Os fundamentos da teoria política moderna: entre “o federalista” e Stuart Mill

Os fundamentos da teoria política moderna: entre “o federalista” e Stuart Mill

Por Camillo César Alvarenga[1]
Stuart Mill
As transformações ocorridas nos séculos XVIII e XIX que gestaram a sociedade moderna, vão desde as relações de poder aos princípios que passam a reger o processo de desenvolvimento social da humanidade, quer em suas questões quantitativas, no que diz respeito à economia e mais propriamente as questões da produção material, quer na organização das estruturas politicas e seu funcionamento que mediam o contexto qualitativo das relações sociais no que toca a liberdade e o voto.
Partindo desse ponto de vista, duas expressões do pensamento acerca da ciência política refletem as mudanças necessárias à adequação de um paradigma social compatível com a nova ordem burguesa na qual os interesses das classes precisam ser horizontalizados. De modo que, os métodos e pressupostos são redefinidos com intuito de atender as novas demandas intelectuais de um elaborado conjunto de reformas que vêm para atualizar a potência de uma nova sociedade.
Assim tem-se na literatura política inglesa de Stuart Mill um precioso legado do entendimento do século XIX, que aponta os indícios da política representativa fundada na necessidade de reconhecimento do pluralismo inerente a diversidade social frente à liberdade do sujeito individual. Ao passo que, no século anterior nas colônias norte americanas, se realizavam esforços teóricos além de avanços na prática do funcionamento do complexo do Estado frente a natureza humana dos cidadãos.
Explícitos aspectos que permeiam a reflexão aprofundam-se os argumentos nas especificidades de cada linha de pensamento para uma maior compreensão da
situação de evolução teórico-metodológica aliada ao advento de perspectivas que abordando uma nova visão filosófica da condição humana para redefinir o paradigma político moderno de acordo com as novidades exigidas pela vida em sociedade que por ora se originara: a democracia federalista para as repúblicas
liberais.
I.O FEDERALISMO OU O PACTO FEDERAL
 
Em “O federalista”, conjunto de artigos da autoria de Hamilton  (1º secretario do tesouro no governo George Washington), Madison (responsável pela maior contribuição individual na constituição formando com T. Jefferson o partido republicano articuladores da convenção federal) e Jay (1º presidente da corte suprema objetivou-se a ratificação da constituição se mostraram com celebres armas na luta pela independência dos EUA. Desenvolveu-se assim toda uma teoria política para o texto constitucional, opondo-se a Montesquieu e configurando a incompatibilidade entre os antigos governos (grandes exércitos e grandes monarquias) aos tempos modernos, apresentando um desafio teórico de desconstrução dos dogmas e modernização das formas políticas de pensamento na organização dos governos.
Logo tem um novo modelo de gerência do Estado moderno : o federalismo. Ataque ao governo central, caracterizado por críticas a relação entre as leis enquanto ordens ou como recomendações se não funcionasse tal como punição permitindo o não cumprimento não validariam o poder da União, a qual delegando sua
responsabilidade aos Estados redefinia assim as relações da esfera publica com os cidadãos. Possuindo em seu bojo fortes questionamentos sobre a confederação de 1871 e abolição do modelo de Montesquieu, em contra posição da força frente à liberdade.
A soberania da confederação em relação à União é suplantada, por uma extensão dessa autonomia dos Estados aos indivíduos. O federalismo é visto como pacto político dos estados, resultado de avanços teóricos e negociação politica para o surgimento dos EUA como nação através do pacto federal.
No que tange a separação dos poderes relaciona-se a criação do Estado com o controle sobre os detentores do poder a fim de frear as vicissitudes históricas da natureza humana. De modo que surge a necessidade de criação de estruturas que possam controlar os demais e exercer controle sobre si mesma. Algo como Power X Power. Funções de governo distribuídas entre as classes sociais, horizontalismo dos poderes (legislativo, executivo, judiciário) em órgãos distintos e autônomos (sistema misto) redefinindo o modos operandi.   A partir da desconstrução de corretivos aristocráticos erige a concepção de governo popular formulado com base na existência de um Senado que seria balanceado com a Câmara dos Deputados, as quais seriam da jurisprudência da Corte suprema.   Repúblicas e as facções compõem a democracia. Facções – fundadas na propriedade – como resultados de uma economia moderna, fundando uma república representativa em detrimento da democracia pura. Alicerçando a representação em menos cidadãos outorgando-lhes mais poder. No intuito de uma maior coordenação dos interesses pelos governantes para atingir sucesso na orquestração das questões sociais.
II. O CLÁSSICO DO LIBERALISMO: AS ORIGENS DO SISTEMA POLÍTICO CAPITALISTA.
A obra do liberal inglês Stuart Mill, que gira em torno de objetos teóricos como liberdade e representação é produto do intempestivo Século XVIII – revolução Industrial, industrialização, surgimento do operariado, burguesia industrial e financeira.   Abrindo pressuposto para a proposição dum sistema de contestação pública a fim de democratizar o processo de alocação da riqueza e valores socialmente produzidos, juntamente com a sugestão do sistema de partidos para canalizar as forças da oposição corroborando para a assimilação do contraditório ao processo da governança.
Nas eleições de 1832, 1867 e 1884 se experimenta a universalização do voto masculino, a implementação sistema de partidos, absorção dos trabalhadores (demandas do movimento operário inglês) experimentando uma relação entre um utilitarismo radical diante de reformas sociais alcançando uma espécie de fase democrática.   Stuart Mill lança Lógica (1843), e a partir de uma revolução teórica nasce um novo liberalismo, uma interação entre o organicismo – entendido como natureza social humana onde o indivíduo é resultado do grupo – frente ao individualismo – o qual o homem ante a sociedade produz um resultado no qual o coletivo é produto do indivíduo.   Diante de uma teoria política liberal democrática. Avançando com o voto universal e a emancipação da mulher, juntamente a institucionalização da participação popular numa criação de representação entre voto e poder, além de embate entre interesses seccionais e coletivos.
Classes proprietárias X classes trabalhadora sendo resolvida pela noção de elites culturais para estar livre da dicotomia do modo de produção.   Fundando um sistema eleitoral proporcional baseado no indivíduo e na liberdade, originando assim uma democracia para reger o movimento da sociedade e seus indivíduos. Onde: “O bom governo será aquele capaz de garantir o maior volume de felicidade líquida para o maior número de cidadãos. Para cada ação ou questão política, é sempre possível aplicar este raciocínio para avaliar a “utilidade” de seus resultados”( p.197).
Entre as varias contradicoes presentes no pensamento e nas praticas de Tchernichevski que saltam aos olhos esta o fato de que, apesar de socialista e revolucionario, ele aceitou de maneira irrestrita as premissas do utilitarismo ingles, em particular as formulacoes de Jeremy Bentham e de seu discípulo John Stuart Mill. O primeiro preconizava, por exemplo, a ideia de que o individuo deve procurar sempre reconciliar-se com a sociedade, mesmo que para isso seja necessário o sacrificio de supostos direitos humanos. Para o filosofo, o que realmente importava eram os interesses da comunidade em geral, o bem comum em detrimento das dores dos indivíduos. Um dos problemas desta visão e saber quem teria a autoridade para definir o “bem comum”.
Já Stuart Mill procurou fazer uma modulação da posição de Bentham, para isso convencionou que a moral utilitarista deveria considerar que o ser humano, em nome do bem comum, seria capaz de abrir mão do seu próprio bem. Por mais estranho e antagônico que possa parecer, Tchernichevski conseguiu unir na construção de sua doutrina radical o cientificismo determinista, o utilitarismo inglês, a visão messiânica proveniente do cristianismo ortodoxo russo e o socialismo utópico ocidental. Tudo isso em nome da causa revolucionaria de libertação do povo russo. (DIAS, 2010 : 304)   Revelando um problema de mensuração quantitativa desta questão política em face ao qualitativo da natureza humana, permitindo um utilitarismo da liberdade e democracia apoiando o desenvolvimento das capacidades do cidadão. Sobre a liberdade – substrato necessário ao desenvolvimento da sociedade – a diversidade e conflito – progresso e auto reforma – que regem a reforma e o desenvolvimento social. Alimentando a defesa do pluralismo e da diversidade societal, o sistema político da modernidade se apresenta numa perspectiva aberta e multipolar.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
DIAS, André. Cadernos de Letras da UFF – Dossiê: Letras, linguística e suas interfaces no 40, p. 291-308, 2010 Os Clássicos da Política, 1 /Francisco C. Weffort, organizador. 11 ed. São Paulo. Ática, 2006. Os Clássicos da Política, 2 /Francisco C. Weffort, organizador. 11 ed. São Paulo. Ática, 2006.

 

[1]
Estudante do Bacharelado em Ciências Sociais na Universidade Federal do
Recôncavo da Bahia.

Cristiano Bodart

Doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP), professor do Centro de Educação e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal de Alagoas (Ufal). Pesquisador do tema "ensino de Sociologia". Autor de livros e artigos científicos.

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