivamente os elementos textuais e pós-textuais. Elementos como dedicatória, agradecimentos e epígrafe não devem constar no sumário, por serem considerados componentes preliminares.

    As principais diretrizes para sua formatação incluem:

    • Ser alinhado à esquerda;
    • Ter o título “SUMÁRIO” centralizado, em caixa alta e negrito;
    • Apresentar as seções numeradas progressivamente, com a mesma nomenclatura, grafia e ordem em que aparecem no texto;
    • Usar algarismos arábicos para indicar a página onde cada item inicia;
    • Manter o espaçamento e formatação coerente com o corpo do texto.

    Na prática, o sumário atua como um mapa que orienta o leitor e deve ser tratado com o mesmo rigor dos demais componentes obrigatórios, como as referências e a introdução.

    ABNT sumário- Exemplos e Modelos Com Base na ABNT NBR 6027

    Segundo o CEFET-MG (2024), um sumário bem estruturado deve apresentar seções primárias (capítulos), secundárias e, quando necessário, terciárias, quaternárias e quinárias, respeitando os níveis hierárquicos definidos pela ABNT NBR 6024.

    SUMÁRIO

    1 INTRODUÇÃO …………………………………………………………………………. 10
    2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ………………………………………………… 13
    2.1 A HISTÓRIA DA METODOLOGIA CIENTÍFICA ………………… 14
    2.2 A CONTRIBUIÇÃO DA ABNT …………………………………………….. 16
    3 METODOLOGIA …………………………………………………………………….. 20
    4 RESULTADOS E DISCUSSÃO ………………………………………………. 25
    5 CONSIDERAÇÕES FINAIS …………………………………………………… 30
    REFERÊNCIAS ………………………………………………………………………… 32
    APÊNDICE A – ROTEIRO DE ENTREVISTA ……………………………… 35
    ANEXO A – GRÁFICOS DE DESEMPENHO ……………………………… 36

    Esse modelo evidencia a uniformidade exigida pelas normas técnicas, ajudando o leitor a localizar rapidamente a seção desejada.

    ABNT sumário – Diferença entre Sumário, Índice e Lista de Ilustrações

    Muitas vezes, há confusão entre os conceitos de sumário, índice e lista de ilustrações. Apesar de semelhantes, cada um possui função específica dentro da estrutura de um trabalho acadêmico.

    O sumário, como já abordado, é a enumeração das divisões textuais, seguindo a ordem em que aparecem no documento, com a respectiva paginação (ABNT, 2012). Já o índice é uma relação ordenada (geralmente alfabética ou temática) de palavras, nomes ou assuntos acompanhados das páginas em que aparecem. Seu objetivo é facilitar a localização de conteúdos específicos dentro do texto (ABNT NBR 6034).

    Por sua vez, a lista de ilustrações consiste em um rol com os títulos e páginas de figuras, gráficos, quadros, mapas e outros elementos visuais, organizada na sequência em que são apresentados no trabalho (CEFET-MG, 2024).

    Enquanto o sumário reflete a estrutura do texto, o índice busca localizar termos, e a lista de ilustrações organiza os elementos gráficos. Cada um cumpre papel distinto e complementar.

    ABNT sumário – Erros Comuns na Elaboração do Sumário

    A construção do sumário pode ser comprometida por erros recorrentes que afetam tanto a estética quanto a funcionalidade do trabalho. Entre os principais equívocos estão:

    • Incluir elementos pré-textuais (como dedicatória ou agradecimentos);
    • Inserir títulos que não constam no corpo do texto ou omitir seções relevantes;
    • Não atualizar a paginação após revisões e ajustes do conteúdo;
    • Utilizar grafias diferentes das presentes nos títulos reais do texto;
    • Desrespeitar a hierarquia de seções e subseções;
    • Apresentar espaçamentos e recuos incoerentes.

    Evitar tais falhas exige atenção à finalização do trabalho e uso adequado de ferramentas automáticas de geração de sumário, como as disponíveis em editores de texto.

    ABNT sumário  – Ferramentas Digitais para Geração de Sumário

    Com o uso de editores de texto como Microsoft Word ou LibreOffice Writer, é possível automatizar a criação do sumário, desde que os estilos de títulos (Título 1, Título 2, etc.) estejam corretamente aplicados.

    Ao aplicar estilos aos títulos e subtítulos, o programa reconhece os níveis hierárquicos e gera o sumário com base na estrutura do texto. Isso garante que eventuais mudanças de páginas ou títulos sejam automaticamente refletidas, bastando atualizar o sumário com um clique.

    Esses recursos promovem economia de tempo, evitam erros manuais e asseguram fidelidade às normas técnicas. Porém, mesmo com automação, cabe ao autor revisar cuidadosamente o conteúdo gerado, a fim de garantir sua conformidade com a ABNT.

    Considerações Finais

    O sumário, embora muitas vezes subestimado, é uma das colunas estruturais de um trabalho acadêmico bem apresentado. Ele sintetiza a organização textual, favorece a navegação pelo documento e reflete o rigor metodológico empregado na sua elaboração.

    Dominar a norma ABNT NBR 6027 e aplicá-la de forma precisa é uma competência essencial para estudantes e pesquisadores. Como destaca Severino (2007), a clareza e a objetividade são pilares da comunicação científica, e o sumário contribui significativamente para essa clareza.

    Referências Bibliográficas

    ABNT. NBR 6027: Informação e documentação – Sumário – Apresentação. Rio de Janeiro: ABNT, 2012.

    ABNT. NBR 6024: Informação e documentação – Numeração progressiva das seções de um documento escrito – Apresentação. Rio de Janeiro: ABNT, 2012.

    ABNT. NBR 6034: Informação e documentação – Índice – Apresentação. Rio de Janeiro: ABNT, 2004.

    CEFET-MG. Manual de Normalização de Trabalhos Acadêmicos. 2. ed. Belo Horizonte: CEFET-MG, 2024.

    LAKATOS, Eva Maria; MARCONI, Marina de Andrade. Fundamentos de metodologia científica. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2003.

    SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia do trabalho científico. 23. ed. São Paulo: Cortez, 2007.

  • A Arte da Guerra

    A sabedoria silenciosa de Sun Tzu

    Quando ouvimos a expressão “A Arte da Guerra”, é comum que a primeira imagem evocada seja a de campos de batalha, armaduras reluzentes, estratégias militares e confrontos épicos entre exércitos. No entanto, essa obra milenar atribuída a Sun Tzu, um estrategista chinês que viveu por volta do século V a.C., é muito mais do que um manual de combate. Trata-se, acima de tudo, de uma profunda reflexão sobre a vida, o poder, o equilíbrio e o autoconhecimento.

    Na superfície, A Arte da Guerra parece um tratado sobre como vencer o inimigo. Mas, ao mergulharmos em suas entrelinhas, descobrimos que seus ensinamentos podem ser aplicados muito além do campo militar: no mundo dos negócios, na educação, nas relações humanas e até nos embates internos que travamos conosco mesmos. É uma obra que ensina a agir com prudência, inteligência e propósito.

    O valor da estratégia sobre a força

    Sun Tzu é categórico ao afirmar que a vitória suprema é aquela que se conquista sem necessidade de lutar. Essa ideia, à primeira vista, pode parecer contraditória em um livro sobre guerra, mas revela um princípio fundamental: a verdadeira inteligência está na antecipação, na diplomacia e no domínio da situação antes que ela se transforme em conflito aberto.

    Segundo o autor, “vencer cem batalhas não é o auge da excelência; o auge da excelência consiste em subjugar o inimigo sem lutar”. O uso da força, portanto, não é o caminho mais eficaz — é, muitas vezes, o último recurso de quem falhou em planejar, analisar e compreender o cenário ao seu redor.

    Essa máxima nos convida a refletir sobre como lidamos com os desafios cotidianos. Em vez de reagir impulsivamente ou agir por impulso, talvez devêssemos aprender a observar mais, compreender melhor os movimentos do outro e, sobretudo, conhecer nossas próprias limitações.

    Conhece-te a ti mesmo e ao inimigo

    Uma das passagens mais célebres do livro diz:

    “Se você conhece o inimigo e conhece a si mesmo, não precisa temer o resultado de cem batalhas.”
    “Se você conhece a si mesmo, mas não o inimigo, para cada vitória haverá uma derrota.”
    “Se você não conhece nem o inimigo nem a si mesmo, perderá todas as batalhas.”

    Aqui, Sun Tzu fala sobre autoconhecimento e empatia estratégica. Conhecer a si mesmo implica saber nossos pontos fortes e fracos, entender nossas emoções, nossas motivações, e sobretudo, reconhecer quando não estamos prontos para agir. Já conhecer o inimigo — seja ele uma pessoa, uma situação ou um obstáculo interno — significa estudar, compreender e mapear seus movimentos com calma e atenção.

    Essa passagem ecoa também em nossa vida pessoal e profissional. Quantas vezes enfrentamos situações difíceis sem entender completamente os fatores envolvidos? Quantas vezes reagimos no calor do momento, sem nos dar conta de que uma pausa para refletir poderia evitar danos maiores?

    A importância da adaptação

    Outro princípio essencial de A Arte da Guerra é a capacidade de adaptação. Sun Tzu ressalta que o terreno muda, as condições se alteram e a rigidez é a ruína do guerreiro. Para vencer, é preciso ser como a água — capaz de se moldar à forma do recipiente, contornar obstáculos e seguir fluindo até alcançar seu objetivo.

    Esse ensinamento se revela poderoso quando pensamos nos tempos atuais, marcados por mudanças rápidas, crises inesperadas e transformações sociais constantes. O profissional que se adapta, o professor que repensa sua didática, o líder que ouve sua equipe, o indivíduo que revê suas crenças — todos eles estão, de alguma forma, aplicando os ensinamentos de Sun Tzu.

    Adaptação não é fraqueza, mas inteligência em movimento. A rigidez pode parecer firmeza, mas muitas vezes revela medo de mudança. Na guerra, como na vida, sobrevive e prospera quem sabe se transformar.

    Liderança com sabedoria e humanidade

    Sun Tzu também se debruça sobre a figura do líder. Para ele, um bom comandante não é aquele que grita ordens ou se impõe pela força, mas sim aquele que inspira respeito pela integridade, conduz com justiça e cria confiança entre seus liderados.

    “Um general sábio é prudente, calmo, reservado, justo e metódico.”
    Esse trecho nos mostra que a liderança eficaz é baseada em disciplina, exemplo e clareza de propósito. Não há espaço para vaidade, impulsividade ou desorganização. Um líder, portanto, precisa ser alguém que conhece as regras, mas também sabe quando é preciso reinventá-las com sabedoria.

    Essa perspectiva humanizada da liderança é cada vez mais valorizada no século XXI, onde empresas e instituições reconhecem que a autoridade coercitiva perdeu espaço para o diálogo e a colaboração. Nesse sentido, A Arte da Guerra é surpreendentemente atual.

    A vitória sem destruição: um princípio de sabedoria

    Um dos aspectos mais fascinantes da filosofia de A Arte da Guerra é o conceito de que a vitória mais honrosa não é aquela conquistada pela força bruta, mas sim aquela que preserva o maior número de vidas e recursos possíveis. Em outras palavras, vencer é importante — mas o modo como se vence diz muito sobre a sabedoria e a humanidade do vencedor.

    “O bom guerreiro conquista sem lutar, ocupa sem destruir, impõe respeito sem usar a força.”

    Essa ideia pode parecer contraditória se comparada aos manuais de guerra tradicionais, mas ela revela um traço fundamental da obra: o objetivo da guerra, segundo Sun Tzu, não é o conflito em si, mas a restauração da ordem. A guerra deve ser sempre um meio, jamais um fim. Ela é uma ferramenta para reequilibrar forças, não para alimentar vaidades ou impulsos destrutivos.

    Esse ensinamento pode ser transposto para as relações humanas e organizacionais. Em uma equipe de trabalho, por exemplo, um líder que resolve conflitos por meio do diálogo, da escuta ativa e da empatia, está “vencendo sem guerrear”. Já aquele que impõe sua vontade com autoritarismo, ainda que obtenha resultados imediatos, tende a cultivar ressentimentos que enfraquecem o grupo a longo prazo.

    A guerra interior: os combates que travamos dentro de nós

    Embora o livro fale sobre guerras externas, muitos de seus ensinamentos podem ser interpretados como metáforas para as batalhas internas que todos nós enfrentamos. Inseguranças, medos, impulsos, desejos e crenças limitantes formam um verdadeiro campo de batalha psicológico.

    A frase “conhece a ti mesmo” se aplica aqui com profundidade. Ao compreendermos os padrões que nos aprisionam, as emoções que nos controlam e os pensamentos que nos sabotam, somos capazes de estabelecer uma estratégia de ação mais saudável. Vencer a si mesmo, nesse sentido, é a mais difícil — e mais necessária — de todas as vitórias.

    Sun Tzu nos alerta que a pressa, a raiva e a vaidade são fraquezas exploradas por inimigos astutos. Na vida prática, isso significa que agir impulsivamente diante das dificuldades é cair em armadilhas previsíveis. Quando estamos centrados, conscientes de nossas emoções e preparados para as mudanças, nos tornamos mais resistentes aos ataques — sejam eles externos ou internos.

    Ética e moral em tempos de guerra

    Uma das leituras contemporâneas mais relevantes da obra de Sun Tzu envolve sua reflexão implícita sobre a ética. Apesar de tratar da guerra, o autor se mostra preocupado com a proporcionalidade, com os efeitos colaterais das ações e com o custo humano dos embates.

    “A guerra é de vital importância para o Estado”, afirma Sun Tzu, “mas deve ser feita com seriedade, nunca por leviandade”. Em outras palavras, não se entra em guerra sem um propósito claro e nobre. Essa premissa nos leva a pensar sobre o uso do poder em qualquer contexto — seja político, institucional ou pessoal.

    A moralidade da guerra, para Sun Tzu, passa por evitar o sofrimento desnecessário. Ele propõe estratégias de desestabilização psicológica, de inteligência tática e de aproveitamento do terreno, exatamente para minimizar o confronto direto e suas consequências. Isso nos conduz a um raciocínio ético contemporâneo: o uso da estratégia deve sempre respeitar princípios de justiça, proporcionalidade e humanidade.

    Em tempos em que muitas formas de poder são exercidas de forma abusiva, o pensamento de Sun Tzu nos convida a refletir: é possível conquistar sem destruir, liderar sem humilhar, vencer sem machucar? A resposta, segundo ele, é sim — mas exige sabedoria, paciência e domínio de si.

    Aplicações contemporâneas da obra: da empresa à escola

    A grandeza de A Arte da Guerra está na sua capacidade de dialogar com diferentes campos do saber. Seu conteúdo é frequentemente citado em áreas como administração, marketing, psicologia, pedagogia e até no desenvolvimento pessoal.

    Nas empresas, por exemplo, a obra inspira estratégias de mercado, gestão de crise e liderança. Muitas organizações utilizam os ensinamentos de Sun Tzu para avaliar riscos, antecipar movimentos da concorrência e planejar ações com inteligência e precisão. Frases como “onde há vantagem, há armadilha” e “ataque onde o inimigo está despreparado” são adaptadas para contextos de negócios — não no sentido de prejudicar o outro, mas de ser mais eficaz e visionário.

    Na educação, os princípios de Sun Tzu são utilizados como metáforas para o enfrentamento dos desafios escolares. O professor que adapta sua didática à realidade do estudante, que antecipa dificuldades de aprendizagem e que conduz sua turma com equilíbrio, também está aplicando a arte da guerra — mas a serviço da paz, do conhecimento e do crescimento humano.

    No campo da psicologia, especialmente na abordagem cognitivo-comportamental e na psicologia positiva, os ensinamentos do estrategista são lidos como ferramentas para fortalecimento emocional e tomada de decisões assertivas. Ao enxergar o mundo como um tabuleiro em constante movimento, o indivíduo se vê compelido a desenvolver habilidades de autocontrole, resiliência e adaptação.

    Estratégia ou manipulação? Os limites da sabedoria tática

    Embora amplamente elogiada, A Arte da Guerra também desperta leituras críticas. Uma das principais questões levantadas por estudiosos contemporâneos diz respeito ao limite ético entre a estratégia e a manipulação. Em alguns trechos, Sun Tzu sugere táticas de engano, dissimulação e manipulação psicológica para desestabilizar o adversário.

    “Toda guerra é baseada no engano.”
    “Se você é capaz, finja ser incapaz. Se está perto, finja estar longe. Se está longe, finja estar perto.”

    Essas recomendações, se interpretadas fora de contexto, podem sugerir uma ética questionável, especialmente quando aplicadas em ambientes sociais ou organizacionais. O problema surge quando a estratégia deixa de ser uma forma de defesa e passa a ser instrumento de dominação, manipulação ou trapaça.

    É aqui que se impõe uma leitura crítica e responsável da obra. Usar a inteligência estratégica para evitar conflitos e resolver problemas é sensato. Porém, utilizar a arte da dissimulação para obter vantagem sobre os outros a qualquer custo é distorcer o princípio básico da obra — o equilíbrio entre eficácia e integridade.

    Nesse ponto, vale lembrar que Sun Tzu escrevia para um tempo específico, em um contexto histórico marcado por conflitos armados constantes entre feudos e dinastias. Seu foco era proteger seu povo, manter a ordem e evitar guerras prolongadas. Adaptar seus ensinamentos para a vida civil exige, portanto, mediação ética e consciência crítica.

    Estratégia é sobre leitura do contexto

    Quando Sun Tzu fala sobre enganar o inimigo, ele está nos dizendo algo mais profundo: que as aparências enganam, e que compreender o contexto é mais importante do que reagir de forma automática.

    No mundo contemporâneo, onde os julgamentos são muitas vezes precipitados e baseados em superficialidades, essa lição é valiosa. O verdadeiro estrategista é aquele que vê o que os outros não veem, escuta o que não é dito, lê o que está por trás das ações e das palavras.

    Isso vale para negociações, para conflitos familiares, para debates sociais e até para escolhas pessoais. Antes de agir, é preciso observar. Antes de julgar, é preciso compreender. A prudência, nesse sentido, é a mais refinada das armas.

    Como aplicar a Arte da Guerra no cotidiano?

    Aplicar os ensinamentos de Sun Tzu em nossa vida diária não significa transformar tudo em competição ou agir com frieza calculista. Pelo contrário: significa agir com consciência, domínio emocional e clareza de propósito.

    A seguir, algumas formas de aplicar esses princípios de maneira ética e saudável:

    1. Planejamento antes da ação

    “As batalhas são vencidas antes de serem lutadas.”

    Essa frase nos lembra da importância do planejamento estratégico. Antes de começar um projeto, tomar uma decisão importante ou enfrentar um problema, é fundamental avaliar as possibilidades, prever riscos e traçar metas. Improvisar o tempo todo desgasta e aumenta as chances de erro.

    2. Domínio das emoções

    “Se seu inimigo é colérico, provoque-o; se arrogante, humilhe-o.”

    Esse trecho, mais do que uma sugestão de provocação, é um convite à compreensão das emoções humanas. Saber que a raiva e a arrogância podem nos tornar vulneráveis deve servir como alerta para controlarmos nossas próprias reações, em vez de nos tornarmos presas delas.

    3. Escolher as batalhas certas

    “Evitar batalhas inúteis é sinal de inteligência.”

    Na vida moderna, somos constantemente provocados — por opiniões alheias, redes sociais, disputas no trabalho ou brigas familiares. Saber escolher quais conflitos merecem nossa energia e quais devem ser ignorados é um dos maiores aprendizados que podemos tirar da obra.

    4. Conhecimento como base de poder

    “Quem conhece o terreno vence.”

    Sun Tzu ressalta a importância do conhecimento — do inimigo, de si mesmo, do ambiente. No mundo atual, essa máxima se aplica ao domínio da informação, da leitura de cenários políticos, econômicos e emocionais. Informação bem usada é poder.

    5. Liderança equilibrada

    “Trate seus soldados como filhos e eles o seguirão até os vales mais profundos.”

    Em tempos de líderes autoritários ou distantes, essa frase brilha como um farol de liderança ética e empática. Liderar é cuidar. Liderar é servir. E o líder que respeita sua equipe, escuta com atenção e age com justiça, constrói vitórias duradouras.

    O legado de Sun Tzu na cultura contemporânea

    Apesar de ter sido escrito há mais de 2500 anos, A Arte da Guerra continua inspirando livros, filmes, palestras, cursos e artigos. Sua presença é sentida em áreas tão diversas quanto o empreendedorismo, o coaching, o desenvolvimento pessoal, os estudos militares, o cinema e até nos videogames.

    No Ocidente, essa popularidade ganhou força principalmente a partir do século XX, quando a obra foi traduzida para dezenas de idiomas e passou a ser utilizada em escolas militares e cursos de administração. No Oriente, especialmente na China e no Japão, A Arte da Guerra sempre foi considerada uma joia da filosofia clássica, sendo estudada com o mesmo respeito dedicado a Confúcio ou Lao-Tsé.

    O motivo dessa longevidade está em seu conteúdo atemporal: Sun Tzu não fala apenas de guerra, mas de sabedoria aplicada à ação, de ética aplicada ao poder, e de inteligência aplicada à vida.