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  • Estratificação Social Segundo Octavio Ianni

    Estratificação Social Segundo Octavio Ianni

    ESTRATIFICAÇÃO SOCIAL SEGUNDO OCTAVIO IANNI*

     
    Por Cristiano das Neves Bodart
    Versão em PDF AQUI 
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    Cristiano Bodart, doutor em Sociologia (USP) Professor do Programa de de Pós-Graduação em Sociologia (Ufal)
    A temática de estratificação social foi de interesses de diversos trabalhos do saudoso Octavio Ianni. O sociólogo uspiano dedicou-se à compreensão das diferenças sociais e das injustiças a elas associadas, tendo por objeto criar condições compreensivas que favorecem o desenvolvimento de meios de superá-las.
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    No início da década de 1970 Ianni foi convidado pela Companhia Editorial Nacional para organizar a obra “Teorias de Estratificação Social”, na qual dedicou-se a selecionar os melhores textos que tratavam do tema, tendo reunido textos clássicos e contemporâneos (dentre eles artigos de Mills, Durhkeim, Marx e Engels, Weber, Toennies, Sombart e Lukács). De acordo com ele, a “intenção foi apresentar textos que suscitassem reflexões e temas para pesquisa” (IANNI, 1973, p. 9).
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    A obra foi publicada em 1973, sendo composta de 19 artigos, agrupados em 4 capítulos (Mudanças Estruturais, Castas, Estamentos e Classes). No início de cada capítulo escreveu breves introduções, as quais nos apontam elementos riquíssimos para uma compreensão introdutória da temática geral do obra: estratificação social. A seguir destacamos parte dessas contribuições.
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    Em se tratando de estratificação social, Octavio Ianni afirma que para uma melhor compreensão é necessário entender as estruturas econômicas e políticas da sociedade analisada, uma vez que para ele,
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    “A maneira pela qual se estratifica uma sociedade depende da maneira pela qual os homens se reproduzem socialmente. E a maneira pela qual os homens se reproduzem socialmente está diretamente ligada ao modo pelo qual eles organizam a produção econômica e o poder político” (IANNI, 1973, p.11).

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    Nesse sentido, os três tipos clássicos de estratificações sociais (castas, estamentos e classes) estão ligados a essas duas estruturas de poder (econômico e político); ainda que elementos culturais também são importantes estruturadores da sociedade e, consequentemente, classificadores. Desta forma, não pode escapar ao cientista social uma interpretação desses dois elementos. Em suas palavras, “[…] não se pode compreender o processo de estratificação social enquanto não se examina a maneira pela qual se organizam as estruturas de apropriação (econômica) e dominação (política)” (IANNI, 1973, p. 11).
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    Para Ianni, a principal diferença entre os tipos clássicos de estratificação está na abertura ou rigidez das estruturas sociais para a possibilidades dos indivíduos migrar de um estrato para outro. “Na medida em que as estruturas de apropriação e dominação são mais ou menos abertas (ou rígidas) as condições e possibilidades de classificação e mobilidade social serão mais ou menos abertas (ou rígidas)” (IANNI, 1973, p. 11).
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    Nesse sentido, o que caracterizaria as classes sociais seria as estruturas sociais próprias do Capitalismo que se apresentam abertas, possibilitando ao indivíduos a migração entre as classes ao longo de sua vida (podendo acender, quando descender no estrato social).
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    No caso das Castas, as estruturas econômicas e políticas se apresentam em decorrência das condições religiosas, raciais, hereditárias e ocupacional e essas categorias parecem predominar no pensamento coletivo e influenciar fortemente as ações das pessoas. Como tais categorias são tradicionais e pouco mutáveis, os indivíduos acabem não tendo condições de migrar estrato social (de casta).
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    Em se tratando das sociedades estamentais, é indispensável a compreensão do modo pelo qual as categorias tradição, linhagem, vassalagem, honra e cavalheirismo estão presentes no pensamento e na ação das pessoas, pois é a partir delas que se organiza a sociedade em estratos social. Os estamentos são característicos de sociedade feudais.
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    Assim, “[…] as diversas configurações histórico-estruturais mencionadas correspondem a distintas modalidades de organização das condições de reprodução social […]” (IANNI, 1973, p. 13). Para compreendermos a estratificações no interior de cada sociedade é importante considerar as formas de “cristalização” da divisão social do trabalho no âmbito de toda estrutura social e em sues diversos setores produtivos, de organização política, religiosa e intelectual. Em síntese, “a divisão social do trabalho é um processo condicionado pelo modo de produção (asiático, escravocrata, feudal e capitalista)[…] Isto é, as contradições estruturais inerentes às relações e hierarquias de castas (e subcastas), estamentos e classes sociais exprimem a maneira pela qual se distribui o produto (econômico) e o poder (político), no conjunto da sociedade, bem como em seus seguimentos” (IANNI, 1973, p. 13-14).
    Quadro 1 – Estratos Sociais.
    Estratificação social segundo Octavio Ianni
    Fonte: elaboração própria com base em Ianni (1973).
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    Referência

    IANNI, Octavio. Teoria de estratificação social: leitura de sociologia. São Paulo: Editora Nacional, 1973.
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    Principais obras de Octavio Ianni:

    “Cor e Mobilidade Social em Florianópolis” (1960, em colaboração com Fernando Henrique Cardoso), “Homem e Sociedade” (1961, em colaboração com Fernando Henrique Cardoso), “Metamorfoses do Escravo” (1962); “Industrialização e Desenvolvimento Social no Brasil” (1963), “Política e Revolução Social no Brasil” (1965), “Estado e Capitalismo no Brasil” (1965), “O Colapso do Populismo no Brasil” (l968), “A Formação do Estado Populista na América Latina” (1975), “Imperialismo e Cultura” (1976), “Escravidão e Racismo” (1978), “A Ditadura do Grande Capital” (1981), “Classe e Nação” (1986), “Dialética e Capitalismo” (1987), “Ensaios de Sociologia da Cultura” (1991), “A Sociedade Global” (1992).
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    Como citar esse texto:
    BODART, Cristiano das Neves. Estratificação Social segundo Octavio Ianni. Blog Café com Sociologia.com. jan. 2011. Disponível em: <https://cafecomsociologia.com/estratificacao-social-segundo-octavio/>. Acessado em: dia mês ano.
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    * Originalmente publicado em 11 de janeiro de 2011.
  • O cristão: entre Direita e Esquerda

    O cristão: entre Direita e Esquerda

    Por Cristiano das Neves Bodart

    Cristão é um adjetivo dado aqueles que seguem as ideias de Cristo (01-34 d.C). Em se tratando de Direita e Esquerda não consigo compreender como alguém diz ser cristão sem, contudo, compartilhar das ideias básicas de Cristo: amor, paz, compreensão, respeito, tolerância e igualdade.
    Alguns dirão que não existe direita e esquerda, afirmativa que não se sustenta (mas isso é outra discussão).
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    Para compreensão inicial (não continue a leitura sem entender esses dois pontos):
    Grosso modo podemos assim classificar:
    Esquerda: Basicamente trata-se de uma posição ideológica que defende práticas voltadas a uma sociedade mais igualitária. Defende uma melhor redistribuição de renda e respeito às diferenças e prega mudanças na realidade socioeconômica em prol da coletividade.
    Direita: Basicamente trata-se de uma posição ideológica conservadora e defensora, hoje, do Neoliberalismo Econômico. Defende a meritocracia e a manutenção da realidade socioeconômica em prol da individualidade.
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    cristianismo primitivo
    A questão que não consigo entender é a visão de alguns cristãos se colocarem contrários às ideias de Esquerda, como se essas fossem “diabólicas” (o que não é, necessariamente, a mesma coisa do que defender partidos ditos como de esquerda). Digo isso porque se analisarmos, ainda que superficialmente, a vida de Jesus Cristo e de seus seguidores (cristãos primitivos) veremos com muita facilidade se Jesus era de Direita ou de Esquerda.

    Como bem apresentou o poeta cristão, Ariano Suassuna, Herodes e Pilatos eram de direita, representavam o status quo da época. Defendiam o crescimento do Império Romano, o uso da força na manutenção da “harmonia social”.

     

    Jesus Cristo era, sem dúvida, de Esquerda. Alguns diriam que os objetivos de Jesus não estavam ligados à política partidária; isso acredito ser verdade. Porém, ao buscar seu objetivo para o “Reino dos Céus” teve que se posicionar politicamente no mundo – uma vez que estava situado em um contexto histórico, político e social. Não era possível ser neutro. Restava ficar do lado dos explorados ou dos exploradores; escolheu os subjugados.

    Jesus de Nazaré viveu em uma sociedade marcada pelo Latifúndio (diversas de suas parábolas tiveram a “terra” como pano de fundo) e quando ele se colocava contrário a riqueza (embora pensamos o conceito de riqueza com nossas experiências atuais, sendo visto como capital) estava se colocando contrário ao latifúndio. A riqueza, ou seja, a concentração de terras nas mãos de poucos, era visto por Jesus como bastante negativa (“É mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha do que um rico entrar no Reino dos Céus” Mt. 19:24). E qual era a sugestão de Jesus? Sua orientação era a partilha: “vende tudo o que tens e dê aos pobres” (Mt. 19:21).
    cristão lendo biblia sagrada

    Jesus se pôs também contrário à opressão dos ricos sobre os pobres. Denunciou a exploração da época que se dava por meio de impostos que enriqueciam uma classe social e esmagavam outras na pobreza. Atualmente a forma de exploração se dá, em maior parte, por meio das relações assalariadas (na época de Jesus o trabalho era predominantemente artesanal e familiar).
    Quando Cristo, por exemplo, curava nos sábados e não observava as leis da época (regidas por princípios teocráticos judaicos) estava se colocando à Esquerda da Direita política da época, isso pela atitude subversiva e pelo rompimento com a ordem social imposta.

    Jesus viveu na companhia dos mais pobres e oprimidos pela Direita Política da época. Sua atenção esteve prioritariamente sobre os mais pobres, carentes e marginalizados pela sociedade. Notaremos nos evangelhos um constante embate entre Jesus e o Poder Político de Direita da época. Jesus foi um defensor das minorias desprivilegiadas ou vitimadas por preconceitos sociais e/ou religiosos.
    O que mais caracteriza hoje a Esquerda? Certamente a ideia “comunista” de igualdade social.
    Se olharmos para os Cristãos do primeiro século, mais especificadamente no livro de Atos dos Apóstolos veremos qual era o posicionamento desses:

    “E da multidão dos que creram, um só era o sentimento e a maneira de pensar. Ninguém considerava exclusivamente seu os bens que possuía, mas todos compartilhavam tudo entre si” (ATOS 4: 32).

    E ainda,
    “Não havia pessoas necessitadas entre eles, pois os que possuíam terras ou casas as vendiam, traziam o dinheiro da venda e o colocavam aos pés dos apóstolos, que o distribuíam segundo a necessidade de cada um” (Atos 4:34-35).
    cristão e a caridade
    Pelo que parece o Cristianismo foi precursor das ideias comunistas, chegando a colocá-las em prática no primeiro século.

    Não é lúcido pensarmos que porque alguém da Esquerda se corrompeu, como fez Judas e outros contemporâneos de nossa época (enriquecendo-se a si mesmo com uma espécie de “caixa dois”), que devemos satanizar os princípios defendidos por Jesus. Fazer isso não seria deixar de seguir os princípios cristãos e, portanto, deixar de ter condições de ter esse adjetivo?

    Por fim, termino dizendo que o conservadorismo da Direita da Época de Jesus, o crucificou justamente por ter sido interpretado como sendo de Esquerda.  
    Hoje Jesus seria assassinado pela milícia a mando de um direitista conservador que se diz cristão. Daqueles que fazem gestos de armas com as mãos.
    Publicado originalmente em 8 de outubro de 2014 
  • O Pink Money e a realidade da comunidade LGBTQIA+

    O Pink Money e a realidade da comunidade LGBTQIA+

    Você sabe o que é pink money? Para entender melhor, devemos partir para o contexto. No dia 28 de junho, celebra-se em muitos países do mundo e no Brasil o “Dia internacional do orgulho LGBTQIA+”. A data, cuja referência remete ao marco inicial do Movimento LGBT nos EUA, tem por objetivo a valorização da diversidade sexual e o combate às diversas formas de discriminação e violência sofridas pela população formada por Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais e Pessoas Intersexo.  No capitalismo como esse grupo é visto tão somente como segmento de mercado, empresas buscam estratégias de atrair consumidores simpáticos a esta causa. Portanto, Pink money (dinheiro rosa) é uma estratégia de marketing que visa dar uma impressão progressista a pessoas simpáticos à causa LGBTQIA+, ainda que estas empresas não tenha nenhuma política efetiva de valorizar a diversidade na empresa. Em muitos casos, é um aparentar ser para “sair bem na foto”.

    josué vidal
    Josué Vidal Pereira*

    Nas últimas décadas, verificou-se avanços significativos, ainda que de modo muito lento, a exemplo  do reconhecimento de alguns dos direitos de cidadania para essa parcela da população como o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo – a principal conquista, já é uma realidade nos seguintes países: Áustria, Holanda, Bélgica, Canadá, Espanha, África do Sul, Noruega, Suécia, Argentina, Islândia, Portugal, Dinamarca, França, Nova Zelândia, Uruguai, Escócia, Inglaterra, Luxemburgo, País de Gales, Irlanda, Estados Unidos, Colômbia, Eslovênia, México, Finlândia e Alemanha.

    No Brasil, o casamento civil LGBTQIA+ também é uma realidade, porém deve-se fazer importante ressalva. Não há uma legislação específica tratando do assunto. Embora haja, há muitos anos, projetos de lei com essa previsão, os congressistas, muitos deles genuínos representantes do pensamento conservador, outros reféns dos seus colégios eleitorais controlados por igrejas de todos os matizes,      sobretudo, as pentecostais, neopentecostais e o segmento católico carismático, não permitem o avanço de pautas dessa natureza. Contudo, por interpretação da Constituição Federal de 1988, o Conselho Nacional de Justiça determinou, através da Resolução nº 175, de 14 de maio de 2013, que os cartórios devem realizar casamentos entre pessoas do mesmo sexo.

    De todo modo, o movimento de reconhecimento dos direitos da comunidade LGBTQIA+ mundo a fora, parece ter sido acompanhado pelo reconhecimento do potencial de consumo representado por frações dessa comunidade. Sobretudo a indústria do turismo que passou, mais fortemente na última década, a influenciar as políticas de muitas cidades do mundo e algumas do Brasil, as quais passaram a ter, principalmente no Pink Money      um grande alvo de atratividade, fazendo com que parte das redes hoteleiras se tornassem por assim dizer gay friendly. De fato, essa expressão tem implicado como que um selo de “bem-vindo” a um público anteriormente segregado, o qual até então precisava recorrer a criativos artifícios para frequentar ambientes como hotéis sofisticados e outros espaços sociais.

    É fato que ao mercado não passa despercebido que determinada parcela da comunidade LGBTQIA+, por conta de uma lógica socioeconômica derivada da formação de famílias homossexuais restritas ou unipessoais e da ocupação de boas posições sociais, resultam no surgimento de grupos – sobretudo Gays, com alto poder aquisitivo, mesmo quando oriundos de grupos de baixa classe média. Desse modo surgiu nas últimas décadas toda uma gama de serviços voltados ao atendimento dessa por assim dizer “elite gay”, tais como bares, serviços de beleza, decoração, hotéis, cruzeiros, e tudo mais que diz respeito ao mundo do consumo e da gourmetização da vida na sociedade capitalista.

    A apreciação da realidade acima explicitada, revela elevado nível de alienação por parte dos grupos supramencionados, como se os problemas sofridos por toda a comunidade  LGBTQIA+ pudessem ser resolvidos pela via do consumo, sobretudo numa sociedade altamente segregadora e que, dado seus fundamento socioeconômicos e históricos, marcada pelo desemprego estrutural – se mostra totalmente incapaz de resolver a questão da educação e  do trabalho dentro dos marcos da ordem capitalista.

    A glamourização da vida pela “elite gay” também traz consigo o ocultamento da realidade vivida pela maioria da comunidade, seja dos próprios Gays ou das outras letras da sigla, com exceções que só servem para romantizar o sofrimento dos poucos que “chegam lá”, como também para alimentar a fantasia de quem sonha em algum dia ascender socialmente a despeito de todos os obstáculos cravados no seu caminho.

    A diversidade das identidades LGBTQIA+ revela-nos aspectos de uma realidade também extremamente complexa e historicamente negligenciada por uma sociedade, que moldada culturalmente pela matriz religiosa cristã ou outras, tratou de satanizar, quando não criminalizar, todo e qualquer traço identitário que entrasse em contradição com a idealização cristã da família. Desse modo, milhares de indivíduos que não se enquadraram a tais padrões foram e/ou são submetidos aos mais diversos procedimentos de ajustamento, desde sessões de tortura física e psicológica, cirurgias, trabalhos forçados, entre tantos outros. Não é de se estranhar que o número de casos de suicídios entre a população LGBTQIA+ é mais elevado em relação à população heterossexual.     . De acordo com a revista americana Pediatrics, citada em matéria do Diário do Nordeste, o público LGBTQIA+      tem seis vezes mais chances de tirar a própria vida em comparação com o público em geral.

    No atual contexto, em que pese diversos avanços observados na ciência e no âmbito dos direitos humanos das minorias em nível internacional, ainda é patente o lugar marginal reservado as minorias LGBTQIA+. Segundo dados divulgados pelo El País, em muitos países islâmicos a assunção dessa identidade abertamente significa praticamente a pena de morte. De fato, em países como o Irã, Sudão, Paquistão, Arábia Saudita e Afeganistão é prevista legalmente a pena capital. Em outros como Bangladesh, Myamar e Quênia      preveem a prisão perpétua.

    O Brasil, embora seja considerado oficialmente como um país com proteção ampliada para a comunidade LGBTQIA+, o que decorre de avanços já mencionados neste texto, o fato é que ainda é muito perigoso ser membro desse grupo na terra do carnaval. Desde a ascensão do regime neofascista de Bolsonaro ao poder em 2019, assiste-se ao aumento da violência contra a comunidade. De acordo com a matéria já citada do El País, 50% dos LGBTQIA+ do país afirmam ter sofrido algum tipo de violência desde a eleição do atual presidente, “as mulheres lésbicas são as que mais declararam ter sofrido violência (57%), seguidos por pessoas trans e travestis (56%), gays (49%) e bissexuais (44,5%)”.

    Ao lado de todas as formas de violências, a discriminação também se destaca quando se trata de mercado de trabalho. De acordo a Aliança Nacional LGBTI, em matéria veiculada na Agência Brasil no último dia 17 de maio de 2021, 70% da população Trans em particular e 40% da população LGBTQIA+ em geral estava desempregada, num contexto de 14,4% de desemprego geral levantado pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio do IBGE. Tais dados demonstram que ser parte desse grupo      se constitui como enorme obstáculo de acesso ao mercado de trabalho.

    Tem-se, portanto, que dadas as transformações verificadas nas sociedades capitalistas contemporâneas, sob o regime de democracia liberal-burguesa, ao mesmo tempo em que se assiste em muitos países e regiões as mudanças nas legislações em vista da concessão de direitos fundamentais, diga-se produto das lutas históricas dos LGBTQIA+, também se      observa a manutenção e talvez o aprofundamento das desigualdades sociais, que impacta de modo severo os grupos mais vulneráveis, dentre os quais se encontram as assim denominadas minorias sexuais. Nesse sentido, para a maioria da comunidade LGBTQIA+ tais conquistas parecem não exceder o campo da igualdade formal, o que evidentemente não se constitui como contradição da ordem atual, algo, aliás, já posto desde a Revolução Francesa no final do século XVIII.

    Ao que parece, o metabolismo da ordem social capitalista exige a criação de uma hierarquia social determinada, a partir de elementos que permitam a classificação, a desclassificação e a reclassificação, como dizia Bourdieu, no sentido da redução ontológica do ser, a tal ponto em que o mesmo aceite determinados lugares sociais, por mais humilhante, degradante e penoso, mas que são aceitos como obras da natureza e não de uma engenharia social que determina de modo consciente o pertencimento de cada um no contexto social.

    Na atual conjuntura é importante a disputa da consciência, dos espaços e do imaginário social da população LGBTQIA+. É fundamental que se compreenda que não há qualquer possibilidade de emancipação pela via do consumo, do Pink Money. Igualmente importante é compreender que as soluções individuais propagandeadas diuturnamente pelas mídias, pela escola e pela universidade, a exemplo do empreendedorismo e da meritocracia, não passam em qualquer filtro crítico de um tangenciamento ideológico, de falseamento da realidade, dado que os determinantes socioeconômicos da ordem capitalista não têm definitivamente nenhum potencial de resolução dos problemas coletivos, sobretudo do trabalho.

    Para além da ganância pelo pink money, e por último, deve-se ter claro que as mazelas vivenciadas pelas comunidades LGBTQIA+, no Brasil e no mundo – em que pesem suas especificidades, não devem ser vistas de modo isolado, mas como parte de uma totalidade social que é a excludente sociedade capitalista. Dito de outro modo, a luta desta comunidade deve ser a luta da classe trabalhadora em busca de sua emancipação enquanto classe, ou seja, só haverá emancipação LGBTQIA+ se houver emancipação das classes trabalhadoras. Fora isto, só nos resta as armadilhas do movimento identitário, capitaneado por grandes corporações na busca pela captura da subjetividade da juventude LGBTQIA+ e seu Pink Money.

    Referências:

    ps://www.sbmfc.org.br/noticias/mitos-lgbtia-pessoas-intersexo/

    Acesso em: 11/06/2021.

    https://brasil.elpais.com/brasil/2019/03/19/internacional/1553026147_774690.html

    Acesso em: 11/06/2021.

    https://diariodonordeste.verdesmares.com.br/metro/suicidio-entre-publico-lgbt-aumenta-quase-quatro-vezes-em-dois-anos-1.2058979

    Acesso em: 11/06/2021.

    https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude/noticia/2021-05/desemprego-e-violencia-domestica-agravam-situacao-de-lgbti-na-pandemia

    Acesso em: 11/06/2021.

    https://www.sbmfc.org.br/noticias/mitos-lgbtia-pessoas-intersexo/ 

     

     

    Texto originalmente publicado em 06 de jun. 2021.

     

    *Josué Vidal Pereira é Professor do Instituto Federal de Goiás.  

  • Dica de leitura: Sob os tempos do equinócio: oito mil anos de História da Amazônia Central

    Dica de leitura: Sob os tempos do equinócio: oito mil anos de História da Amazônia Central

    As editoras Ubu e Edusp lançaram o livro “Sob os tempos do equinócio: oito mil anos de História da Amazônia Central”, de Eduardo Góes Neves. A obra de arqueologia é rica em detalhes dos achados na região e no trabalho de reconstrução histórica na Amazônia Central. Apoiado na sua precisão científica, repertório histórico e imaginação antropológica, Eduardo Neves reconstitui aspectos da vida de mulheres e homens que viveram na região.

    Nesta síntese de oito mil anos de história da Amazônia central, baseada em décadas de pesquisa arqueológica na região, Eduardo Góes Neves contraria o senso comum e revela a riqueza do processo de ocupação humana na região. O autor apresenta uma reconstituição da história da ocupação humana da Amazônia central no longo período transcorrido desde o início do Holoceno, cerca de 10 mil anos atrás, até os primeiros momentos da colonização europeia, no século XVI. Desdobra ainda a discussão para outros contextos da arqueologia das terras baixas da América do Sul, demonstrando que a história do Brasil anterior à chegada dos europeus é riquíssima, interessante e relevante para o entendimento do lugar que o Brasil ocupa hoje no planeta. É contribuição importante ao debate teórico e metodológico da arqueologia brasileira, escrito de forma acessível a todos os interessados na história dos povos indígenas das terras baixas e na Amazônia.

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  • Dica de leitura: “Alternativas” à prisão: Michel Foucault: um encontro com Jean-Paul Brodeur.

    Dica de leitura: “Alternativas” à prisão: Michel Foucault: um encontro com Jean-Paul Brodeur.

    A editora Vozes publicou a obra “Alternativas” à prisão: Michel Foucault: um encontro com Jean-Paul Brodeur. Trata-se de uma conferência proferida por Foucault. O livro tem 130 páginas e conta com um prefácio, a conferência, um texto de Sylvain Lafleur sobre as contribuições de Foucault para pensar a nossa atualidade penal e duas entrevistas.

    “Em uma conferência dada em Montreal logo após a publicação de Vigiar e punir, Michel Foucault responde a uma pergunta que lhe foi feita: Existem “alternativas” para a prisão? Foucault duvida que a crescente imposição de condições restritivas fora do recinto prisional seja um sinal de ruptura com o encarceramento; na verdade, parece que o progressismo criminoso e o desenvolvimento de técnicas de vigilância caminham lado a lado. Portanto, não se trata tanto de inventar “alternativas”, mas de saber se se deseja difundir ou diminuir o controle social. A leitura retrospectiva de “Alternativas” à prisão, longe de exaurir as questões sobre nossa atualidade criminológica, levanta muitas questões sobre a extensão de uma sociedade civilizada. Textos de Sylvain Lafleur, Toni Ferri e Anthony Amicelle atualizam essa análise” (Trecho da obra).

    O livro pode ser adquirido AQUI

  • Dica de leitura: Homens ou máquinas? “escritos de 1916 a 1920”, de Gramsci

    Dica de leitura: Homens ou máquinas? “escritos de 1916 a 1920”, de Gramsci

    Neste post indicamos uma obra que deve ser leitura obrigatória para quem desejar compreender o pensamento de Gramsci.

    A Editora Boitempo publicou uma obra com textos de Gramsci muito importante: “Homens ou máquinas? escritos de 1916 a 1920″ O livro integra a coleção Escritos Gramscianos.

    O livro reúne 33 textos escritos por Antonio Gramsci entre os anos de 1916 e 1920, sendo dezesseis inéditos na  língua portuguesa. Questões como luta de classe, classe operária, partido socialista são abordadas, nesses textos, por Gramsci.

    Pondo o tema da “Democracia operaria” como meio e fim das lutas para o socialismo, Gramsci desenvolveu a ideia da estreita relação entre produção e revolução como antítese da delegação passiva aos organismos burocráticos, correlacionando a experiência dos conselhos com o desenvolvimento da luta de classes na Europa.

    “Como amalgamar o presente e o futuro, satisfazendo as urgentes necessidades do presente e trabalhando efetivamente para criar e antecipar o porvir?”, escreve Gramsci no artigo Democracia operária.

    Trecho

    “Decerto, para os industriais tacanhamente burgueses, pode ser mais útil ter operários-máquinas, em vez de operários-homens. Mas os sacrifícios a que o conjunto da coletividade se sujeita voluntariamente para melhorar a si mesma e fazer brotar de seu seio os melhores e mais perfeitos homens, que a elevem ainda mais, devem espalhar-se beneficamente pelo conjunto da coletividade e não apenas por uma categoria ou uma classe”.

    Gramsci

    Adquira AQUI

     

  • Noção de dialética em Marx e Engels

    Noção de dialética em Marx e Engels

    Dialética em seu aspecto fundamental diz respeito a oberservação de mudanças e transformações. A dialética que foi analisada pelos gregos passa a ter uma nova concepção moderna com Hegel e a partir dela Marx e Engels desenvolvem o famoso método do materislismo histórico-dialético.

    dialética

    Por Roniel Sampaio Silva

    Antes de tudo, devemos nos perguntar o que é dialética? Dialética, grosso modo, é a percepção de que a realidade não é constituída de uma essência imutável. Ela parte da premissa que há um constante movimento que transforma a realidade a partir das suas contradições.

    A dialética remonta a uma construção histórica que começa na antiguidade clássica grega e se estende até os dias atuais. Em contraposição a dialética, há também na filosofia o idealismo, que parte da premissa que a realidade é formada de aspectos que são essencialmente imutáveis, ou ainda que a realidade se dirige a uma perfeição. Enquanto a dialética tinha como representante Sócrates e Heráclito, alguns dos representantes do idealismo era Parmênides e Platão. Com as transformações sociais que se seguiam, a dialética foi sufocada em favor da ascensão do idealismo em razão das classes dominantes enxergarem no idealismo um instrumento de manutenção de seus próprios privilégios na medida em que ficava mais fácil as pessoas aceitarem que o fato de quem são e o que fazem é sustentado na crença de uma essência imutável.
    Na era moderna, com as transformações sociais e maior circulação de ideias e mercadorias a dialética passa a ser permanentemente revitalizada. A filosofia alemã de Kant e Hegel, mesmo sendo filosofias com grande apelo ao idealismo usam instrumentos do pensamento dialético e a revitaliza.
    Foi com Hegel que a dialética passa a ter uma boa sustentação teórica. Para este autor, o entendimento da realidade parte das ideias para o concreto, que é imperfeito, para retornar as ideias numa dimensão idealizada que tende a perfeição. Assim, o homem tende a se constituir a partir do trabalho intelectual para fazer exercícios de mediação da realidade que vão fazendo movimentos de totalização da realidade. Ou seja, o exercício intelectual deve ser feita de modo a compreender as contradições da realidade e articulando tais contradições com as várias dimensões até ir compreendendo a visão do todo. Para Hegel a busca da verdade está no exercício das buscas de contradições, visando articular as várias dimensões da realidade, quanto mais conexões se fazem, maior entendimento da realidade se tem
    Marx usa como referencia a dialética de Hegel, mas a inverte, passa a conceber o trabalho material como constituinte fundamental da historia e por conta disso, o exercício da reflexão deve fazer o movimento partindo do concreto, indo para o abstrato e retornando para novamente para o concreto. Foi a partir das contribuições de Feuerbach que o materialismo foi incorporado a teoria de Marx e as contradições da realidade foram analisadas com base nas condições materiais, dando um caráter empírico a dialética.
    Neste sentido, a partir do método materialista histórico de Marx ele concluiu que as condições materiais criam contradições que criam classes sociais que se antagonizam entre si e dá dinâmica a história da humanidade.
    Referência:
    KONDER, Leandro. O que é dialética. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1988.
  • A biografia no campo da Sociologia: contribuições de Norbert Elias

    A biografia no campo da Sociologia: contribuições de Norbert Elias

    A biografia no campo da Sociologia: contribuições de Norbert Elias

     

    Cristiano Bodart, doutor em Sociologia (USP) Professor do Programa de de Pós-Graduação em Sociologia (Ufal)

    As biografias, são, muitas vezes, apontadas como meras “fofocas”. Em se tratando de biografias de indivíduos desconhecidos, poucos são os que se interessam por elas. 

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    A proposta de Elias

    A Sociologia tradicionalmente se preocupou com os fenômenos sociais, deixando de lado, por muito tempo, a preocupação com o indivíduo. Além dos estudos de Sociologia reconhecidos posteriormente, como os trabalhos de Simmel, destaca-se um estudo que, ao meu ver, é uma obra sociológica incrível, e estou me referindo a uma “biografia” escrita por Elias. Parece paradoxo, mas na obra “Mozart: sociologia de um gênio” Norbert Elias nos fornece, para além da biografia do músico, uma metodologia sociológica que nos proporciona meios de compreensão da “história de vida” atrelada ao “contexto histórico do indivíduo”. Destacamos que o indivíduo, nesse caso, não é o centro da análise da obra, mas a sociedade na qual está inserida esse indivíduo. 
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    Sociedade versus indivíduos

    A proposta de Elias é problematizar as relações entre indivíduo e sociedade buscando compreender como os indivíduos buscam “resistir” as “pressões sociais” e como essas limitam as possibilidades dos indivíduos e, em carta medida, direciona sua trajetória/biografia. Vemos, então, a tão cara discussão agencia versus indivíduo ou atores versus estrutura.
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    A biografia de Wolfgang Amadeus Mozart, personagem estudado na obra, interessa ao estudo da sociologia à medida que sua trajetória é marcada pela história da época. Seu desejo por reconhecido de sua produção musical e a vontade de exercer seu talento de forma autônoma se vê confrontada com a estrutura social da época.

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    […] um músico que se deseja ser socialmente reconhecido como artista sério e, ao mesmo tempo, quisesse manter a si e a sua família, tinha de conseguir um posto na rede das instituições da corte ou em suas ramificações (ELIAS, 1993, p. 18).

    .Por um lado, o indivíduo, por outro, a estrutura social da época. Desta forma, Elias capta a tensão entre indivíduo e sociedade, ao mesmo tempo que ao apresentar a biografia do músico, expõe aos leitores a estrutura social da “sociedade de corte” e evidencia a “teia de relações” na qual está envolvida o indivíduo. Nessa direção, Elias afirma que:

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    […] em última análise, até mesmo tais decisões individuais ficam obscuras quando não se consideram os aspectos relevantes dos processos sociais não-planejados em que ocorram, e cuja dinâmica determina, em grande parte, suas consequências (ELIAS, 1993, p. 48).

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    Elias nos alerta, que a vontade individual não pode ser considerada fora da dimensão social, assim como a biografia de cunho sociológico não pode desconsiderar o momento histórico e a estrutura social estabelecida. Dito isto, acreditamos que Norbert Elias nos indica um caminho metodológico onde é possível buscar a compreensão das estruturas sociais de uma época a partir do estudo “biográfico”, ainda que de indivíduos anônimos.
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    Referência
    ELIAS, Norbert. Mozart: sociologia de um gênio. Rio de janeiro: Editora Zahar, 1993.

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    Como citar este texto:

    BODART, Cristiano das Neves. A biografia no campo da Sociologia: contribuições de Norbert Elias. Blog Café com Sociologia, 2019.

     

    Sugestão para aula de Sociologia:

    Que tal se apropriar das contribuições de Norbert Elias (ver nesse post e na obra mencionada) e trabalhar com os estudantes na produção de suas biografias em um “livreto”?

    Metodologia:

    Cada estudante deve ser orientado, após uma aula sobre as relações indivíduo e sociedade, a produzir em formato de livreto (A-4 dobrado ao meio, dando forma de livreto) uma obra biográfica,  no qual deve buscar demonstrar como ela está ligada aos outros indivíduos  (em rede de interdependência) e como esses influenciaram suas trajetórias.

    Outras opções seriam produzir biografias de um de seus pais (cuidadores) ou de um famoso, à escolha do estudante.

    Versão deste post em PDF AQUI

     

    Originalmente publicado em 10 de setembro de 2019.

     

     

  • Projeto de Vida: proposta de plano de disciplina

    Projeto de Vida: proposta de plano de disciplina

    O Projeto de Vida está presente em todas as áreas do currículo e se propõe como uma estratégia para promover a formação cidadã e o desenvolvimento pessoal dos estudantes. Ele inclui atividades que os ajudam a refletir sobre suas escolhas, a construir seus projetos de vida e a entender o papel que desempenham na sociedade. Professores de Sociologia e filosofia podem e devem utilizar esse espaço para trazer as contribuições de suas respectivas disciplinas. Segue uma proposta de plano de ensino.

    Projeto de Vida: proposta de plano de disciplina

    Cristiano das Neves Bodart[1]

    O componente curricular Projeto de Vida é uma das bizarrices da Reforma do Ensino Médio, que isso fique claro! Tratai disso em outro post. Neste, pretendo compartilhar uma sugestão de como transformar esse limão [Projeto de Vida] em uma limonada (ainda que sem açúcar).

    O fato é que a famigerada “disciplina” está sendo atribuída aos(às) professores(as) sem qualquer apoio orientacional prático, embora esteja chegando à eles(as) carregada de ideologias neoliberais que se expressam em tendências do “individualismo”, “empreendedorismo” “self made man” e até “autoajuda”; Isso em nada colaboram para a formação da grande maioria dos jovens que precisam compreender como as estruturas sociais os possibilitam ou os impedem de fazer escolhas e seguir certas trajetórias de vida. Enfim, temos um limão bem azedo que chega nas mãos de muitos(as) professores(as).

    O que fazer? Como lecionar tal componente curricular tentando minimizar os impactos negativos? Pensando nisso, apresento uma dica de plano de disciplina. Vale deixar claro que é uma proposta que pode ser utilizada como ponto de partida para a produção de um programa de “disciplina” a ser posta em prática, devendo considerar as condições estruturais da escola, a cultura escolar, as condições de aprendizagem dos(as) estudantes e o conhecimento do(a) docente sobre os temas sugeridos.

    PLANO DE DISCIPLINA PROJETO DE VIDA

    Componente curricular: Projeto de Vida

    Turma: 1º ano do ensino médio

    Nº de aulas semanais: 2 horas/aulas

    Ementa: O componente curricular, dialogando com a Base Comum Curricular Nacional (BNCC), visa propiciar conhecimentos necessário à compreensão dos aspectos que envolvem as trajetórias, as estruturas e as condições socioeconômicas dos indivíduos e grupos sociais, bem como promover momentos de reflexão sobre: relações entre indivíduo e sociedade; possibilidades e limitações das ações sociais individuais; papel da estrutura social sobre as trajetórias de vida; políticas públicas, trabalho e condições de vida e; estilos de vida, trabalho e cultura.

    Conteúdos:

    Indivíduo e Sociedade

    Estruturas sociais

    Individualismo e coletivismo

    Trajetórias de vida e socialização

    Identidade e cultura

    Trabalho e contextos econômicos

    Mercado de trabalho e profissões

    Exclusão e inclusão social

    Políticas Públicas

    Objetivo geral:
    • Proporcionar condições para compreender os diversos fatores que influenciam em nossas trajetórias e projetos de vida, dotando-os de consciência que os possibilite alargar suas capacidades de escolhas frente aos constrangimentos das estruturas sociais.
    Objetivos específicos:
    • Compreender as relações entre nossas biografias e as demais biografias;
    • Identificar fatores externos que influenciam em nossas trajetórias e escolhas;
    • Reconhecer os aspectos sociais presentes em nossas identidades;
    • Entender como as dinâmicas socioeconômicos geral oportunidades variadas e diferentes aos diferentes grupos e indivíduos;
    • Notas as relações entre trabalho e condições sociais;
    • Reconhecer o papel da educação e das políticas públicas na redução das desigualdades de oportunidades que impactam sobre os projetos de vida;
    • Compreender que os projetos de vida estão entrelaçados também aos fatores sociais externos aos indivíduos.
    Metodologias:

    Serão promovidas leituras textuais, imagéticas e discursivas, análises de canções, filmes, documentários, além de podcasts e a realização de debates, orientações de pesquisas, realizações de entrevistas e promoção de rodas de conversa.

    Dicas de atividades coletivas:

    a) Feira de profissões e ocupações: os(as) estudantes realizam uma pesquisa sobre uma profissão escolhida e apresenta numa feira no espaço escolar, onde cada estudante deverá montar um estande com dados sobre a profissão, sendo o(a) expositor(a); b) Entrevistas-documentário: em grupo, os(as) estudantes entrevistam profissionais e montam um documentário sobre a atividade profissional escolhida; c) Rodas de conversa: o(a) docente convida profissionais de diversas áreas para uma roda de conversa com os estudantes. Inicia apresentando a atividade profissional e depois abre para perguntas. Recomendamos que sejam dois profissionais de área próxima por roda de conversa (ex. médio e socorrista; professor e gestor escolar; marceneiro e pedreiro; etc.) para maximizar o tempo; d) Visita à Universidade: Em contato com a universidade, agende uma visita guiada para conhecer sua estrutura e os cursos oferecidos; e) Podcast jovem: um podcast gerido pela turma para tratar de questões que envolve às juventudes; f) Fanzine: Produção de Fanzines sobre questões relacionadas às juventudes, mercado de trabalho ou profissões; g) Parlamento jovem: simulação de um parlamento onde os(as) estudantes devem pesquisar previamente a função dos parlamentares e projetos de leis. Uma ou mais sessões são simuladas para apresentação de propostas de leis para as juventudes e votação das mesmas e; h) Biografia sociologizada: os(as) estudantes produzem, ao longo do ano, um livro autobiográfico buscando considerar os fatores externos que influenciaram em suas trajetórias.

    Avaliação:

    As avaliações serão processuais, considerando o desempenho e a participação dos(as) estudantes nas aulas e mini-projetos, assim como avaliações somativas, realizadas por meio de pesquisas de temas, produções textuais e questões abertas e fechadas.

    1º BIMESTRE: Projeto de vida
      Indivíduo e Sociedade; Estruturas sociais; Individualismo e coletivismo
    Competências Gerais: 1, 2, 3 e 4 Habilidades: EM13CHS101, EM13CHS102, EM13CHS303, EM13CHS401
    Dicas de materiais para as aulas: Dicas de materiais para o(a) professor(a):
    [Podcast] Café com Sociologia: indivíduo e Sociedade. Disponível AQUI Vieira, D. D. (2021). Indivíduo e Sociedade: de Durkheim a Norbert Elias e Pierre Bourdieu. Revista Espaço Acadêmico, 20(226), 251-264. Disponível AQUI   ELIAS, Norbert. A sociedade dos indivíduos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1994.
    [Texto] O sucesso profissional não depende apenas de você! Por uma visão sistêmica da realidade. Disponível AQUI
    [Cruzadinha] LETRIX de Sociologia: relação Indivíduo e Sociedade. Disponível AQUI
    [Texto] Por que não cumpriremos nossas promessas de ano novo? Disponível AQUI BOURDIEU, Pierre. Coisas Ditas. São Paulo: Editora Brasiliense, 1990.   BARBOZA, Pedro; FERREIRA, Rodolfo. O que é Habitus? In: BODART, Cristiano das Neves (Org.) Conceitos e categorias fundamentais do ensino de Sociologia, vol. 1. Maceió: Editora Café com Sociologia. Disponível AQUI
    [Texto] Eu quero, ao menos, tentar voar: Estrutura social e liberdade individual. Disponível AQUI
    [Filme] Cidade de Deus, Brasil (2002)
    [Música] Chico Brito, de Paulinho da Viola
    [Podcast] Instituições Sociais. Disponível AQUI CARVALHO, Juliéverson M.; PAIVA, Aline Cristina. O que é O que é instituição social? In: BODART, Cristiano das Neves (Org.) Conceitos e categorias fundamentais do ensino de Sociologia, vol. 2. Maceió: Editora Café com Sociologia. Disponível AQUI
    [Texto] O que é instituição social? Disponível AQUI
    [Texto] O egoísmo é naturalmente humano? Disponível AQUI OLSON, Mancur. A Lógica da Ação Coletiva. Trad. Fabio Fernandez. São Paulo. Edusp, 1999. pp. 13-64.   PUTNAM, Robert D. Comunidade e Democracia: a experiência da Itália moderna. Trad. Luiz Alberto Monjardim. Rio de Janeiro. Editora Fundação Getúlio Vargas, 1996.   BODART, Cristiano das Neves. O que é Capital Social? Blog Café com Sociologia, 2012. Disponível AQUI
    [Texto] Teoria da ação coletiva: Mancur Olson. Disponível AQUI
    [Texto] Teoria da Escolha racional: pequeno comentário de introdução. Disponível AQUI
    [Charge] Quino, Assim vai o mundo (2014). Disponível AQUI
    2º BIMESTRE : Projeto de vida
      Trajetórias de vida; Juventudes; Identidades; socialização e cultura
    Competências Gerais: 1, 2 e 5 Habilidades: EM13CHS101, EM13CHS201, EM13CHS202 e EM13CHS501
    Dicas de materiais para as aulas: Dicas de materiais para o(a) professor(a):
    [Música] “Meu guri”, de Chico Buarque BODART, Cristiano das Neves. A biografia no campo da Sociologia: contribuições de Norbert Elias. Blog Café com Sociologia, set. 2019.   ELIAS, Norbert. Mozart: sociologia de um gênio. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Ed., 1995.
    [Texto] O que é Cultura? Disponível AQUI SILVESTRE, Célia Maria Foster; FONSECA, Denis Renan. O que é cultura? In: BODART, Cristiano das Neves (Org.) Conceitos e categorias fundamentais do ensino de Antropologia, vol. 1. Maceió: Editora Café com Sociologia. Disponível AQUI   LARAIA, Roque. Cultura: um conceito antropológico. 14ª edição. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001
    [Podcast] Diversidade cultural. Disponível AQUI
    [Áudio-book] Você tem cultura? Disponível AQUI
    [Texto] O que é identidade? Disponível AQUI GOMES, Marília Passos A.; LOPES, Gleison Maia. O que é identidade? In: BODART, Cristiano das Neves (Org.) Conceitos e categorias fundamentais do ensino de Antropologia, vol. 1. Maceió: Editora Café com Sociologia. Disponível AQUI
    [Música] Metamorfose ambulante, de Raul Seixas
    [Texto] Socialização: o que é? Disponível AQUI AMARAL, Jonathan Henrique do; TRAVISAN, Janine Bendorovicz. O que é Socialização? In: BODART, Cristiano das Neves (Org.) Conceitos e categorias fundamentais do ensino de Sociologia, vol. 2. Maceió: Editora Café com Sociologia. Disponível AQUI   BOURDIEU, Pierre. A ilusão bibliográfica. In: FERREIRA, Marieta de Moraes; AMADO, Janaina (org.). Usos e abusos da História Oral. Rio de Janeiro: FGV, 1996. p. 183-191.
    [Texto] O que é Socialização? Disponível AQUI
    [Música] Não vou me adaptar, de Nando Reis
    [Texto] O que é Juventude? Disponível AQUI DAYRELL, J. O Jovem como sujeito social. Revista Brasileira de Educação, n. 24, p. 40-52, 2003. Disponível AQUI   ABRAMO, Helena; BRANCO, Pedro M. (orgs). Retratos da Juventude Brasileira: análises de uma pesquisa nacional. São Paulo. Editora Fundação Perseu Abramo, 2005.
    [Charge] Bennet, Ser jovem. Disponível AQUI
    [Documentário] Pro Dia Nascer Feliz (2006)
    [Documentário] Últimas conversas (2014)
    3º BIMESTRE: Projeto de vida
    Trabalho e contextos econômicos; Mercado de trabalho e profissões
    Competências Gerais: 4, 5 e 6 Habilidades: EM13CHS401, EM13CHS402, EM13CHS403, EM13CHS501, EM13CHS503 e EM13CHS601.
    Dicas de materiais para as aulas: Dicas de materiais para o(a) professor(a):
    O que é Capitalismo? Disponível AQUI CATANI, Afrânio Mendes. O que é Capitalismo. Coleção Primeiros Passos. São Paulo: Editora Brasiliense, 2017.   FERREIRA, Walace; FILHO, Alberto Alvadia. O que é Capitalismo? In: BODART, Cristiano das Neves (Org.). Conceitos e categorias fundamentais do ensino de Sociologia. vol.1. Maceió: Editora Café com Sociologia, 2021. Disponível AQUI
    [Quadrinhos] refletindo sobre trabalho e desigualdades sociais. Disponível AQUI POCHMANN, Marcio. Desenvolvimento, trabalho e renda no Brasil: avanços recentes no emprego e na distribuição dos rendimentos / Marcio Pochmann. – São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2010. 104 p. (Brasil em debate; v. 2).   PROCÓPIO, Igor Vieira; FREGUGLIA, Ricardo da Silva; CORSEUIL, Carlos Henrique; GUEDES, Fillipe. Dinâmica da desigualdade salarial no Brasil e o papel de determinantes para além da qualificação dos trabalhadores. Textos para Discussão. IPEA, Brasília, fev. 2021.   [Live] TV PUC-Rio: Uberização do trabalho e o proletário da era digital, com Ricardo Antunes. Disponível AQUI
    [Texto] Introdução aos estudos do Trabalho. Disponível AQUI
    [Dados] Painel de indicadores de desemprego do IBGE. Disponível AQUI
    [Música] Trabalho, de Legião Urbana
    [Site] Lista de profissões e cargos no Brasil. Disponível AQUI
    [Dados] Conheça o Brasil – Trabalho e rendimento – IBGE. Disponível AQUI
    [Filme] Eu, Daniel Blake (2016)
    [Texto] O que é Divisão sexual do trabalho? Disponível AQUI FRAGA, Alexandre Barbosa; MAÇAIRA, Julia Polessa. O que é Divisão sexual do trabalho? In: BODART, Cristiano das Neves (Org.) Conceitos e categorias fundamentais do ensino de Sociologia, vol. 1. Maceió: Editora Café com Sociologia. Disponível AQUI
    [Texto] Raça, Etnia, Condições de Trabalho e Saúde. Disponível AQUI COTRIM, Luisa Rabioglio; TEIXEIRA, Marilane Oliveira; PRONI, Marcelo Weishaupt. Desigualdade de gênero no mercado de trabalho formal no Brasil. Texto para Discussão. Unicamp. IE, Campinas, n. 383, jun. 2020.
    [Vídeos] Série Desigualdade de raça e gênero no mundo do trabalho Episódio 1 AQUI; Episódio 2 AQUI; Episódio 3 AQUI; Episódio 4 AQUI; Episódio 5 AQUI; Episódio 6 AQUI;
    [Dados] A desigualdade racial e de gênero no mercado de trabalho no Brasil. Disponível AQUI
    4º BIMESTRE: Projeto de vida
    Educação; Exclusão e inclusão social; Políticas Públicas
    Competências Gerais: 4, 5 e 6 Habilidades: EM13CHS401, EM13CHS402, EM13CHS403, EM13CHS204 EM13CHS501, EM13CHS503 e EM13CHS601.
    Dicas de materiais para as aulas: Dicas de materiais para o(a) professor(a):
    [Texto] Educação e mercado de trabalho. Disponível AQUI VELOSO, Fernando; BARBOSA FILHO, Fernando de Holanda; PERUCHETTI, Paulo. Impactos da educação no mercado de trabalho. Instituto Brasileiro de Economia. FGV, s.d. Disponível AQUI
    [Texto] Educação: Revisão gramatical ou ressignificação do nosso conceito? Disponível AQUI DAYRELL, Juarez. A escola “faz” as juventudes? Reflexões em torno da socialização juvenil. Educação & Sociedade, vol. 28, n.100, out. 2007.
    [Documentário] Pro Dia Nascer Feliz. Disponível AQUI MÉSZÁROS, István. Para além do Capital: rumo a uma teoria da transição. São Paulo: Boitempo, 2006.
    [Dados] Atlas da juventude. Disponível AQUI CASTRO, Jorge Abrahão de; AQUINO, Luseni Maria C. de; ANDRADE, Carla Coelho de (orgs.) Juventude e Políticas Sociais no Brasil. IPEA, Brasília, 2009. Disponível AQUI
    [Texto] Conceito de Estado: Entenda o que é Estado na visão da sociologia. Disponível AQUI
    Como citar este post:

    BODART, Cristiano das Neves. Projeto de Vida: proposta de plano de disciplina. Blog Café com Sociologia. fev. 2022.

    [1] Doutor em Sociologia (USP). Docente do Centro de Educação e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal de Alagoas (Ufal). E-mail: [email protected]

    Originalmente publicado em 23 de fev de 2022

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    Usos de canções no ensino de Sociologia
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  • Notas de Sociologia da Educação: contribuições para pensar as disputas pela Educação no Brasil

    Notas de Sociologia da Educação: contribuições para pensar as disputas pela Educação no Brasil

    Cristiano das Neves Bodart[1]

    A Educação é alvo de ininterruptas disputas políticas, por isso de grande interesse científico e social. Isso acontece por ser ela um importante recurso para a instrumentalização política da sociedade ou de parte dela. Por instrumentalização política me refiro à prática de utilizá-la com fins de induzir a conformação/transformação da sociedade de acordo com interesses coletivos ou individuais, seja para a emancipação humana ou para sua destruição, como destacou Adorno (2021[1967]).

    Sociologia e Educação

    A Sociologia da Educação, subárea da Sociologia, assume a Educação como objeto de estudo na intenção de compreender, entre outras coisas, o desenvolvimento de concepções de Educação e sua instrumentalização nas sociedades modernas (mas também em outras sociedades, embora com menor recorrência).

    Autores clássicos, como Harriet Martineau (1802-1876), Karl Marx (1818-1883), Émile Durkheim (1858-1917) e Max Weber (1864-1920), apresentaram importantes contribuições na elaboração de concepções de Educação, bem como para a sua compreensão fenomenológica, seus usos e objetivos. Tais autores continuam, em intensidades diferenciadas, influenciando entendimentos em torno da Educação.

    A Sociologia da Educação se desenvolveu ao longo do século XX sob os ombros de importantes gigantes da Sociologia, especialmente de Marx, Durkheim e Weber. A menor influência de Martineau se explica inclusive pela forma como a Educação – também as Ciências – foi instrumentalizada nos últimos séculos. A Ciência, resultante do modelo societário patriarcal, proporciona condições diferenciadas de gênero no processo de produção, divulgação e consumo de conhecimentos, definindo o “lugar menor” ocupado por intelectuais mulheres.

    Os três referidos teóricos influenciaram as gerações seguintes no modo de pensar a Educação, ainda que os confrontando ou prolongando suas reflexões. Muito do que se produziu na Sociologia da Educação tem amparo teórico ou conceitual nesses autores; o que os tornam “clássicos”. A definição de clássico está relacionada a uma obra, um conjunto de textos ou autor, o que varia de uma área para outra. Um clássico da música não o é na Sociologia da Educação e o inverso é verdadeiro. Um clássico são autores ou obras que são sempre fontes de inspirações, por isso, recorrentemente revisitados. Mas não só isso, o fato de suas contribuições estarem relativamente sempre atuais e válidas é um dos aspectos que os proporcionam esse status.

    Teorias sociológicas e Educação contemporânea

    O fato de indicarmos que Marx, Weber e Durkheim serem clássicos da Sociologia da Educação – embora Marx e Weber não tivesse escrito uma obra sobre o tema – baseia-se, antes de tudo, nas suas utilidades para pensarmos questões da Educação contemporânea. As concepções de Educação que normalmente encontramos hoje estão fundadas, em alguma medida, nesses três autores; ou em autores/as que desenvolveram suas teorias a partir deles, tal como Pierre Bourdieu (1930-2002).

    Observando as principais concepções que rondam os debates educacionais brasileiros encontramos setores ou grupos cujas ideias dialogam direta ou indiretamente com autores clássicos ou contemporâneos da Sociologia da Educação.

    Para alguns grupos sociais vinculados aos ideais de direita e de extrema-direita, a Educação é entendida como um recurso potencial para manter a ordem social, retransmitindo e fortalecendo as regras morais que fundamentam a estrutura social. Tal perspectiva se ancora, em alguma medida, na visão durkheimiana de Educação. Na outra ponta, há grupos de esquerda que entendem a Educação como um recurso burguês instrumentalizado para garantir a reprodução social, mantendo-se em condições de dominantes. Esta leitura é amparada principalmente na obra “Aparelhos ideológicos do Estado”, de Louis Althusser (2007[1970]) e nas interpretações dos conceitos marxianos de “ideologia” e “superestrutura”.

    As disputas não se limitam a esses dois extremos. Há aqueles que veem na Educação uma forma de ascensão social. Nesse sentido, a Educação habilitaria os indivíduos a ingressar de forma qualificada no mercado (ou mundo) do trabalho. Para esses, a Educação é resultado da modernidade, já que o desenvolvimento do capitalismo demandou a qualificação da mão de obra, assim como a racionalização do processo de transmissão de conhecimento, como destacou Marx Weber.

    Há, ainda, aqueles que a compreendem como um caminho (ou recurso) para a conscientização da existência das “amarras sociais”, o que permitiria a adoção de estratégias políticas de superação. Uma das principais referências desses grupos são as obras de Paulo Freire, pedagogo que vem influenciando a Sociologia da Educação. Dialogando com essa perspectiva, vamos encontrar aqueles que defendem a necessidade de tornar suas ideias amplamente aceitas e reconhecidas (hegemônicas), o que demandaria instrumentar a Educação para a formação de intelectuais produtores e divulgadores de ideias que os representem. Tal posicionamento é influenciado pelo pensador Antonio Gramsci (1891-1937).

    É possível encontrar na sociedade, embora com menor presença, grupos que acreditam que a Educação seja resultante de um conjunto de arbitrário cultural que define o que deve ou não ser valorizado como “culto” ou “profissional”, definições que privilegiam algumas classes sociais em detrimento de outros, garantindo que a Educação seja um patrimônio (ou capital) cultural escasso, o que garante, segundo eles, seu valor. Em outros termos, a Educação formal seria um valor social e arbitrariamente definido e sua vulgarização (ou democratização) são garantiria inclusão social ou econômica a todos os indivíduos, já que seu valor está associado a escassez (BODART, 2021). Essa perspectiva tem forte influência das obras “A Reprodução” (2014[1979]) e “Os herdeiros”, (1992[1964]) ambas escritas por Pierre Bourdieu e Jean-Claude Passeron, importantes sociólogos franceses.

    Sociologia e Educação contemporânea brasileira

    A busca por compreensão dos interesses envolvendo essas ininterruptas disputas têm sido uma ação de diversos/as pesquisadores/as da Educação, da Sociologia da Educação, da Filosofia da Educação, entre outros. No Brasil contemporâneo, tal interesse está diretamente ligado as disputas curriculares que vêm se tornando cada vez mais polarizadas e abertas.

    Nas últimas décadas o campo progressista – integrado principalmente por agentes sociais que veem a Educação como recurso de superação de opressões de classe, gênero, política, religiosa e raça – alcançou avanços importantes na esfera educacional brasileira, mais notadamente nos currículos escolares (maior distanciamento da pedagogia tradicional, inclusão de novos temas e abordagens, reintrodução obrigatória de importantes disciplinas, como Sociologia e Filosofia, etc.), na produção de obras didáticas (com superações importantes de silenciamentos e de estereótipos) e na formação de professores/as.

    Contudo, tais conquistas foram insuficientes para garantir a manutenção de mudanças progressistas. Com a ascensão da extrema-direita, notadamente a partir do golpe parlamentar-midiático de 2016, o seu projeto político de combate ao que chamam de “marxismo cultural” passou a ter condições político-institucionais de ser posto em prática, sendo o currículo, a formação docente, os livros didáticos, as universidades e as escolas e os/as professores/as alvos desse programa. A obra Por que eles têm medo de Paulo Freire na escola? (BODART; MARCHIORI, 2022) retrata bem as motivações da extrema-direita em atacar as propostas progressistas para a Educação. Os debates em torno da educação ganharam maior publicização na sociedade, o que se explica, em alguma medida, por expressões agressivas de agentes públicos, mais especificamente por parte do presidente Jair Bolsonaro e seus ministros. Soma-se a isso, o fechamento de espaços de diálogo/debate, o cerceamento da participação de movimentos e grupos progressistas nas definições curriculares e a indiferença do governo em relação às críticas.

    Importa destacar que tal projeto, capitaneado por agentes políticos e religiosos, se ancora em ideais neoliberais, conservadores e negacionistas que operaram nas dinâmicas maco e micropolítica, sentidas pelos/as professores/as desde as salas de aula. O exemplo de atuação mais emblemática desses grupos é o movimento “Escola Sem Partido”, o qual parte do pressuposto que a educação deve ser politicamente neutra.

    É nesse contexto que a Sociologia da Educação ganha ainda mais relevo, já que as dinâmicas sociais em torno da Educação passam por uma efervescência marcada pelo pluralismo de concepções embasadas ou não nos contributos científicos. Certamente, recorrer aos clássicos (mas não só) é uma ação importante para compreendermos o momento atual.

    Referências bibliográficas

    ADORNO, Theodor W. Educação e emancipação. São Paulo: Paz e Terra, 2021.

    BODART, Cristiano das Neves; MARCHIORI, Cassiane Ramos. Por que eles têm medo de Paulo Freire na escola? Maceió: Editora Café com Sociologia, 2022.

    BODART, Cristiano das Neves. O que é arbitrário cultural? In: BODART, Cristiano das Neves (Org.). Conceitos e categorias fundamentais do ensino de Sociologia, vol.1. Maceió: Editora Café com Sociologia, 2021.

    BOURDIEU, Pierre; PASSERON, Jean-Claude. Os herdeiros: os estudantes e a cultura. Florianópolis: Editora da UFSC, 2014.

    BOURDIEU, Pierre; PASSERON, Jean-Claude. A reprodução. 3.ed. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1992.

    Como citar este texto:

    BODART, Cristiano das Neves. Sociologia da Educação: contributos para pensar as disputas pela Educação no Brasil. Blog Café com Sociologia. ago. 2022.

     

    Nota:

    [1] Doutor em Sociologia (USP). Docente do Centro de Educação e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal de Alagoas (Ufal). E-mail: [email protected]

    Versão do texto em PDF AQUI

     

     

    Dica de leitura:

    Por que eles têm medo de Paulo Freire na escola?
    Adquira AQUI