Evolução dos cursos de formação de professores de Sociologia no Brasil1934-2017)

Cursos de Ciências Sociais

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Por Cristiano das Neves Bodart[2]

Caio dos Santos Tavares[3]

Resgatando o histórico dos cursos de Ciências Sociais no Brasil, notamos que suas origens remontam à década de 1930, na Região Sudeste, incialmente em São Paulo e no Rio de Janeiro. Os dois primeiros cursos eram oferecidos, respectivamente, pela Escola Livre de Sociologia e Política de São Paulo (a partir de 1933) e pela Universidade de São Paulo (a partir de 1934). A exceção do curso da Escola Livre de Sociologia e Política de São Paulo (ELSP), que buscava formar quadros técnicos para a gestão pública e privada, os cursos existentes nos anos de 1930 objetivavam formar tanto bacharéis quanto professores de Sociologia. A localização dos cursos de Ciências Sociais da Escola Livre de Sociologia e Política de São Paulo, da Universidade de São Paulo e da Universidade Federal do Rio de Janeiro esteve relacionada à centralidade política e econômica ocupada por ambas as cidades e por concentrar ali agentes culturais, parte de uma oligarquia decadente (Miceli, 1989). […]

Até 1948 existiam no Brasil 10 Instituição de Ensino Superior (IES) ofertantes do curso de licenciatura em Ciências Sociais, sendo apenas 3 delas não localizadas no Sudeste, estando 2 no Sul e 1 na Região Nordeste […].

História das Ciências Sociais

Até o ano de 1948, 7 dos 10 cursos de licenciatura em Ciências Sociais existentes estavam na Região Sudeste. Como destacaram Bodart e Torres (2018, p.14-15), “ainda que o número de cursos públicos sobressaísse (63,6%), é notório que há uma presença considerável das instituições privadas (36,3%) na oferta de cursos de Ciências Sociais nas duas primeiras décadas de existência do curso no Brasil”. A expansão dos cursos para além da Região Sudeste deu-se em direção ao Sul, onde também havia uma concentração significativa de herdeiros da oligarquia brasileira, embora em alguns casos, tal como no Paraná, tratava-se de tentativa de resposta de grupos católicos. […]

O ano de 1961 foi marcante para a Educação brasileira, pois nessa data deu-se a aprovação da Lei nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961; a primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) brasileira. Nesse mesmo ano existiam no país 14 cursos de licenciatura em Ciências Sociais ofertados no formato “3+1” […].

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Em 1971, com a reforma do ensino, decretada por meio da Lei 5692/1971, havia mais que o dobro (29) de cursos de licenciatura em Ciências Sociais no Brasil, se comparado a 1961. Nos cartogramas 3 e 4 apresentamos a distribuição territorial desses cursos. A institucionalização da Sociologia brasileira em nível de graduação e o avanço da pós-graduação brasileira (Segatto; Bariani, 2010) colaboraram para essa expansão. Contudo, seu caráter elitista ainda presente fez com que o bacharelado continuasse sendo o foco de formação, não havendo interesse suficiente para mobilizações (políticas ou coletivas) capazes de reintroduzi-la no currículo da escola secundária. […].

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Passados 25 anos desde a Lei n° 9394/96 de reforma do ensino, o cenário político não é o mesmo de outrora. O país passava por um processo de redemocratização capitaneado pela ampliação da representatividade política (multipartidarismo) e pela nova Constituição Federal promulgada em 1988. O discurso de democratização ao acesso à Educação tornou-se mais presente.

Na LDB de 1996 a Sociologia é indicada como um conhecimento indispensável no Ensino Médio, sem, contudo, ser tratada como disciplina obrigatória. Nesse ano haviam 38 cursos de licenciatura em Ciências Sociais e 3 licenciaturas em Sociologia.

Até 1996 ao menos 10 estados brasileiros, e o Distrito Federal, já contavam com a presença da Sociologia no currículo do Ensino Médio12 (Azevedo, 2014). Eram eles: São Paulo, Pará, Acre, Rio de Janeiro, Pernambuco, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Maranhão, Amapá e Tocantins. Nota-se que até 1996 não havia curso de formação de professores nos estados do Maranhão e Amapá, mesmo já havendo documentos legais estaduais amparando a presença da disciplina de Sociologia na grade curricular nesses entes federativos. Os cartogramas 5 e 6 destacam, respectivamente, o numero de cursos por estados e Regiões brasileiras.

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É notória a expansão dos cursos de Ciências Sociais entre 1971 e 1996. Essa expansão deu-se principalmente na Região Nordeste, onde antes, em 1971, havia 5 cursos de licenciatura em Ciências Sociais e/ou em Sociologia, passou a ofertar 11 cursos em 1996. No Norte, onde se ofertava apenas um curso, notamos a ofertar 5 novos cursos. Não podemos ignorar que entre 1971 a 1996 a Região Norte teve o maior incremento demográfico percentual do país (IBGE, 2007). No Centro-Oeste a Universidade de Brasília continuava sendo a única Instituição de Ensino Superior a formar professores de Sociologia, justamente onde encontrava-se a elite político daquela Região.

A disciplina de Sociologia ao longo dos anos de 1980 e 1990 foi se tornando gradativamente uma disciplina obrigatória nos currículos de alguns estados. […].

Até o ano de 2001 eram 21 estados, mais o Distrito Federal, a possuir legislação amparando a presença da Sociologia escolar. Nesse ano Alagoas e Espírito Santo passaram a indicar a Sociologia como componente curricular do Ensino Médio (Azevedo, 2014). Nesse mesmo ano, Roraima, Rondônia, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Tocantins eram os únicos estados que não contavam com, pelo menos, um curso de formação de professores de Sociologia.

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A Sociologia tornou-se obrigatória no currículo nacional em 2008. Nesse período havia a preocupação com a possível disparidade entre o número de professores de Sociologia formados e a demanda que surgia no país. Por isso, buscamos observar quantos cursos existiam no ano de aprovação da reintrodução da Sociologia no currículo estadual. […].

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Em 2017, já havendo se passado 9 anos de reintrodução da disciplina de Sociologia enquanto componente curricularobrigatório em todo o Ensino Médio brasileiro, o número de cursos ofertados de Ciências Sociais e Sociologia era de 251 cursos (Bodart; Tavares, 2018), sendo 135 deles de formação de professores e ofertados na modalidade presencial. Os cartogramas 11 e 12 apresentam a territorialização dos cursos de Ciências Sociais e/ou Sociologia do grau licenciatura no ano de 2017.

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Observado o recorte temporal de 2008 e 2017 notamos que as maiores expansões no número de oferta de cursos de formação de professores de Sociologia ocorreram no Nordeste, como 24 novos cursos, seguido do Sul, com 18, e do Sudeste com 16. Na Região Centro-Oeste observamos a abertura de 9 cursos e no Norte apenas 1.

Apontaram Bodart e Tavares (2018) que a recente expansão dos cursos de licenciatura está relacionado diretamente a: i) reintrodução da Sociologia no Ensino Médio; ii) a legislação que recomendou o fim do modelo “3+1” de formação13 e; iii) a expansão do Ensino Superior, o que se deu a partir da atuação do Estado, seja diretamente por meio do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni) que expandiu do número de universidades e campis, seja indiretamente, por meio Programa Universidade para Todos (ProUni) e do Programa de Financiamento Estudantil (Fies); esses dois últimos programas estimularam a oferta de cursos por Instituições de Ensino Superior privadas. Não podemos olvidar que o Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (Pibid) teve um importante papel na manutenção desses cursos, uma vez que possibilitou que muitos alunos oriundos das camadas populares recebessem uma bolsa de estudos e se mantivessem na universidade. […].

A recente desconcentração dos cursos de Ciências Sociais pelo território nacional é resultado dos ideais norteadores da Constituição de 1988, da LDB, do retorno da Sociologia ao currículo escolar e da ascensão de grupos reformistas que ao chegar ao poder implantaram programas governamentais de expansão universitária, sobretudo de cursos de licenciatura, e programas de permanência de jovens oriundos das camadas populares. Se antes os cursos de Ciências Sociais eram destinados a elite, não podemos mais fazer essa inferência. A democratização a tornou em um ativo não mais escasso, reduzindo seu prestígio junto à elite, sobretudo quando os cursos passaram a voltar-se para a formação de professores do Ensino Médio. Contudo, sua expansão possibilitou que milhares de jovens passassem a ter acesso ao conhecimento sociológico (agora crítico), possibilitando-os compreender a realidade da sociedade brasileira e as relações de poder existentes (mesmo as mais sutis), o que a faz ser alvo daquela mesma elite que ontem a tinha por preciosa.

Referências Bibliográficas

AZEVEDO, Gustavo Cravo de. Sociologia no ensino médio: uma trajetória político-institucional (1982-2008). Dissertação (mestrado). Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da Universidade Federal Fluminense. 222 p. 2014.

MICELI, Sérgio. História das Ciências Sociais no Brasil. São Paulo: Vértice/IDESP/FINEP. 1989. 490 p.

BODART, Cristiano das Neves; TAVARES, Caio dos Santos. Programas de fomento a expansão do Ensino Superior e oferta de cursos de Ciências Sociais no Brasil (1999-2017). Cadernos da Associação Brasileira de Ensino de Ciências Sociais. 2 (1): 07-29. 2018.

SEGATTO, J.; BARIANI, E. 2010. As ciências Sociais no Brasil: trajetória, história e institucionalização. Revista em Pauta. 7 (25): 201-2013. 2010. pp. 238.

Como citar este texto:

BODART, Cristiano das Neves. Configurações territoriais dos cursos de formação de professores de Sociologia no Brasil (1934-2017). Blog Café com Sociologia. abr. 2016. Disponível em:< https://cafecomsociologia.com/para-parar-de-dizer-que-globalizacao-e/> Acessado em: dia mês ano.

Notas

[1] Originalmente e integralmente publicado em: http://revistas.unisinos.br/index.php/ciencias_sociais/article/view/csu.2019.55.2.10

[2] Doutor em Sociologia (USP) e professor do Programa de Pós-Graduação em Sociologia (PPGS) e do Centro de Educação (CEDU) da Universidade Federal de Alagoas (UFAL). Editor do Blog Café com Sociologia.

[3] Mestrando em Sociologia pela Universidade Federal de Alagoas (UFAL).

Cristiano Bodart

Doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP), professor do Centro de Educação e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal de Alagoas (Ufal). Pesquisador do tema "ensino de Sociologia". Autor de livros e artigos científicos.

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