O Poder em Foucault tem destaque relevante. Para Foucault, o poder não é simplesmente um recurso que algumas pessoas ou instituições possuem e usam para controlar outras pessoas, mas sim uma força que atravessa todas as relações sociais e que é constantemente exercida e resistida. Foucault acreditava que o poder é produzido através de práticas discursivas, ou seja, através da linguagem e do conhecimento que produzimos e compartilhamos. O poder é exercido através de discursos, normas e práticas que determinam o que é considerado verdadeiro ou correto em uma sociedade.
Por Cristiano das Neves Bodart
Diferentemente da tradição da Ciência Política, para Foucault o poder não está localizado ou centrado em uma instituição, e nem tão pouco como algo que se transmite por contratos jurídicos ou políticos. Enquanto na teoria política tradicional se atribui ao Estado o monopólio do poder, em Foucault nota-se a existência de uma espécie de rede de microfísica do poder articulado ao Estado e que atravessa toda a estrutura social. Desta forma, para ele, é importante ver como o poder se relacionam com a estrutura mais geral do poder, no caso, o Estado. Trata-se, assim, de uma leitura ascendente das relações de poder. Em suas palavras,
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Trata-se […] de captar o poder em suas extremidades, em suas últimas ramificações […] captar o poder nas suas formas e instituições mais regionais e locais, principalmente no ponto em que ultrapassando as regras de direito que o organizam e delimitam […] Em outras palavras, captar o poder na extremidade cada vez menos jurídica de seu exercício (FOUCAULT, 1979, p.182).
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É importante estarmos atentos ao fato de que Foucault não nega a importância do Estado, mas demonstra que as relações de poder ultrapassam o nível estatal e está presente por toda a sociedade, estando “dissolvida” por todo o tecido social.
O Poder em Foucault: uma rede que atravessa a vida
Quando ouvimos a palavra “poder”, é comum que pensemos em figuras políticas, cargos altos ou em alguém que comanda os outros. Contudo, para Michel Foucault, um dos maiores pensadores do século XX, essa visão é limitada e, de certa forma, enganosa. O poder, segundo ele, não é algo que se possui, como se fosse uma coroa ou um cetro. O poder é algo que circula, que atravessa as relações sociais, que se exerce mais do que se acumula.
Foucault nos convida a olhar para o cotidiano — para a sala de aula, o consultório médico, a prisão, a família, o hospital, a fábrica — e perceber que o poder está presente ali, de forma difusa, muitas vezes silenciosa. Ele está no olhar que vigia, na norma que disciplina, na palavra que classifica, no saber que organiza. Em vez de se concentrar em um único ponto ou instituição, o poder se espalha, se infiltra, se manifesta nos gestos mais sutis da vida social.
Esse pensador francês rompe com a ideia tradicional de poder como dominação de cima para baixo. Ele propõe o conceito de microfísica do poder, ou seja, um modo de pensar o poder nas pequenas engrenagens do cotidiano. A escola, por exemplo, não é apenas um espaço de aprendizagem, mas também um espaço de vigilância e controle, onde os corpos são treinados, os horários são impostos e os comportamentos são padronizados.
Outro aspecto fundamental em sua teoria é que onde há poder, há resistência. Isso significa que nenhuma forma de dominação é absoluta ou definitiva. Sempre haverá brechas, enfrentamentos, modos de escapar ou subverter o controle. E, muitas vezes, essas resistências são silenciosas, criativas, inesperadas. Podem vir de um aluno que questiona uma regra, de um doente que recusa um diagnóstico, de um corpo que desafia normas de gênero.
Além disso, Foucault nos mostra como o saber está profundamente entrelaçado com o poder. Não se trata apenas de conhecer para libertar, mas de perceber que todo saber carrega consigo uma dose de poder — porque nomeia, categoriza, define o que é normal e o que é desvio. Ao estudar as chamadas “ciências humanas”, como a psiquiatria, a pedagogia ou a criminologia, ele revela como esses campos produziram formas de controle sobre os indivíduos, mesmo quando pareciam apenas estar ajudando ou curando.
Em sua obra “Vigiar e Punir”, Foucault analisa como a sociedade moderna passou de castigos públicos e brutais para métodos de disciplina mais refinados e invisíveis. O poder deixa de ser um espetáculo e se torna um mecanismo constante de vigilância. Surge aí a figura do panóptico, um modelo de prisão onde os presos podem ser observados sem saber se estão sendo vigiados — o que os leva a se autocontrolar. Para Foucault, a sociedade contemporânea se parece com esse modelo: somos constantemente induzidos a vigiar a nós mesmos, a nos comportar, a seguir normas, mesmo sem a presença direta de alguém nos controlando.
O grande mérito do pensamento de Foucault é que ele nos tira da zona de conforto, desafia certezas e nos convida a enxergar o mundo com olhos mais críticos. Ele nos mostra que o poder não é apenas repressivo; ele também produz: produz sujeitos, comportamentos, saberes, verdades. E nos convida a perguntar: que tipo de sociedade estamos produzindo? Que formas de vida estamos normatizando? Que resistências podemos inventar?
FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. 22. ed. Tradução de Roberto Machado. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2022.
FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. 45. ed. Tradução de Raquel Ramalhete. Petrópolis: Vozes, 2021.
FOUCAULT, Michel. A ordem do discurso. 33. ed. Tradução de Laura Fraga de Almeida Sampaio. São Paulo: Loyola, 2016.
FOUCAULT, Michel. Em defesa da sociedade: curso no Collège de France (1975-1976). Tradução de Maria Ermantina Galvão. São Paulo: Martins Fontes, 2005.
RAGO, Margareth. Do cabaré ao lar: a utopia da cidade disciplinar – Brasil 1890-1930. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991.
DREYFUS, Hubert L.; RABINOW, Paul. Michel Foucault: uma trajetória filosófica. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1995.
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Nota:
* Originalmente publicado aqui em março de 2015.
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Parabéns pelo texto…direto, claro e transparente..
Texto muito bacana!!!!1
Muito claro, fácil de entender! Perfeito!
Ótimo texto!
Ótimo. Leitura muita boa.
Ótimo. Leitura muita boa.
Parabéns pelo texto, direto e bem explicativo..
Parabéns pelo texto, direto e bem explicativo..
Estudando Foucault para vestibulares, não encontrei nenhum texto realmente claro sobre sua teoria, mas esse conseguiu ser … parabéns pelo texto !!
Obrigado.