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A Sociologia como esporte de combate

A Sociologia como esporte de combate

 

Cristiano das Neves Bodart[1]

 

“Eu digo frequentemente que a sociologia é um esporte de combate, um meio de defesa pessoal. Basicamente, você pode usá-la para se defender, sem ter o direito de utilizá-la para ataques covardes.” – Pierre Bourdieu (CARLES, 2001).

 

A Sociologia foi comparada por Pierre Bourdieu a um esporte de combate. Pierre Bourdieu (1930-2002), um dos mais importantes sociólogos do século XX, fez uma analogia entre Sociologia e o esporte de combate que nos permite compreender como ele compreendia essa Ciência. Essa comparação foi título de um documentário sobre seu ofício (CARLES, 2001).

O que marca um esporte de combate é o confronto; o contato direto com o oponente. Mas por que Bourdieu fez tal analogia? Assim como um esporte de combate, a Sociologia requer habilidades específicas, como a observação cuidadosa, os dados precisos, a análise crítica, a argumentação persuasiva e a defesa das próprias ideias. Assim como em um combate, o sociólogo precisa enfrentar oposição e resistência por parte daqueles que têm interesse em manter as estruturas sociais existentes ou modificá-las de acordo com seus próprios interesses.

Bourdieu acreditava que a Sociologia deveria ser uma ferramenta de resistência contra as injustiças e desigualdades presentes na sociedade. Para ele, o papel do sociólogo é semelhante ao de um lutador, que usa seu conhecimento e habilidades para denunciar as estruturas de poder e lutar por mudanças sociais. Em suas pesquisas, Bourdieu problematizou a permanência do status quo e buscou entender por que as coisas não mudam e a quem interessa a inércia e a reprodução das desigualdades (BOURDIEU, 1970).

Ao comparar a Sociologia a um esporte de combate, Bourdieu propunha uma reflexão crítica sobre as relações de poder no mundo acadêmico e como essas relações influenciam a produção do conhecimento. Seus estudos sobre o campo acadêmico (BOURDIEU, 2003; 2004) buscavam demonstrar a lógica de manutenção dos espaços sociais ocupados, mesmo diante de uma dinâmica de disputa constante. Ele acreditava que o papel do sociólogo é mobilizar seus conhecimentos específicos para explicar os problemas sociais e políticos de seu tempo (BOURDIEU, 2004), o que muitas vezes o coloca cara a cara com seus prováveis oponentes.

A Sociologia é comparada a um esporte de combate, pois expõe as estruturas de dominação e reprodução das desigualdades sociais, o que gera muitos inimigos. Por essa razão, sua presença na educação básica é alvo de ataques. Os grupos dominantes não têm interesse que sejam formados cidadãos críticos que questionem suas próprias dominações, explorações e a estrutura social que permite a existência e manutenção dessas. O modelo neoliberal de educação presente no Brasil, ao ter seus interesses de classe desvelados, faz com que grupos empresariais se mobilizem para imprimir mudanças curriculares, como a Reforma do Ensino Médio (BUENO, 2022), como forma de excluir a presença de disciplinas críticas, como a Sociologia.

O trabalho do sociólogo é frequentemente contestado e criticado, o que exige que ele esteja ciente das estratégias utilizadas por seus oponentes e tenha habilidades para se defender delas. Quando suas teorias não são de interesse dos poderosos, elas podem ser alvo de ataques vigorosos e até mesmo práticas de silenciamento. Essa realidade é evidente na mídia, onde sociólogos que denunciam as manipulações praticadas em busca de lucro são dificilmente convidados a participar de debates ao vivo. Inclusive, um dos temas explorado por Bourdieu foi a televisão (BOURDIEU, 1997).

Para Bourdieu, a Sociologia não é uma atividade neutra e desinteressada, mas sim uma ciência crítica e política, sendo uma prática engajada e militante em prol da justiça, da igualdade e da busca pela verdade. Para ele, o objetivo da Sociologia não era apenas explicar o mundo, mas também transformá-lo.

 

Referências bibliográficas

BOURDIEU, Pierre; PASSERON, J. A Reprodução: elementos para uma teoria do sistema de ensino. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1970.

BOURDIEU, Pierre. O campo científico”. In: ORTIZ, Renato (org.). A sociologia de Pierre Bourdieu. São Paulo, Olho d’Água, 2003. pp. 112-143.

BOURDIEU, Pierre. Os Usos Sociais da Ciência: por uma sociologia clínica do campo científico. São Paulo: Editora UNESP, 2004.

BOURDIEU, Pierre. Sobre a Televisão, Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1997.

BUENO, Alana Lemos. Trajetória da política de reforma do ensino médio no Brasil (2013-2017). Maceió: Editora Café com Sociologia, 2022.

CARLES, Pierre. A Sociologia é um esporte de combate: documentário sobre Pierre Bourdieu. 2h26. 2001. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=41W3RapeK5Q

 

 

 

Como citar este texto:

BODART, Cristiano das Neves. A Sociologia como esporte de combate. Blog Café com Sociologia. fev. 2022.

 

Nota:

[1] Doutor em Sociologia (USP). Docente do Centro de Educação e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal de Alagoas (Ufal). E-mail: cristianobodart@gmail.com

 

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Cristiano Bodart

Doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP), professor do Centro de Educação e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal de Alagoas (Ufal). Pesquisador do tema "ensino de Sociologia". Autor de livros e artigos científicos.

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