Entre as velhas e as novas “caras” na política local

Política local: mudança ou permanência na próxima eleição?

Política local parece ser um tema que, cotidianamente, não chama muito a atenção da população em geral, mas em véspera de eleição desperta-se o interesse pelo tema de tal forma que parte significativa do eleitorado se manifesta com veemência em favor de um ou de outro grupo político, semelhante as práticas das torcidas de futebol…

Aproveitando essa atmosfera que começa a ser formada, trago uma reflexão que julgo importante. Trata-se da questão que envolve a escolha dos mesmos políticos ou de novos nomes que surgem, o que convencionalmente chamamos de “novas e velhas caras”.

Comumente afirma-se que é saudável à democracia uma alternância no poder (da administração ou da legislatura). As vezes tal afirmação vem carregada de um desejo de mudanças estruturais na política local, o que não garantirá melhorias. Grosso modo, existe uma interpretação de que um “nova cara” estaria ligada a uma nova forma de governar ou legislar e, “velhas caras” sendo entendidas como sinônimo de continuidade das antigas práticas. Certamente esta interpretação é ingênua. As “velhas” ou as “novas” caras não estão correlacionadas ao modelo de gestão e legislatura, não podendo ser associada à mudanças ou à permanências. “Novas caras” não garante que novas práticas serão postas em práticas, uma vez que, estas “novas caras” podem está inseridas em um grupo realizador de velhas práticas; assim como, “velhas caras” podem se abrir para novas práticas. Certamente este último é menos recorrente.

Outro problema que merece atenção é que a suposta “nova cara” pode não ser fruto de um novo grupo. A suposta “nova cara” pode ser apenas o “testa de ferro” do grupo tradicional. Uma verdadeira “nova cara” não significa necessariamente um candidato desconhecido do meio social, mas um indivíduo nunca inserido no poder e representante de um grupo, outrora não representado. De outra forma, “velha cara” pode se desvincular do grupo que tradicionalmente detém o poder e passar a representar novos interesses e caminhar rumo à mudanças significativas.

Posto isto, quero chamar a atenção para o fato de que a alternância no poder e a possível mudança na gestão ou na legislatura não está necessariamente ligada ao candidato, mas ao grupo que este está vinculado. Em outras palavras, se o eleitor deseja mudanças deverá escolher um candidato que está vinculado com grupos comprometidos com transformações “desejáveis”. É importante estar atento que mudanças não são sinônimas de melhorias.

Quanto a alternância no poder, não existe necessariamente relação causal com a saúde da democracia ou ao maior desempenho dos que estariam alternando-se no poder. A saúde da democracia depende mais da disputa do que da alternância. Ou seja, o grupo que detém o poder político deve se sentir ameaçado por outros grupos. A ameaça de perda do poder funciona como estímulo à melhoria de seus trabalhos de gestão, administração, fiscalização e de legislatura. O importante é existir oposições (no plural) que tenham reais chances de conquistarem o poder político.

Como exemplo, notamos o fato noticiado por alguns meios de comunicação referente a constante ausência de muitos dos vereadores de Piúma nas sessões da Câmara. Essa prática aponta para duas possibilidades: 1. estariam esses vereadores tão confiantes na reeleição que desprezam a necessidade de desempenhar sua função real e; 2. não estão desejosos de continuar na legislatura. Acredito que a primeira possibilidade parece se enquadrar melhor à política local piumense. Mas, por que tamanha confiança e, consequentemente, relaxamento? Essa situação está ligada a falta de uma ameaça concreta, contundente e presente da oposição e da certeza (pelo menos assim indicam suas atitudes) de que a população não quer mudanças de “caras”, ou pelo menos, não age para efetivá-la.

Para aqueles que acreditam que mudanças são necessárias, afirmo que precisamos de “verdadeiras caras novas” (“novas caras” desvinculadas aos “velhos grupos”), mesmo que suas propostas não sejam contundentes, ainda que não representem efetivamente os grupos de outrora não representados, mas, na pior das hipóteses, terão mais opções de voto e as “velhas caras” se sentirão ameaçadas. Quem sabe estes não resolvem realizar de forma efetiva seu papel real, ou ainda, quem sabe a população não os aposentam, já que “envelheceram”… Isto é apenas uma questão de escolha e o período mais propício para isso se aproxima.

Cristiano das Neves Bodart, mestre em Planejamento Regional e Gestão de Cidades/UCAM e doutorando em Sociologia na Universidade de São Paulo/USP.

Segue um texto meu publicado no jornal “Espírito Santo Notícias” (nº17, 2ª quinzena. 06/06/2012)

 

 

 

Cristiano Bodart

Doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP), professor do Centro de Educação e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal de Alagoas (Ufal). Pesquisador do tema "ensino de Sociologia". Autor de livros e artigos científicos.

1 Comment

  1. Sem querer generalizar,mas como o texto diz precisamos de "caras novas" literalmente,pois os novos candidatos que surgem na maioria das vezes são apoiados por um candidato que já era do meio anteriormente.Por isso precisamos de indivíduos totalmente desvinculados e com propostas além de "bonitas" ,reais.Que sejam boas pessoas em todo o tempo e não apenas no período que os convém.

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