Ao entrar no face, não esqueça de se despir da razão… seja um homem cordial à lá Holanda.

Ao entrar no face, não esqueça de se despir da razão… seja cordial à lá Holanda

Por Cristiano das Neves Bodart
É muito fácil encontrar no Facebook comentários elogiosos que facilmente se percebe que são apenas cordialidades, onde se vê mais emotividade do que razão, mais “coração” do que “cérebro”.Sérgio Buarque de Holanda já dizia em 1936 que o brasileiro faz um “tipo cordial”. Esse apontamento se deu por meio da observação da relações cotidianas e de análise da história colonial brasileira. Holanda usou a expressão cordial em seu sentido etimológico (palavra que vem de “coração”) para explicar a oposição entre emoção e razão. Para ele o brasileiro prefere, em suas ralações sociais, se apegar a esse sentimento do que à razão. O conceito abarca, ao contrário do que parece, aspectos negativos à vida civilizada e para uma sociedade que busca ampliar a democracia. Dentre os aspectos da cordialidade à moda brasileira estaria a tendência de  evitar o conflito aberto…. fico a imaginar se Holanda tivesse conhecido o Facebook à brasileira.

Esse aspecto de não conflitualidade é perceptível até na narração de nossa História. Temos, por exemplo, a Guerra de Canudos, que na verdade deveria ser conhecida como “o massacre de Canudos”, ou ainda, a Revolução de Trinta, que de revolução nada teve, se não mais um massacre de nossa História. Usamos comumente a
expressão “general” ao invés de “ditador” para nos referi aos “presidentes militares”, e por ai vai…
No Facebook o aspecto da cordialidade ligada a busca do não conflito é ainda mais sintomático. Adjetivos como “lindo”, “maravilhoso” e “perfeito” são usados “à torto e à direito” na busca de uma relação menos conflituosa. A racionalidade parece ser deixada de lado e as discussões praticamente inexistem.
No Facebook, o coração passa a ser o guia das conversas… Ao entrar no face, não esqueça de se despir da razão… seja cordial à lá Holanda.











Cristiano Bodart

Doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP), professor do Centro de Educação e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal de Alagoas (Ufal). Pesquisador do tema "ensino de Sociologia". Autor de livros e artigos científicos.

7 Comments

    • Concordo com você Suellen, o tema e o ambiente envolvendo as redes sociais, os posts, os comentários, os diálogos são excelentes para a construção de pesquisas e resultados. Abs,

  1. Em 2007 participei do primeiro curso a distância, quando e onde o diálogo, a opinião própria, o contraditório e a réplica passam por regras bem definidas. Além da utilização de ferramentas e recursos da Internet, os fóruns de discussão apresentam as melhores condições e situações para o ensino e aprendizado. Percebe-se claramente, quando não se está trabalhando ou utilizando a razão, os conceitos e teorias, e pretende-se apenas alcançar um resultado através da emoção. Claramente, isto também é considerado na avaliação. Mas, nessa condição o próprio estudante, usuário do sistema, percebe e constrói a sua própria avaliação. Várias outras competências e habilidades são provocadas, inclusive a empatia, a facilidade de relacionamento e descrição da própria realidade vivida. O diálogo e as discussões on-line ou em rede precisam ser aprendidos, construídos ao logo do tempo.

  2. Não há como ser Diferente.
    Esta percepção é facilmente explicada, quando se lê Zigmunt Bauman e sua ideia da Modernidade Líquida, onde as relações sociais, afetivas e cotidianas são frágeis, típicas da relação de consumo com a "espetacularizacao" das ações.

  3. Não há como ser Diferente.
    Esta percepção é facilmente explicada, quando se lê Zigmunt Bauman e sua ideia da Modernidade Líquida, onde as relações sociais, afetivas e cotidianas são frágeis, típicas da relação de consumo com a "espetacularizacao" das ações.

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