Florestan Fernandes Marcha Educação

Biografia Florestan Fernandes

O instaurador da sociologia brasileira
Florestan Fernandes pôs em xeque o mito da democracia racial no país

 

“Afirmo que iniciei a minha aprendizagem sociológica aos seis anos de idade, quando precisei ganhar a vida como se fosse um adulto e penetrei, pelas vias da experiência concreta, no conhecimento do que é a convivência humana e a sociedade.”

Florestan Fernandes

A infância pobre no Brás, quando dormia em cima de um armário para aproveitar o ar que entrava por uma pequena janela, não foi empecilho para o paulistano Florestan Fernandes, nascido em 1920, tornar-se um professor respeitado e sociólogo de projeção internacional. Ao fundar a sociologia crítica no país, Florestan rompeu com a postura dominante até então, que se limitava a descrever o Brasil.

Defendia a ideia de uma sociologia brasileira que não importasse esquemas teóricos e tornou-se a figura mais representativa da futura escola sociológica paulista. Escreveu mais de 50 livros e centenas de artigos que influenciaram intelectuais como Octavio Ianni, Fernando Henrique Cardoso e Paul Singer.

“Florestan trouxe contribuições de primeira ordem em várias áreas da sociologia”, avalia Gabriel Cohn, sociólogo da Universidade de São Paulo (USP). As teses de mestrado e doutorado de Florestan são referência até hoje no estudo dos Tupinambá. Na década de 50, volta-se para a questão do racismo, num trabalho pioneiro que, segundo Gabriel Cohn, “lançou sérias dúvidas sobre o mito da democracia racial e deu alento para o estudo da democracia de forma mais ampla, um tema muito presente em sua obra.”

Nos anos 70, Florestan adota postura militante e propõe uma sociologia politicamente engajada. No âmbito acadêmico, inaugura a perspectiva de análise marxista no país. Em A revolução burguesa no Brasil, o sociólogo lança as bases para uma teoria política do autoritarismo extensiva à América Latina. “Em uma perspectiva de pioneirismo inacreditável, Florestan denuncia que não temos uma sociedade plenamente democrática por não haver organização autônoma das classes populares”, afirma Brasilio Sallum, sociólogo da USP. Ele aponta mais duas contribuições de Florestan para a sociologia brasileira: aliar o rigor metodológico à pesquisa empírica e introduzir no Brasil os três clássicos da sociologia — Karl Marx, Max Weber e Émile Durkheim.

Florestan defendeu a educação pública e foi eleito deputado federal duas vezes pelo Partido dos Trabalhadores. A educação e o PT são temas de sua obra, bem como a crítica ao governo militar que impôs seu exílio em 1969.

Intelectual ardoroso, Florestan se apegava ciumentamente aos livros em que fazia inúmeras anotações. Apesar de recorrentes internações hospitalares nos últimos anos de vida, o sociólogo não abriu mão do tom professoral que sempre o caracterizara. Escreveu artigos para a imprensa e, a partir de 1989, manteve uma coluna semanal na Folha de S. Paulo.

Florestan Fernandes faleceu aos 75 anos, em 10 de agosto de 1995, vítima de embolia gasosa maciça — presença de bolhas de ar no sangue –, seis dias após submeter-se a um transplante de fígado. Revisava então os originais de seu último livro, A contestação necessária – retratos intelectuais de inconformistas e revolucionários, uma coletânea de biografias de amigos e heróis.

Raquel Aguiar
Ciência Hoje/RJ
julho/2001
Fonte: https://cienciahoje.uol.com.br/controlPanel/materia/view/1628

Cristiano Bodart

Doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP), professor do Centro de Educação e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal de Alagoas (Ufal). Pesquisador do tema "ensino de Sociologia". Autor de livros e artigos científicos.

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