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  • O Poder em Foucault: a noção de poder para o filósofo francês

    O Poder em Foucault: a noção de poder para o filósofo francês

    O Poder em Foucault tem destaque relevante. Para Foucault, o poder não é simplesmente um recurso que algumas pessoas ou instituições possuem e usam para controlar outras pessoas, mas sim uma força que atravessa todas as relações sociais e que é constantemente exercida e resistida. Foucault acreditava que o poder é produzido através de práticas discursivas, ou seja, através da linguagem e do conhecimento que produzimos e compartilhamos. O poder é exercido através de discursos, normas e práticas que determinam o que é considerado verdadeiro ou correto em uma sociedade.

    Por Cristiano das Neves Bodart

    Primeiramente é importante compreender que Foucault não buscou apresentar uma Teoria do PODER, mas apontou caminhos para identificar de que forma os sujeitos atuam sobre os outros sujeitos. Ele preferia chamar de “cuidados metodológicos” ou perspectiva analítica, mas não uma teoria com “T” maiúsculo.

    Diferentemente da tradição da Ciência Política, para Foucault o poder não está localizado ou centrado em uma instituição, e nem tão pouco como algo que se transmite por contratos jurídicos ou políticos. Enquanto na teoria política tradicional se atribui ao Estado o monopólio do poder, em Foucault nota-se a existência de uma espécie de rede de microfísica do poder articulado ao Estado e que atravessa toda a estrutura social. Desta forma, para ele, é importante ver como o poder se relacionam com a estrutura mais geral do poder, no caso, o Estado. Trata-se, assim, de uma leitura ascendente das relações de poder. Em suas palavras,

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    Trata-se […] de captar o poder em suas extremidades, em suas últimas ramificações […] captar o poder nas suas formas e instituições mais regionais e locais, principalmente no ponto em que ultrapassando as regras de direito que o organizam e delimitam […] Em outras palavras, captar o poder na extremidade cada vez menos jurídica de seu exercício (FOUCAULT, 1979, p.182).

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    É importante estarmos atentos ao fato de que Foucault não nega a importância do Estado, mas demonstra que as relações de poder ultrapassam o nível estatal e está presente por toda a sociedade, estando “dissolvida” por todo o tecido social.

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    Para Foucault o poder é uma prática social constituída historicamente. São formas díspares, heterogêneas, em constante transformação. Constata Foucault que o poder está por toda parte e provoca ações e uma relação flutuante, não estando em uma instituição nem em ninguém. Não está no rei, no presidente, em uma pessoa, mas nas relações sociais existentes, sendo ações sobre ações.
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    Foucault aborda arte de governar por duas óticas: ascendente e descendente.  Na ótica ascendente, Foucault (1979, p.281) afirma que “aquele que quer poder governar o Estado deve primeiro saber se governar, governar a sua família, seus bens, seu patrimônio”. Com relação a ótica descendente nota-se que “quando o Estado é bem governado, os pais de família sabem governar suas famílias, seus bens, seu patrimônio e por sua vez os indivíduos se comportam como devem”.
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    As relações de poder, seja pelas instituições, escolas, prisões, foram marcadas pela disciplina e por ela que as relações de poder se tornam mais facilmente observáveis, pois é por meio da disciplina que estabelecem as relações: opressor-oprimido, mandante-mandatário, subordinador-subordinado, etc. Trata-se de uma relação assimétrica que institui a autoridade e a obediência, e não como um objeto preexistente em um subordinador. Trata-se de uma concepção do poder que se irradia da periferia para o centro, de baixo para cima, que se exerce permanentemente, dando sustentação à autoridade.
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    Desta forma, o poder em Foucault é um conjunto de relações que produz assimetrias e age de forma permanente, se irradiando de baixo para cima, sustentando as instâncias de autoridade, sobretudo os “poderes” instituídos do Estado.

    O Poder em Foucault: uma rede que atravessa a vida

    Quando ouvimos a palavra “poder”, é comum que pensemos em figuras políticas, cargos altos ou em alguém que comanda os outros. Contudo, para Michel Foucault, um dos maiores pensadores do século XX, essa visão é limitada e, de certa forma, enganosa. O poder, segundo ele, não é algo que se possui, como se fosse uma coroa ou um cetro. O poder é algo que circula, que atravessa as relações sociais, que se exerce mais do que se acumula.

    Foucault nos convida a olhar para o cotidiano — para a sala de aula, o consultório médico, a prisão, a família, o hospital, a fábrica — e perceber que o poder está presente ali, de forma difusa, muitas vezes silenciosa. Ele está no olhar que vigia, na norma que disciplina, na palavra que classifica, no saber que organiza. Em vez de se concentrar em um único ponto ou instituição, o poder se espalha, se infiltra, se manifesta nos gestos mais sutis da vida social.

    Esse pensador francês rompe com a ideia tradicional de poder como dominação de cima para baixo. Ele propõe o conceito de microfísica do poder, ou seja, um modo de pensar o poder nas pequenas engrenagens do cotidiano. A escola, por exemplo, não é apenas um espaço de aprendizagem, mas também um espaço de vigilância e controle, onde os corpos são treinados, os horários são impostos e os comportamentos são padronizados.

    Outro aspecto fundamental em sua teoria é que onde há poder, há resistência. Isso significa que nenhuma forma de dominação é absoluta ou definitiva. Sempre haverá brechas, enfrentamentos, modos de escapar ou subverter o controle. E, muitas vezes, essas resistências são silenciosas, criativas, inesperadas. Podem vir de um aluno que questiona uma regra, de um doente que recusa um diagnóstico, de um corpo que desafia normas de gênero.

    Além disso, Foucault nos mostra como o saber está profundamente entrelaçado com o poder. Não se trata apenas de conhecer para libertar, mas de perceber que todo saber carrega consigo uma dose de poder — porque nomeia, categoriza, define o que é normal e o que é desvio. Ao estudar as chamadas “ciências humanas”, como a psiquiatria, a pedagogia ou a criminologia, ele revela como esses campos produziram formas de controle sobre os indivíduos, mesmo quando pareciam apenas estar ajudando ou curando.

    Em sua obra “Vigiar e Punir”, Foucault analisa como a sociedade moderna passou de castigos públicos e brutais para métodos de disciplina mais refinados e invisíveis. O poder deixa de ser um espetáculo e se torna um mecanismo constante de vigilância. Surge aí a figura do panóptico, um modelo de prisão onde os presos podem ser observados sem saber se estão sendo vigiados — o que os leva a se autocontrolar. Para Foucault, a sociedade contemporânea se parece com esse modelo: somos constantemente induzidos a vigiar a nós mesmos, a nos comportar, a seguir normas, mesmo sem a presença direta de alguém nos controlando.

    O grande mérito do pensamento de Foucault é que ele nos tira da zona de conforto, desafia certezas e nos convida a enxergar o mundo com olhos mais críticos. Ele nos mostra que o poder não é apenas repressivo; ele também produz: produz sujeitos, comportamentos, saberes, verdades. E nos convida a perguntar: que tipo de sociedade estamos produzindo? Que formas de vida estamos normatizando? Que resistências podemos inventar?

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    Referência 

    FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. 22. ed. Tradução de Roberto Machado. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2022.

    FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. 45. ed. Tradução de Raquel Ramalhete. Petrópolis: Vozes, 2021.

    FOUCAULT, Michel. A ordem do discurso. 33. ed. Tradução de Laura Fraga de Almeida Sampaio. São Paulo: Loyola, 2016.

    FOUCAULT, Michel. Em defesa da sociedade: curso no Collège de France (1975-1976). Tradução de Maria Ermantina Galvão. São Paulo: Martins Fontes, 2005.

    RAGO, Margareth. Do cabaré ao lar: a utopia da cidade disciplinar – Brasil 1890-1930. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991.

    DREYFUS, Hubert L.; RABINOW, Paul. Michel Foucault: uma trajetória filosófica. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1995.

     

     

    Versão em PDF AQUI

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    Nota: 

    * Originalmente publicado aqui em março de 2015.

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  • O preço da gasolina e as questões ambientais

    O preço da gasolina e as questões ambientais

    Por Rodolfo Lobato (UFPR)

    Catástrofe ambiental e o preço da gasolina, qual a relação? Será o fim dos tempos ou apenas um indício de que o nosso salário ficará mais distante do fim do mês? É muito comum economistas e jornalistas reproduzirem acriticamente a imagem e a ideia da elevação do preço dos combustíveis como um fatalismo, um risco de inflação generalizada à mercê da “vontade” de um sujeito oculto: o mercado. De outra perspectiva, há um sinal de mudanças – por vezes ignorado – de que esses preços podem significar pistas de um problema mais grave: de que as mudanças climáticas começam a de fato pesar em nosso bolso. Na reflexão a seguir, tentarei estabelecer uma correspondência entre os preços da gasolina e uma proposta que está sendo esboçada, o Green New Deal Global.

    Há culpados?

    As ações humanas, desde a segunda metade do século XX, criaram um cenário de “grande aceleração” nas transformações ambientais, em que os combustíveis fósseis, se explorados até o fim podem significar uma ameaça à vida humana na Terra. Mas isso é uma hipótese que é acompanhada de um fato: o impacto devastador da atividade humana e o elevado grau de incertezas para o planeta. Essa falta de previsibilidade faz parte do fenômeno de mudanças climáticas em curso. Nesse sentido, falar que os combustíveis fósseis são finitos, e que os preços se elevarão na proporção da redução da oferta não é uma questão apenas matemática, essa discussão envolve projetos políticos, sonhos, medos e utopias. Como viver num planeta em que os combustíveis fósseis serão escassos ou limitados diante de seus efeitos imprevisíveis, tendo em vista o “efeito estufa” e as catástrofes climáticas?

    Muitos cientistas e ambientalistas já apontam alguns caminhos. Há, por exemplo, quem defenda uma “taxação sobre combustíveis fósseis”, ou seja, uma elevação de preços programada, de forma que estimule governos, empresas e órgãos multilaterais para direcionar os investimentos em energias limpas, inovação e eficiência energética. Mesmo assim, as petrolíferas, sejam estatais ou privadas, usarão todos os seus recursos para extrair mais lucros em menos tempo. A existência de tendências suicidas da economia (conduzida por atores privados ou públicos) exige uma mudança em termos de valores culturais, fortalecimento de instituições, maior transparência dos agentes e controle social mais eficiente em nível global.

    Há saída para o problema?

    O reconhecimento de que os processos de mercado e os Estados nacionais não resolverão os problemas ambientais é um primeiro passo para compreender nossos desafios. E que mesmo dentro das lógicas do capitalismo há uma previsível perda de valor dos ativos em combustíveis fósseis nas próximas três décadas, o que implicará num movimento de acionistas para se desfazer das ações e aplicar dinheiro em outros lugares. Algo similar ao que aconteceu nas vésperas do fim da escravidão, ou na década anterior à II Guerra Mundial, como apontam as reflexões conduzidas por Noam Chomsky e Robert Pollin em seu livro “Crise Climática e o Green New Deal Global” (2020).

    Para esses autores, o Green New Deal Global deveria ser pensado como uma “apólice de seguro” para nos proteger. Há uma mudança em curso, não temos certeza absoluta do que acontecerá, mas sabemos que o mundo que conhecemos é impossível de continuar como está. A taxação de carbono teria o efeito imediato de aumentar os preços dos combustíveis fósseis. Com isso, os autores esperam um desestímulo ao consumo, incentivos à eficiência energética, e, ao mesmo tempo, uma nova fonte de receitas para os governos. Diante de uma imediata visão de colapso da vida como a conhecemos, o professor de economia norte-americano Robert Pollin reforça um ponto que é uma das principais preocupações contemporâneas, o desemprego, e adverte:

    “A ideia de que construir uma economia verde pode gerar novos empregos deveria ser intuitiva, embora muitas vezes as coisas sejam retratadas de maneira diametralmente oposta…” (op.Cit, p. 149)

    Mesmo diante de tais expectativas, e os autores explicitam esse debate, o aumento dos combustíveis fósseis afetará aqueles com menores rendas. Eis uma das principais preocupações: como enfrentar as consequências distributivas negativas? Construir uma economia verde implicará, necessariamente, em novos investimentos em grande escala. Para responder à previsível perda das famílias mais pobres, eles indicam a construção de um processo de transferência de renda Global, algo em torno de uma renda mínima mundial de US$60.

    Entre as propostas de Chomsky e Pollin (2020), destacamos: (a) o imposto sobre o carbono, em que 75% da receita seria restituída à população e os outros 25% seriam direcionados para projetos de investimento em energia limpa; (b) uma transferência de recursos dos orçamentos militares de todos os países, sobretudo dos Estados Unidos; (c) um programa de empréstimos de Títulos Verdes lançado pelos Bancos Centrais; (d) a erradicação de todos os subsídios a combustíveis fósseis existentes e o redirecionamento de 25% desses fundos para investimentos em energia limpa. Seriam realistas essas propostas? Noam Chomsky responde: “O que será ‘realista’ depende em parte de como escolhemos agir” (op.Cit., p. 99). E, mais adiante, Robert Pollin complementa:

    “…decerto não é realista esperar que tudo isso seja feito por investimentos do capital privado. Também é pouco realista esperar que os empreendimentos públicos sozinhos possam dar conta de um projeto dessa magnitude e com a velocidade necessária. Ainda assim, a implementação do Green New Deal servirá de força motriz para transformar o capitalismo, afastando-o de seu atual interregno entre o neoliberalismo e o neofascismo.” (op. Cit., p.103).

    Voltando ao problema inicial dessa reflexão, será que todo aumento de preços da gasolina é uma fatalidade negativa? Vale enfatizar que, no livro “Crise Climática e o Green New Deal Global”, os autores concebem uma taxação de US$20 por tonelada de carbono para 2024. Dado os níveis atuais de emissão de CO2, o cálculo para tal proposta, no preço final do consumidor norte-americano, significará apenas que a cada US$1 de taxação de carbono aumente 1 centavo de dólar no preço do galão de gasolina (ou seja, um centavo de dólar para cada 3,6 litros de gasolina). E pergunto, qual o custo de uma completa ausência de política estratégica para as questões ambientais, energéticas e econômicas? A resposta é fácil, veja a evolução no preço dos combustíveis no Brasil em 2021 e, no final, faça o cálculo do quanto está disposto a pagar, individual e coletivamente.

    Referência:

    CHOMSKY, Noam; POLLIN, Robert. Crise climática e o Green New Deal global: a economia para salvar o planeta. Rio de Janeiro: Roça Nova, 2020.

     

    Nota:
    • Docente do Departamento de Sociologia da Universidade Federal do Paraná.
  • Ep010 Podcast Café com Sociologia – Diversidade cultural

    Ep010 Podcast Café com Sociologia – Diversidade cultural

    Podcast Café com Sociologia

    Episódio 010 – Diversidade cultural

    Por Cristiano Bodart e Roniel Sampaio-Silva

    Saudações sociológicas! Este é mais um episódio do Podcast Café com Sociologia. Desta vez lhe convidamos a refletir sobre diversidade cultural e questões relativas a ela. Cabe lembrar que diversidade cultural é um dos 15 temas contemporâneos transversais da BNCC, enquadrando-se na macroárea denominada multiculturalismo. Para início de conversa, diversidade cultural diz respeito as variedades de culturas, as quais se manifestam por meio da linguagem, da organização social, da culinária, do lazer, da música, da religião, dos meios e formas de produção, e muitos outros elementos criados e dotados de significados pelos homens e pelas mulheres.

    Não deixe de ouvir o podcast na íntegra! Confira! 

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  • Ep009 Podcast carnaval, malandros e heróis*

    Ep009 Podcast carnaval, malandros e heróis*

    Podcast carnaval, malandros e herois é uma produção da podosfera que nos divertimos ao produzir. Usando a sociologia e a música, convidamos você para um breve retrospecto histórico a fim de conseguirmos compreender a relação entre carnaval e cultura brasileira.

    O Carnaval é uma festa popular que acontece anualmente em várias cidades e países do mundo, especialmente na América Latina, Caribe e Europa. É conhecido por suas músicas animadas, danças, fantasias coloridas e desfiles de rua.

    O Carnaval tem raízes históricas que remontam aos antigos festivais romanos e gregos, que celebravam o início da primavera. Na Europa medieval, o Carnaval era uma época de excessos e descontração antes da Quaresma, quando os cristãos se abstinham de carne e outros prazeres mundanos. Com o tempo, o Carnaval foi se espalhando pelo mundo e adquirindo características próprias em cada lugar.

    No Brasil, o Carnaval é especialmente famoso e tem uma tradição de mais de 100 anos. É celebrado principalmente no Rio de Janeiro, mas também acontece em outras cidades do país, como São Paulo, Recife e Salvador. O Carnaval carioca é conhecido por suas escolas de samba, que são grupos de dança e música que desfilam pelo sambódromo, um espaço especialmente construído para os desfiles. As escolas de samba se esforçam muito para criar fantasias luxuosas e coreografias elaboradas para impressionar o júri e o público.

    Além das escolas de samba, o Carnaval também é marcado por blocos de rua, que são grupos informais de pessoas que se reúnem para dançar e cantar pelas ruas. Os blocos são muito populares entre os jovens e costumam tocar músicas tradicionais do Carnaval, como samba, frevo e axé.

    Outra tradição do Carnaval brasileiro é o uso de fantasias coloridas e criativas. As pessoas podem se fantasiar de personagens famosos, animais ou até mesmo criaturas fictícias. O objetivo é se divertir e deixar de lado as preocupações do dia a dia por um tempo.

    O Carnaval é uma época de muita alegria e celebração, mas também pode ser bastante cansativo, já que as festividades geralmente duram vários dias. No final, muitas pessoas ficam exaustas, mas também cheias de memórias inesquecíveis e prontas para se preparar para o próximo ano.

    Podcast Café com Sociologia

    Episódio 009 – Carnaval, malandros e heróis

    Por Cristiano Bodart e Roniel Sampaio-Silva

    Saudações sociológicas! Podcast Café com Sociologia trouxe uma temática da ordem do dia para comemorar  “10 anos do Blog Café com Sociologia“, blog editado por Cristiano Bodart e Roniel Sampaio-Silva.

    Neste podcast carnaval, malandros e herois trazemos o tema, o que fazemos sob abordagens sociológica e antropológica acompanhadas de diversas músicas que nos ajuda a entender essa manifestação cultural. Esperamos que curtam este episódio recheado de reflexões, além de um pouca da história dessa festa popular.

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    Nota:

    *Publicado originalmente em 25 de fevereiro de 2019

  • O que é Tecnologia Social?

    O que é Tecnologia Social?

    O que é Tecnologia Social?[1]

    Raquel Folmer Corrêa[2]

    Raquel Folmer Corrêa - Tecnologia Social
    Raquel Folmer Corrêa e uma das autoras do livro “Conceitos e categorias do ensino de Sociologia, vol.2” (2021)

    Você pode se perguntar: por que tal conceito está em um livro de Sociologia? Tecnologia não é assunto das Engenharias? Veja bem, será que passamos um dia sem escutar a palavra “Tecnologia”? A Sociologia tem se dedicado a elaborar explicações científicas que nos ajudem a compreender de modo crítico as diferentes dimensões de análise da Tecnologia.

    O texto, publicado no livro Conceitos e Categorias do ensino de Sociologia, vol.2 (CORRÊA, 2021), mostra como Tecnologia Social e Tecnologia se constituem como atividades humanas voltadas à prática. Elas dizem respeito a processos e fenômenos socialmente organizados que estão fortemente imbricados com as relações sociais que vivenciamos em nosso cotidiano. Portanto, podemos entender que a Tecnologia é elaborada e desenvolvida em sociedade por sujeitos específicos em determinados momentos históricos e faz parte de nossas relações sociais.

    No contexto do capitalismo, o conceito aqui debatido vai ser pensado como contraponto à Tecnologia Convencional (capitalista) de modo a considerar os desejos e as necessidades básicas de sujeitos em situação de vulnerabilidade social. Teoricamente, ela considera a participação coletiva no seu processo de organização, desenvolvimento e implantação, além de estar baseada na disseminação de soluções para problemas voltados a demandas sociais concretas.

    Você tem aqui um convite para refletir sobre como podemos perceber que a Tecnologia, como atividade social, faz parte do nosso cotidiano e que a Tecnologia Social está a nossa disposição como ferramenta que pode ser utilizada para a transformação social, inclusive na escola.

    Portanto, esse tipo de tecnologia deve ser compreendido, estranhado, desnaturalizado, aperfeiçoado e desenvolvido segundo nossas necessidades. Importa, sobretudo, que tenhamos um olhar sociológico e, portanto, crítico para que esse instrumento analítico sirva à emancipação social em uma sociedade igualitária e justa.

     

    Referência

    CORRÊA, Raquel Folmer. O que é Tecnologia Social. In: BODART, Cristiano das Neves (Org.). Conceitos e categorias do ensino de Sociologia, vol.2. Maceió: Editora Café com Sociologia, 2021. pp.113-118.

    Como citar este texto:

    CORRÊA, Raquel Folmer. O que é Tecnologia Social. Blog Café com Sociologia. mar. 2021. Disponível em: < https://cafecomsociologia.com/tecnologia-social/>.

    Notas

    [1] Texto derivado de verbete publicado em “Conceitos e categorias do ensino de Sociologia” (2021).

    [2] Doutora em Educação Científica e Tecnológica. Docente do IFRS.

     

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    Conceitos e categorias do ensino de Sociologia

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  • Rap e ensino de Sociologia

    Rap e ensino de Sociologia

    Compartilhamos uma monografia, de autoria de Adriano Cezario Assis, apresentada ao Programa de Pós-Graduação Lato Senso em Ciências Sociais e Educação Básica da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Nela encontrará uma discussão em torno do uso de letras de músicas no ensino de Sociologia, mais especificamente de Rap. Segue o resumo seguindo seguido de link para baixar a monografia.

     

    Contribuições do Rap para o ensino de Sociologia: conectando juventudes e conteúdos sociológicos.

    Resumo

    Este trabalho tem como intenção analisar as possibilidades do uso do gênero musical Rap para o ensino de Sociologia no Ensino Médio, apontando suas possíveis contribuições como recurso didático. O Rap com seu viés politizador e contestador, possui em suas letras conceitos e questionamentos inerentes às Ciências Sociais, o que possibilita sua interface com o ensino de conteúdos Sociológicos no Ensino Médio. Sua utilização como ferramenta pode dinamizar as aulas e atrair a atenção dos estudantes por se tratar de uma forma alternativa para aprender os conteúdos Sociológicos, considerando que este é um gênero musical frequentemente consumido por eles. Esse recurso didático é compreendido aqui, como uma ferramenta auxiliadora no ensino da disciplina, e não pretende substituir outras ferramentas já existentes. Ou seja, o educador deve utilizá-lo como um elo entre o ensino das teorias e dos conteúdos Sociológicos e o entendimento do aluno, trazendo sempre o arcabouço teórico para o qual o recurso deve contribuir. O Rap, por ser uma dimensão do vivido, e os fundamentos que o impulsionam serem extraídos do cotidiano, é uma ferramenta em potencial para ensinar Sociologia, pois, ao trazer nas suas letras elementos como: desigualdades sociais, racismo, violência, identidade, cultura, entre outras coisas, se torna um instrumento pedagógico articulador da relação ensino-aprendizagem. Apresento também, ancorado no conceito de habitus, como o Rap produz linguagem própria e a sua contribuição para a construção da identidade social dos jovens, na vivência da sua condição juvenil, condição esta, também discutida e explorada neste texto. O presente trabalho está dividido em dois momentos: revisão bibliográfica e aplicação de questionários. Na pesquisa bibliográfica menciono a contribuição de autores que pensaram e estudaram a possibilidade do uso desse recurso para ensinar Sociologia, disciplina na qual ainda é pouco utilizado. Já a aplicação dos questionários, foi feita em uma escola Estadual do Rio de Janeiro e teve como objetivo saber o que pensam os alunos sobre o uso desse recurso nas aulas de Sociologia. Este trabalho está submetido ao curso de Especialização Saberes e Práticas da Educação Básica, com ênfase no ensino de Sociologia (CESPEB), oferecido pela Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro, realizado entre os anos de 2019 e 2020.

    Palavras-chave: Sociologia. Rap. Recurso didático. Ensino de Sociologia.

     

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  • Currículo Lattes: o apagão e o desmonte da ciência, tecnologia e inovação

    Currículo Lattes: o apagão e o desmonte da ciência, tecnologia e inovação

    O apagão do Currículo Lattes e o desmonte da ciência, tecnologia e inovação no Brasil

    Por Leonardo de Araújo e Mota

    Recentemente houve outro apagão da ciência no Brasil, quando caiu o sistema do currículo lattes na plataforma do CNPq, o qual não foi ainda reestabelecido enquanto escrevo essas linhas. O sistema de Currículo Lattes é um rico banco de dados de informações sobre a trajetória pessoal, profissional científica e tecnológica do Brasil com quase 5 milhões de currículos registrados desde seu lançamento em 1999 por meio da Plataforma Lattes na Internet, com imensa importância para o ingresso no mercado de trabalho e para quem pretende seguir carreira acadêmica. Na maioria dos casos ele serve de pré-requisito para candidatos que disputam bolsas de pesquisas, financiamento de projetos, concursos e outros tipos de processos seletivos. O Currículo Lattes registra o que se produz cientificamente em âmbito nacional auxiliando, de forma insubstituível, a gestão da Ciência, Tecnologia e Inovação do país.

    Leonardo
    Leonardo de Araújo e Mota
    Doutor em Sociologia pela Universidade Federal do Ceará (UFC)
    Professor da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB)

     

    A percepção da população brasileira acerca do papel da ciência e tecnologia na sociedade na média é muito rasteira, quando não alheia ou preconceituosa. Ao contrário daqueles que defendem a ideia de que a ciência não passa de uma atividade meramente utilitária e que por isso deve ser financiada pelo capital privado, pois os agentes estatais possuem uma “ineficiência inata” em dirigir essa atividade – mesmo que os rankings das universidades atestem o contrário – os países desenvolvidos sempre tiveram aportes estatais no desenvolvimento de suas bases científicas e tecnológicas. Aqui os cortes são constantes.

     

    Durante a recessão que se seguiu logo após a crise de 2008, ao invés de reduzir os orçamentos destinados à ciência, tecnologia e inovação, países como os Estados Unidos e a China praticamente dobraram os investimentos estatais nesse setor, mesmo em cenários de restrições nas contas públicas. Na contramão dessa lógica, quando os efeitos da crise de 2008 se abateram sobre a economia brasileira no período de 2014-2015, o Ministério da Educação foi o mais atingido dos então 39 ministérios, com cortes de gastos equivalentes a R$ 7 bilhões de reais em 2015. Por outro lado, para gastos com a dívida pública, ou seja pagar dívidas junto ao sistema financeiro, foram reservados R$ 1,3 trilhão. Desde então, o arrocho em direção ao atraso e à ignorância tornou-se persistente. Em 2013, os recursos para o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações chegou a superar os 11 bilhões de reais, caindo progressivamente para menos de 2 bilhões em 2021.

     

    No Brasil, o percentual de empresas que inovaram em produtos ou processos caiu de 36% em 2014 para 33,6% em 2017 em decorrência desse cenário desalentador. Bolsas de mestrado e doutorado para formar novos cientistas estão com seus valores congelados há anos e sofreram vários cortes. Já as bolsas de pós-doutorado, que permitem pesquisadores promissores engajar-se em grupos de pesquisa nacionais e internacionais que eram de 580 em 2018, caíram para 123 em 2021.

     

    gráfico redução recursos ciência no Brasil

    Para o sistema “não afundar de vez”, as Fundações Estaduais de Pesquisa tornaram-se protagonistas diante do recuo do governo federal. E a despeito dos cortes de recursos, os cientistas brasileiros ainda conseguiram manter um bom nível de produção científica, passando de 78 para 80,4 mil artigos científicos entre 2018 e 2019. O número de grupos de pesquisa aumentou 149% entre 2002 e 2016, tendo nesse período o contingente de pesquisadores com nível de doutorado aumentado em 278%. Mas que não se engane o leitor: tal desempenho tem o seu preço. Inúmeras pesquisas realizadas em universidades brasileiras entre estudantes de pós-graduação, professores e pesquisadores comprovaram um alto nível de adoecimento psíquico entre essas categorias. E pior: esse assunto é muitas vezes ocultado nas próprias Universidades e os professores que comunicam o seu sofrimento são aconselhados a “normalizar” suas emoções, posicionando-as como uma questão meramente individual, psiquiátrica ou jurídica.

    A educação não caminha sem a industrialização, a qual também é incapaz de modernizar-se sem investir em ciência, tecnologia e inovação. Nosso sistema ficou muito fragilizado com os sucessivos cortes de recursos. Na América do Norte, por sinal, sopram outros ventos…

    Não obstante a crise da pandemia, o recém eleito presidente Joe Biden anunciou um plano arrojado de incremento dos investimentos estatais em ciência e tecnologia nos Estados Unidos, revalorizando esse setor após a quebra dessa tradição pelo ex-presidente Donald Trump. Para o orçamento de 2022, Biden sinalizou um aumento de 20% de verbas para a National Science Foundation (NSF), principal agência de fomento da ciência do país. Um acordo bipartidário propõe ainda a criação de um departamento de tecnologia e inovação na NSF, com investimento de mais de US$ 100 bilhões nos próximos cinco anos em pesquisa básica e aplicada. Para os países desenvolvidos, historicamente o Estado assumiu os riscos do empreendedorismo para estimular a inovação, isso é fato corriqueiro.

    Enquanto as nações mais desenvolvidas não medem esforços em situar o Estado como agente estratégico no fomento da ciência e tecnologia, a miopia da maioria de nossos políticos condena nossos jovens a restringirem seus futuros a empregos precários, de baixa qualificação e produtividade muito aquém do que se poderia alcançar com uma política consistente e duradoura de industrialização vinculada à ciência, tecnologia e inovação. A ciência não serve apenas para construir foguetes espaciais. Cientistas sociais bem capacitados poderiam efetuar pesquisas junto à comunidades de várias regiões brasileiras e, identificando suas potencialidades, para criar políticas específicas de ciência, tecnologia e inovação que poderiam gerar bons retornos econômicos e sociais a partir da produção de diversos produtos tecnológicos de alto valor agregado.

    Um jovem brasileiro desfrutando de educação de qualidade e usufruindo do resultado de bons programas de ciência, tecnologia e inovação não viveria em contínua condição de precariedade material e existencial sendo coagido a viver sob a lógica da “uberização”, informalidade ou dependendo de empregos formais, porém insalubres e instáveis. Esse mesmo jovem poderia ser treinado para trabalhar em indústrias de alta tecnologia. Nosso problema não é incapacidade intelectual de nossa juventude, mas a ausência de estímulos concretos para que ela se desenvolva satisfatoriamente. É por isso que o Brasil tem sua história marcada por constantes crises econômicas, desigualdades e instabilidade política crônica.

    Uma nação que trata mal os seus cientistas não está apenas sendo injusta com uma categoria em detrimento de outra. Muitas pesquisas no Brasil são abortadas em sua melhor fase em decorrência da instabilidade nos orçamentos, muitos são os esforços desperdiçados. Nos países desenvolvidos é seguro dar continuidade a uma pesquisa por décadas em virtude da estabilidade de verbas de financiamento. No Brasil, por sua vez, as instituições científicas são muitas vezes desacreditadas por muitos gestores públicos que não lhes proporcionam as mínimas condições para o seu funcionamento.

    Atualmente tornou-se rotineiro em nosso país um museu ou laboratório incendiar-se em decorrência da ausência de mínimos cuidados com equipamentos de prevenção a incêndios. O apagão da plataforma do Currículo Lattes é apenas mais um desses lamentáveis episódios. A ciência não pode ser vista como algo estranho à sociedade ou uma prática elitista. Essa interpretação é consequência da falência de nosso sistema educacional como um todo. A perpetuação da ignorância costuma ser muito útil aos demagogos, por isso é sempre ficar atento antes que a última luz se apague.

  • Hora de escolher do livro didático! E agora? Dicas para orientar sua escolha

    Hora de escolher do livro didático! E agora? Dicas para orientar sua escolha

    livros didáticos: dicas de como escolher

    Por Cristiano Bodart*
    Primeiramente é importante fica atento que a  escolha do livro didático é por escola. Não deixe os burocratas de plantão enfiar “goela abaixo” uma escolha do livro por região, área, grupo de escola ou coisa do tipo, sobretudo se a realidade social for diversa. Não deixe a escola perder o protagonismo na PNLD!
     
    O protagonismo da escola contribuirá para um ensino mais próximo da realidade de seu estudantes.
     
    Deixo aqui algumas dicas para a escolha do livro:
     
    1. Observem se a linguagem e o tamanho dos textos estão adequados aos seus discentes;
     
    2. Veja se as atividades propostas são realizáveis pelos/as estudantes e se na sua escola há condições de executá-las;
     
    3. Veja se o livro contempla um volume considerável de conceitos e teorias básicas da Sociologia de forma contextualizada, indicando suas contribuições contemporâneas;
     
    4. Observe se os temas presentes são atuais e significativos para os/as estudantes;
     
    5. Veja se a estética da diagramação torna a leitura agradável e atraente;
     
    6. Observe a variedade de atividades propostas;
     
    7. Note se o livro faz conexões com outras áreas do saber e se essas conexões são possíveis de serem efetivadas, inclusive no desenvolvimento de parceria com outras disciplinas e professores/as de sua escola;
     
    8. Veja se o livro propõe ações para além da sala de aula, sobretudo propostas de ensinar Sociologia também por meio de pesquisas (de vários tipos);
     
    9. Note se o livro indica material de aprofundamento dos conteúdos estudados (Filmes, sites, blogs, revistas, livros, etc.);
     
    10. Observe as indicações de uso de diferentes recursos didáticos e se os mesmos são acessíveis e de possível uso na sua escola;
     
    11. Seja se os conteúdos despertam a curiosidade dos/as estudantes na buscar por mais informações e conhecimentos.
    .
    .
    .
    –> Lembre-se,
     
    1. o livro didático é para os/as estudantes. Portanto, deve ser escolhido o melhor para eles e não para o/a professor/a;
     
    2. não escolha o livro que proporcionaria as aulas dos sonhos de qualquer professor, mas livros com propostas aplicáveis em sua escola;
    3. O melhor livro para uma escola não é, necessariamente, o melhor para todas as escolas. Portanto, perguntar a colegas que vivem outras realidades pode não ajudar muito nessa hora.
     10
    * Doutor em Sociologia (USP),  docente formador de professores de Sociologia da Universidade Federal de Alagoas (Ufal).
  • Ensino de Humanidades: entre a valorização e a desvalorização*

    Ensino de Humanidades: entre a valorização e a desvalorização*

    Cristiano das Neves Bodart

    O conhecimento de Humanidades já foi visto com um capital cultural importante pela elite, isso por proporcionar distinção social aos seus filhos. Ainda que compreendido como “não utilitário”, o ensino escolar de Humanidades foi amplamente defendido até primeira metade do século XX. Na época os conhecimentos de Humanidades eram acessados por apenas uma parte privilegiada da sociedade que cursava o ensino secundário brasileiro. Tratava-se de disciplinas que proporcionavam distinção social. Conhecer as obras de Platão, Aristóteles era algo para poucos, por isso seu caráter distintivo.

    O ensino das Humanidades foi mobilizado ao longo de nossa história como instrumento de dominação, de manutenção da ordem, de produção de “heróis nacionais” e de fortalecimento de um nacionalismo benéfico os “donos do poder” econômico e político. Seus conteúdos e abordagens reforçavam o status quo. É ampla a bibliografia que destaca o uso do conhecimento de Humanidades na produção de um imaginário social, seja por meio de compêndios, textos literários ou mesmo manuais escolares. Podemos destacar a obra de José Murilo de Carvalho (1990), na qual o leitor encontrará apontamentos nessa direção, ou ainda o “Ideologia no livro didático” (1987), de Ana Lúcia Goulart de Faria, obra que desvelou o caráter conservador e ideológico do ensino no Brasil.

    Por meio do processo de democratização o conhecimento de Humanidades deixou de ser um capital cultura escasso como outrora e, consequentemente, proporcionador de distinção social. Em síntese, o filho da empregada passou a ter acesso, em certa medida, aos conhecimentos que antes apenas o filho da patroa acessava; perdendo assim seu “valor” simbólico distintivo. Estudar Sociologia que nos anos de 1930 era algo reservado a poucos alunos do seleto ensino secundário, passou nos dias atuais a compor a rotina de todas as escolas do ensino médio brasileiro.

    Um dos fatores que hoje torna, na concepção das classes privilegiadas – inclusive política – a manutenção do ensino escolar das Humanidades como algo não importante, são suas atuais epistemologias. Se antes as Humanidades reforçavam o status quo, hoje se apresentam de forma “crítica”, estranhando e desnaturalizando as relações sociais. Destacar que os fenômenos e as instituições sociais são construtos das relações sociais de poder que se dão ao longo da história passa a ser um dos objetivos das Humanidades, assim como provocar nos alunos a postura de olhar os fenômenos e as instituições de forma crítica, rompendo com o senso comum que vos leva a não “enxergar” apenas as pré-noções.

    Desta forma, se antes as Humanidades eram apropriadas por grupos privilegiados econômica e politicamente, hoje questionam seus privilégios; pondo em xeque as estruturas, as relações sociais e os sistemas políticos e econômicos pretéritos e vigentes. Por isso, recorrentemente o professor de Humanidades é acusado de doutrinador e “comunista”.

    Além disso, foi via as disciplinas de Humanidades que temas tabus na sociedade passaram a ser amplamente discutidos, assim como demandas de minorias passaram a compor o currículo, os livros didáticos e as aulas. O pleito de novos “heróis”, tais como Zumbi, foram destacados no interior dessas disciplinas, trazendo ao centro do palco da história sujeitos que antes eram (quando apareciam) “figurantes” à margem das narrativas escolares. De figurantes, o pobre, o escravo, o índio, o negro, o cigano, os homossexuais, e outras minorias, tornaram-se coadjuvantes e passam a ser discutidos, em alguma medida e em alguns casos, como atores principais da História do Brasil.

    Se as disciplinas de Humanidades se mantiveram no currículo mesmo vistas como “não utilitárias” – embora com intermitências e modificações – passa a ter agora sua presença nas escolas questionadas de forma constante e intensa, o que se dá inclusive de forma organizada, como é o caso do movimento Escola Sem Partido. Sem seu caráter de distinção social e sem sua utilidade de manutenção do status quo, parece que a elite nacional não vê mais sentido manter essas disciplinas no currículo escolar; ideia que vem sendo difundida de forma intensa e que – infelizmente – vem ganhando adeptos em diversas classes sociais.

    Nos parece que os motivos do questionamento da importância do ensino das Humanidades passa por, ao menos quatro questões complementares, são elas: i) ser vistas como “não utilitárias” ao sistema econômico vigente; ii) não ser mais tidas como importantes aos grupos privilegiados, deixando de lhes proporcionar distinção social; e iii) por questionar os privilégios historicamente construídos; iv) por trazer ao debates temáticas tidas como tabus e/ou demandas de minorias sociais.

    Diante desse cenário, julgamos importante atuar em defesa das disciplinas de Humanidades por acreditar em suas potencialidades para a construção de uma sociedade melhor, mais igualitária e justa.

     

    ***

    Nota:

     

     

    O Ensino de Humanidades
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  • Sucesso profissional não depende apenas de você! Por uma visão sistêmica da realidade

    Sucesso profissional não depende apenas de você! Por uma visão sistêmica da realidade

    O sucesso profissional pode ser definido de várias maneiras, pois depende dos objetivos e valores de cada pessoa. No entanto, alguns elementos comuns que podem ser considerados como sinais de sucesso profissional incluem: progresso na carreira, Reconhecimento profissional, Satisfação pessoal, Equilíbrio entre vida profissional e pessoal, Remuneração, entre outros.

    Quem nunca ouviu a frase “o sucesso depende de você”? Para a Sociologia tal frase é uma “meia verdade”, pois o nosso sucesso individual depende também de outros indivíduos, assim como de diversas condições materiais e históricas. Em outros termos, nossa biografia seria outra se tivéssemos outras condições materiais e históricas, como, por exemplo, termos nascidos e sido educados no Irã. Essa afirmativa onde você é o determinante de sua história é marcada pela ausência de uma visão sistêmica da realidade.
    Frases como essa (o sucesso depende de você) legitima, por exemplo, as desigualdades sociais e transforma o vitimado em culpado. Nessa perspectiva, se você não teve êxito na vida econômica ou estudantil, teria sido porque você não se fez merecedor, foi “fraco” e desmotivado, pois o sucesso profissional só dependia de você.
    Por certo, você leitor atento, já percebeu que algumas conquistas dependem de vários fatores externos a você e notou que apenas sua motivação não seria suficiente para, por exemplo, estudar em uma escola primária de qualidade se seus pais não tivessem recursos para pagá-la. Nesse caso, você dependeria ou dos recursos financeiros que não dispunham ou de contar com a “sorte” de na cidade ter uma escola de qualidade gratuita (e que sorte seria essa!).
    Caro leitor, o sucesso profissinal não depende apenas de você! Em uma visão sistêmica da realidade compreendemos que os fenômenos sociais particulares (como estudar em uma boa escola) estão ligados a um sistema de relações sociais que formam a sociedade mais geral. Em outros termos, ter sucesso quase sempre dependerá de estudar em uma boa escola, que dependerá das condições econômicas de sua família (ou da política pública local que estará atrelada a uma política pública educacional mais ampla), da acessibilidade a essa boa escola, da qualidade das aulas de seus professores, da situação educacional de seu país, etc. Depois de passar por todas essas condições favoráveis, dependerá ainda da disponibilidade de ofertas de vagas no mundo do trabalho, assim como condições de manter-se no local do emprego e, talvez, (se seu chefe gostar de você) ter o sucesso desejado.
    Uma visão sistêmica nos possibilita compreender que não vivemos em uma “bolha”. Muito pelo contrário, somos parte constitutiva de uma organização social. Nesse sentido, compreendemos que o contexto histórico, social, cultural e político a qual estamos inseridos influenciam diretamente nossas práticas cotidianas. Ou acha mesmo que usamos determinados tipos de roupas, por exemplo, por que escolhemos livremente? Assim, é verdade que nossas ações cotidianas refletem, de algum modo, o todo; bem como podemos afirmar que nossas ações influenciam na vida dos outros indivíduos.
    Olhar o mundo com uma visão sistêmica é uma forma de compreendermos como nossas biografias pessoais estão interligadas as biografias de milhares de outras pessoas, assim como olhar o mundo compreendendo que existem conexões entre o “todo” e as “partes” que compõem a sociedade a qual estamos inseridos.
    Dito isto, afirmamos que “o sucesso profisional não depende apenas de você”!
    (Texto originalmente publicado em 4 de mar de 2015)

    Leia também:

    Dica de livro
    Diálogos sobre o ensino de Sociologia, vol. 2
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